O lago dos infiéis

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Quando eu era criança minha vó me contou uma lenda sobre um lago que ficava próximo a sua casa. Ela o chamava de “o lago dos infiéis”. Segundo ela, há alguns séculos atrás, uma mulher flagrou o marido traindo-a com sua amiga. Tomada pelo ódio e pela dor essa mulher atirou-se ao lago e foi o mais fundo que pode, apenas para deixar a água entrar em seus pulmões e a morte abraça-la lentamente. Desde então, o espirito da mulher vive no lago e toda vez que um homem infiel se banha em suas águas ela o arrasta para o fundo das águas negras. De acordo com a crença local, dez homens já haviam falecido no lago. Nem preciso falar que aquela história me amedrontou e por anos eu não consegui mais entrar naquele lago.

Já havia se passado muitas décadas desde aquela época. E eu já havia esquecido a história, quando recebi uma ligação do advogado da minha avó. De acordo com ele minha avó havia falecido e deixado suas terras de herança pra mim. Aquilo foi um choque, eu sempre amei muito minha avó e ver que em seu testamento deixara tudo para mim... Me fez ama-la ainda mais.

Após a época de luto, fui até a casa da minha vó com a minha mulher e meu filho. Limpamos o lugar e em seguida fomos nos refrescar no lago. Meu filho foi o primeiro a entrar, sempre foi um exímio nadador. Saltou no lago e o cruzou de uma ponta a outra em questão de minutos. Minha mulher foi em seguida e se manteve na margem, não nadava muito bem, mas se encarregou de se divertir.

Quando chegou a minha vez de entrar já havia colocado um pé na água quando me lembrei. Me lembrei da história de minha avó. Me lembrei de Anne, de Carla, de Cinthia e todas as escapadas que eu dava nos sábados a noite quando minha mulher pegava no sono. Instantaneamente saí do lago e me afastei um pouco.

- Não vai entrar? – Perguntou minha esposa.

- Não. – Respondi. – Mas vou ficar feliz em ver vocês se divertindo.

E assim foi até o cair da noite. Quando os dois saíram do lago, eu já havia preparado nossas coisas para voltarmos pra casa, mas decidi dar uma ultima boa olhada naquelas aguas. Estaria eu sendo medroso? Afinal, era só uma história. E se eu desse só um mergulho pra tirar a prova?

E foi em meio a esse dilema que eu a vi. Um rosto pálido e deteriorado perdido em aguas negras me encarar de forma tão gélida que senti meu coração parar de bater por alguns segundos. Ela não desapareceu em seguida, apenas fitou-me duramente, como quem dizia “Eu vou te esperar”.

Corri para o carro e dirigi por horas. Minha família queria saber o porquê eu estava tão calado e apreensivo. Eu não falei, mas naquele dia tomei uma decisão, eu jamais trairia minha mulher novamente.

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