2. Virgem

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Eu fui direto para o meu quarto, sem fome para comer os restos do jantar - mais conhecido por almoço - já que havia comido o bastante entre o intervalo das aulas. Meu irmão mais velho, Arthur, ouvia música alto no quarto dele e de Davi. Um sertanejo de corno reverberava pelas paredes da casa e eu choraminguei, querendo que minha mãe pudesse ficar em casa, e não voltasse a trabalhar, para colocar ordem na casa. Como eu poderia estudar enquanto ouvia Henrique e Juliano?

Talvez eu estivesse sendo chata, mas realmente era uma péssima letra.

Mesmo assim, ele gritava a letra aos quatro cantos daquela casa. Tinha pena de Davi naquele momento que teria que se deitar no sofá para o seu cochilo da tarde.

Bati na porta dele e entrei, vendo-o deitado na cama enquanto digitava no celular. Abaixou para me olhar um momento enquanto eu respirava fundo para falar.

- Laura Martins já partiu para outra, seu resto de aborto.

Laura estudava na mesma sala que eu e foi namorada do meu irmão por alguns meses, mas o lance só durou até ele entrar na faculdade. Ele segue feliz com as bebedeiras, mas ainda sofre pela perda da garota. Ela não era uma namorada ruim, mas depois de namorar um universitário ficou metida demais para se pronunciar à mim. Mordi a língua, vendo-o jogar o travesseiro em mim enquanto eu fechava a porta.

- Você não tinha que estar estudando para as suas provas de Administração, não?

- Você não tem que cuidar da sua vida não? - Retrucou. - Passa o travesseiro pra cá. - O garoto pediu, parecendo agonizar sem o apoio de sua cabeça.

- Não. - Lhe dei um sorriso sem dentes e fechei a porta, me afastando para o meu próprio quarto.

Ainda podia ouvir seus gritos de protestos acompanhados de alguns xingamentos enquanto voltava a me fechar em meu quarto. Assim que liguei o notebook a ligação de vídeo se iniciou e Carolina aparecia com um prato de comida em mãos.

- Já tá sentindo minha falta, Carol? - Perguntei, me desfazendo do uniforme escolar.

- Estou aqui em prol dos estudos, se não eu nem continuava olhando nessa sua cara feia. - Fez uma careta e eu ri.

- Vou tomar um banho, segura um pouco. - Gritei por sobre o ombro e sai andando em direção ao banheiro, tomando um banho rápido.

Logo após sair, ainda enrolada na toalha, pude ouvir a voz dos meus amigos, todos prontos para iniciar uma tarde de estudos sagrada, como fazíamos uma vez na semana, algumas até mais. Eles falavam sobre possíveis cursinhos caso não passassem em algum vestibular, mas sabia que aquilo dava um desespero tão grande em mim quanto no Gui. Nós queríamos iniciar a nossa carreira o mais rápido possível e perder um ano não estava nos nossos planos.

Quando terminei de pentear os cabelos o assunto tinha mudado um pouco e é claro que tinha que ser sobre signos. Não era possível que o destino estava brincando comigo desse jeito. O que foi que eu fiz de errado? Arrumei demais o meu quarto? Estudei demais para passar em Medicina Veterinária?

- Cheguei, vamos mudando de assunto. - Disse, me sentando e colocando os fones, porque eles tinham uma mania terrível de falar sobre assuntos variados em algum momento das horas de estudo.

Com certeza não queria repetir o episódio em que a gente debatia sobre a cor do pênis do Justin Bieber e minha mãe entrou no quarto.

Chegamos à um consenso de que era rosa, só para deixar registrado.

- Chegou a chata. - Carolina cantarolou.

- Não sou chata, eu só não acredito em signos. - Dei de ombros. - Acho que todos devíamos falar sobre algo que interessa à 100% do grupo e não apenas 75%. Vivemos em uma democracia.

Não Acredito Em SignosOnde histórias criam vida. Descubra agora