13 - Hanna

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Momentos abruptos

Hanna sentia um farfalhar dentro de sua barriga que nem era muito nítida ainda. Estava preocupada com o sogro Benjamin que não levantava da cama a uma semana, estava pálido e emagrecia rapidamente. O médico veio à pequena casa dos Lipschutz e prescreveu medicamentos fortes que o fez repugnar comida, mas mesmo assim, Hanna insistia em lhe dar as refeições. Às vezes, ele urrava porque Hanna era muito persistente.

Caleb se mantinha sempre fechado em seu mundo. Da escrita às saídas repentinas de casa. Um dia Hanna o seguiu discretamente e viu que ele fora ao cemitério. Lá, deixou flores para Lisie. Hanna se sentiu amargurada. O farfalhar na barriga voltou. Saiu correndo de volta para a pequena casa dos Lipschutz, tomou dois copos de água bem gelada e pôs as mãos na cabeça. Um suor frio escorria-lhe pela face e umidecia seus cabelos pretos. Ouviu Benjamin gritar bem alto de seu quarto, foi até lá.

Chegando no quarto do sogro, presenciou a cena mais deplorável que já vira diante dos olhos. Os lençóis da cama estavam ensanguentados. O sangue saia das narinas do homem. Os olhos de Benjamin estavam cobertos de lágrimas que escorriam em seu rosto e inundavam sua barba, além dele ter urinado nas calças e estar tremendo muito.

— Hanna, por favor, me ajude! — ele esbravejou.

— Sim senhor... eu... — Hanna não sabia o que dizer ou fazer. Estava paralisada.

Leonhard estava no colégio. Eram 10:45 da manhã.

— Eu quero vomitar! — Benjamin gritou.

Hanna correu para o porão da pequena casa que ficava em baixo da cozinha e trouxe um balde de volta para o quarto.

Não deu tempo. O vômito estava espalhado pela cama.

Então, a nora ligou para o médico mais que depressa e este chegou à residência depois de 20 minutos.

O médico e sua esquipe levaram Benjamin para o hospital de onde ele jamais sairia. Só restou a Hanna limpar a cama e lavar os lençóis.

*

— Não acredito que meu filho está apaixonado. — ela disse dando um beijo estalado na bochecha de Leonhard.

Estavam no quarto do menino. Ele olhava uma fotografia de uma menina maravilhosa e a escondeu quando percebeu a presença de Hanna ali.

— Não é nada disso mãe!

— Ah é? Então quem é essa menina linda aí?

— Eu não sei.

— Como não sabe?

— Encontrei esse retrato no chão.

— Não tente me fazer de boba.

— Não estou.

Os dois ficaram calados. Hanna foi até a cozinha e voltou com café e pão.

— Um lanche para você. — ela sorriu e tocou o rosto de Leonhard.

Ele sorriu de volta.

— Estou preocupado com o vovô. — ele disse cabisbaixo.

— Ele vai ficar bem, tenho certeza. — Hanna disse acariciando os cabelos de Leonhard e tentando sorrir discretamente. A cena que presenciara naquela manhã foi chocante, mas ela não queria demonstrar isso para o menino.

— Seu pai não está preocupado? — ela questionou.

— Eu acho que sim. É difícil dizer. Ele anda muito calado.

— Pensei que o problema dele fosse comigo.

— Não é não. Meu pai sempre foi estranho, desde que me lembro... sinto que falta algo nele...

— A sua mãe. — Hanna completou.

— Minha mãe é você! — Leonhard tocou a mão de Hanna suavemente e a deu um beijo na testa como forma de carinho.

Ela se sentia tão feliz com essa demonstração de afeto.

— Eu entendo querido, mas nós sabemos que você, infelizmente, não nasceu de mim. Inclusive a sua avó joga isso na minha cara sempre que pode.

— Ela ficou muito abatida desde que minha mãe morreu. É por isso. Mas ignore isso, eu sei quem é minha mãe. Minha mãe é você e ninguém vai mudar isso.

Os dois se abraçaram por um longo tempo. Era nítido o carinho de ambos. Hanna e Leonhard eram realmente mãe e filho.

— E como vai meu irmãozinho aí dentro? — Leonhard perguntou sorrindo. Aquele sorriso belo e doce como o de Lisie.

— Pode ser uma irmãzinha... — Hanna sorriu de volta.

— Sabe? Estou torcendo para que seja um menino!

— O que? Por que não torce para que seja uma menina? Eu já tenho o menino, tenho você!

— Ah, mas eu quero um irmão!

Os dois gargalharam. A conexão entre eles era extraordinária.

— Agora coma. Você precisa se alimentar.

Leonhard fez uma careta para o lanche. Não estava com fome, mas Hanna insistiu. Ela tinha que fazer seu papel maternal.

Por fim, ele acabou comendo o pão e tomando o café. Hanna recolheu tudo, foi à cozinha e começou a lavar a louça. Estava sem sono. Viu Caleb entrar na cozinha também. Ele a cumprimentou:

— Boa noite Hanna.

Já eram 21:30.

— Oi Caleb. Por onde andou?

— Estava na mansão. Edith não anda muito bem.

— Você deveria preocupar-se mais com sua família. O seu pai não está nada bem. Ele está no hospital agora. Deus sabe o que eu vi hoje de manhã no quarto dele.

— Como assim? O que houve?

— Seu pai teve uma hemorragia, vômitos e urinou nas calças. Ele estava em estado de choque. O doutor teve que levá-lo. O seu filho está desolado, só fica no quarto e quase não come. E você dando uma de bonzinho para a megera? Onde está a sua família em sua vida? Parece que você ficou parado no tempo lá em 1945. — Hanna foi dura com Caleb e de fato ela precisava agir assim. Era o mínimo.

Caleb estava boquiaberto.

— Onde está meu pai? Em qual hospital?

Hanna pegou um cartão sob o armário que o médico havia deixado, com o endereço e o telefone do hospital. Caleb saiu da cozinha e foi ligar para o médico.

Voltou triste.

— Meu pai não está bem.

— Viu, e você se preocupando com aquela rabugenta.

— Ela me ajudou! Me ajudou quando eu mais precisei. Eu tenho que retribuir isso, porque agora ela precisa de mim!

— Ela te ajudou? Ou você quer ficar indo àquela mansão para tentar encontrar sua queridinha Lisie que já foi dessa para melhor há muitos anos?

Os dois gritavam na cozinha. Uma discussão havia começado.

Por fim, Hanna saiu da cozinha muito irritada e foi tomar um banho para se acalmar. A sua cabeça doía e o farfalhar na barriga voltou mais intenso. Ela se sentiu enjoada.

Hanna ligou o chuveiro e deixou que a água morna repousasse em seus ombros. O farfalhar se transformou em dor e foi ficando mais forte e mais forte até Hanna não conseguir mais segurar. Ela não queria gritar, estava segurando o grito em sua garganta. De repente, a dor passou. Hanna suspirou aliviada, mas esse alívio durou pouquíssimo tempo.

E ela viu sangue por todo lado no chão do banheiro.

Renascenças da GuerraOnde histórias criam vida. Descubra agora