Capítulo 10

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Abro meus olhos, sentindo a luz clara do sol esquentar meu rosto. Mas, ao contrário do que esperava, não estava em meu quarto. Na verdade, não reconheço este local. É um espaço aberto, com certeza fora do castelo, haviam pessoas espalhadas a minha volta, as casas da vila enfeitadas com flores exalavam cada uma um aroma diferente. A multidão abria um caminho para que eu desfilasse entre as ruas, o vestido branco e longo que vestia se arrastava pelo chão com um véu rendado.

Minha mão direita segurava um buquê, cada flor possuía uma cor diferente. Alguns dos camponeses gritavam e comemoravam, me parabenizando quando passava por eles. Eu sorria, agradecendo todos, feliz da vida por estar livre em um belo dia como esse. Sinto o calor de outra mão tocando na minha, olho para o lado e me surpreendo. Ao meu lado se encontrava André, com roupas finas da realeza, bordadas com dourado. Nós passeávamos de mãos dadas entre aquelas pessoas, que jogavam pétalas de rosas, enfeitando o caminho.

De repente, há uma comoção. O público pedia para que o casal se beijasse, eles começam uma torcida, com gritos e assobios. Atendendo ao pedido geral, o príncipe se aproxima de meu rosto, segurando minha cintura. O barulho se intensifica, e eu, ao em vez de empurra-lo, permaneço parada esperando ser beijada. Quando nossos lábios estavam prestes a se tocar, eu acordo, assustada.

Sento no colchão de minha cama, finalmente reconhecendo o ambiente do meu quarto e percebendo que tudo não se tinha passado de um sonho. Ponho a mão no peito, sentindo meus batimentos cardíacos descompassados e minhas bochechas coradas pelo pensamento anterior. Mas o que foi tudo isso? Que tipo de sonho foi esse, Safira? Respiro fundo, tentando afastar a adrenalina.

Deito novamente na cama, olhando para o leito vazio de Diane ao meu lado. Passei a noite toda pensando nas palavras do André. Será que eu a conheço o suficiente pra ter certeza de que ele está mentindo? Não. Será que eu o conheço o suficiente pra ter certeza de que ele está falando a verdade? Também não. Resultado: não cheguei a lugar algum, continuo confusa sobre tudo, principalmente sobre meu destino aqui. Nesse momento, estou aceitando qualquer coisa que possa me tirar desse quarto, não me importo com essa competição, nem que eu vire uma criada, preciso ser livre outra vez, sem interrupções.

De repente, a porta é aberta com um estrondo, tirando-me de meus devaneios e reflexões. Vejo uma serva desconhecida entrar no quarto. Eu fico de pé, assustada pela sua entrada inesperada. A senhora caminha até mim e me arranca de lá, levando-me pelo braço, me arrastando para algum lugar. O que as pessoas desse castelo têm em relação a braços? Ninguém sabe dizer "siga-me, por favor"?

Enfim, nós caminhos por um tempo. Eu tento perguntar para ela qual era nosso destino, mas nenhuma palavra sai de sua boca. Entramos em uma parte que nunca havia visto do castelo. A senhora só para quando chegamos ao final de um corredor escuro, onde uma porta enorme e dourada se estendia a nossa frente, a maçaneta era cravejada de brilhantes. Em seguida, ela gira a tranca, deixando-me entrar. Na verdade, a moça me joga lá dentro, fechando a porta logo depois. Eu ouço o click de uma chave e me apresso para tentar sair, mas não dá tempo, eu estava presa, pra variar.

Mudo minha atenção para o cômodo a minha frente, que estava completamente escuro, se não fosse por uma única vela, a sua chama fraca era a única fonte de luz que permitia-me enxergar um quarto. A cama era enorme, com uma suspensão em suas quatro pontas que sustentavam cortinas vermelhas, fechadas, para dar mais privacidade a quem quer que seja o dono deste aposento. Eu escuto um som abafado, parece que alguém está chorando lá dentro.

- Safira, é você? - escuto um sussurro em meio aos soluços.

- Sim, sou eu, o que houve? - eu respondo assim que reconheço a voz.

Pego a vela que está ao meu lado no chão e ando em direção a cama. Abro a cortina, apenas o suficiente para que consiga enxergar o colchão, encontro um certo príncipe deitado e enrolado entre os lençóis da cama, chorando desesperadamente.

- Eu não pude fazer nada, não posso bater nele, não posso - ele dizia chorando.

- André, sou eu, me diz o que aconteceu, por favor - eu digo já preocupada.

- Safira, me ajude, por favor - ele continuava dizendo com sua voz embargada - Eu preciso de você...

Sem obter respostas para nenhuma das minhas perguntas, eu começo a explorar o restante do local, procurando alguma pista que pudesse me indicar o que possivelmente aconteceu. Eu aponto o fogo ardente que queimava na quase extinta vela para outro canto do quarto. Percebo o quão grande era esse aposento real. Meus olhos demoram para se acostumar com o breu, porém, depois de alguns minutos, consigo distinguir alguns pedaços de madeira espalhados pelo chão do que antes parecia ter sido uma cadeira. Um vidro de perfume estava espatifado pelo chão e o líquido cheiroso manchava o tapete. Acho também uma pequena carta aberta, que estava em cima de uma mesa, ao lado da cama. Dizia o seguinte:

Príncipe André,

Venho através dessa carta, avisar-te da minha chegada ao reino de Urbe em dois dias. Veremos se você se prova digno de governa-lo. Veremos também se já escolheu sua esposa, se cumpriu com suas devidas tarefas como o futuro rei de Urbe.

Rei Stephen.

Rei Stephen, será ele o pai de André? Provavelmente sim, e aparentemente é um cara muito frio. Acho que já entendi o que aconteceu, de acordo com a data que a carta foi enviada, já fazem três dias que o rei a mandou, o que significa que ele já veio aqui hoje.

- André, seu pai, ele fez alguma coisa, não foi?

Eu me aproximo dele novamente, sentando na beirada da cama e deixando a vela na mesa, ao lado do bilhete. Antes que pudesse ouvir a resposta dele, sou puxada para um abraço. É ele, o príncipe André está me abraçando e chorando. Como que ele pode se mostrar tão vulnerável assim, bem na minha frente?

- Eu não pude fazer nada, Safira! Eu nunca bateria no meu próprio pai! - ele diz entre soluços.

- Eu sei, eu acredito em você, você não é a pessoa má que eu achei que era - digo retribuindo o seu abraço.

Posso sentir sua respiração em minha orelha, sinto também meu vestido se molhando na medida que suas lágrimas caiem em cima do tecido, mas nada se comparava ao som do meu coração acelerado em meio aquele abraço. Por que isso acontece? Por que quando ele fica perto de mim meu coração dispara? Alguma coisa mudou dentro de mim desde cheguei aqui. Alguma coisa me diz para ficar assim, abraçada com ele, mas o meu bom-senso me diz para solta-lo agora. Qual lado eu escuto?

Eu não posso, não posso fazer isso, ele precisa de mim, mesmo ele sendo um idiota. Não, eu não tenho mais essa opinião sobre ele. Na verdade, ele é, acima de tudo, uma pessoa normal, com sentimentos e com problemas. Eu não posso virar as costas para outro ser humano que precisa da minha ajuda. Quando ele se acalma e para de chorar, seus braços me soltam e seu corpo deita-se de volta na cama vermelha. Eu passo a mão pelo meu pescoço e ombro, que estavam molhados de lágrimas, mas quando olho minha mão, não havia apenas água, mas também, sangue.

- O que? Isso é sangue? André, você está sangrando! - eu digo, muito preocupada com ele.

Não obtenho resposta alguma, a adrenalina começa a tomar conta de mim. Pego a vela novamente e aproximo-a dele, a claridade revela uma série de arranhões espalhados pelo seu rosto e outros diversos hematomas roxos, provavelmente de pancadas muito fortes que ele levou de seu pai.

- Oh céus! O que eu faço?

Um Amor Inesperado.Onde histórias criam vida. Descubra agora