A Estrada

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O som de uma criança chorando o acordou de um sonho estranho. Ele se lembrava dos velhos tempos, da brisa quente do verão no rosto, do sorriso devasso e angelical que tanto encantava, lembrava também, daqueles olhos únicos. O choro fez com que despertasse de uma memória antiga, olhou para o lado e os lábios já não existiam mais, eram apenas dentes sem brilho expostos. Os olhos há muito se foram, o que o fitava era uma escuridão sem fim. A criança devia estar com fome e sentindo a falta da mãe. Era o momento de dar um jeito nisso

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Anton pegou o telefone e discou com os dedos longos, velhos e trêmulos, enquanto ele esperava a pessoa do outro lado da linha, Cherry estava sentada na poltrona ainda fitando a foto de Rey. Anton realmente não entendia qual o interesse dela naquela foto, talvez fosse apenas uma curiosidade mórbida.

—Alô? – A voz de Judith era sonolenta, Anton sabia que era madrugada na Irlanda.

—Ele escapou da prisão. Você não pode voltar para casa sob hipótese alguma. — Anton rodava o anel com suas iniciais no dedo mindinho.

—Meu Deus! – Após um longo suspiro – Você está falando sério?

—Por que eu iria brincar com isso? — Anton estava impaciente, talvez o fato de sua amante muito mais jovem que a esposa estar próxima o deixava tenso.

—Você já falou com nossos advogados? E com as autoridades? Você ainda tem aqueles contatos na polícia, não tem?

—Sim. – O velho rolou os olhos- Você não precisa me ensinar o que fazer, tenho pessoas atrás desse verme, elas estão tomando todas as providencias necessárias para nos proteger e capturar aquele maníaco... Deus sabe o que ele tem em mente, provavelmente esteja vindo me pegar.

—Não brinque com isso! Se ele estivesse em um hospital psiquiátrico, como foi sentenciado nada disso estaria acontecendo, e você sabe muito bem disso! — A voz dela tinha um resquício de mágoa.

—Ele não é louco, Judith! Ele se faz de louco. O lugar dele era e ainda é no corredor da morte. Ele não foi sentenciado á coisa alguma, eu mando nesta cidade e nas autoridades e a minha vontade foi feita. Ele ia esperar no corredor da morte e ser eletrocutado, se minha filha e meus netos não tiveram a chance de viver, por que ele deveria ter?

—Porque você não deu á ela nenhuma chance, Anton! Você sabe muito bem que se não tivesse jogado ela para fora de casa, ela poderia...

Anton bufou na linha.

—Esse não é o motivo da minha ligação, estou apenas comunicando que você está proibida de retornar da Europa. Enquanto esse animal estiver à solta não quero que ninguém se machuque. Não vou esperar mais pelas autoridades, agora meu pessoal está á frente da situação. Eu sabia que não podíamos confiar no sistema judiciário.

—Sistema esse que você enche a boca para dizer que controla? E você, vai continuar ai, esperando ele entrar na mansão e enfiar uma bala na sua cabeça?

—Judith, não se preocupe comigo. Siga minha ordem e continue aí, vivendo como uma rainha e gastando minha fortuna. — Anton desligou o telefone antes que a mulher retrucasse. Ele sabia que esse tipo de conversa com a esposa podia levar à horas no telefone.

Cherry continuava fitando aquele maldito papel.

—Me dê isso aqui querida. — Ele tomou o papel das mãos dela.

—O que você vai fazer agora, paizinho? — Cherry olhava para Anton e ele sentia que ela não o enxergava

—Eu não vou fazer absolutamente nada, querida. Existem pessoas muito bem pagas para fazer o serviço por mim. Sou velho, rico e estou muito cansado para lidar com isso agora. Esse homem não vai ficar muito tempo á solta. Ele é estúpido.

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