Flocos de Neve

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O cheiro já não era tão insuportável, moribundo ou nauseante. Na realidade era agradável, tinha um odor mórbido, porém adocicado e depois de tanto tempo ele mal conseguia senti-lo. Não conseguia distinguir o cheiro podre de sua realidade distorcida, era como se ela sempre tivesse aquele cheiro, seu cheiro misturado com o dela formando a mais doce de todas as fragrâncias: O cheiro de morte.

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O sol do final da tarde estava se pondo no horizonte, pequenas labaredas alaranjadas dançavam no céu marcando o outono. Louisiana era quente em qualquer época do ano, mas no outono era incrivelmente úmida. Era como se o pântano tivesse algum plano diabólico de dominar toda a região, e aos poucos ia invadindo o ar com sua brisa podre e adocicada.

James ‘Rey’ Furnier escarrou no chão, sua boca tinha um gosto amargo de uísque barato e cigarro velho. Olhou para a gosma no chão e coloração marrom. Refletiu por um momento se talvez esse tipo de ação repelisse Cherry de sua companhia. Afastou o pensamento, não queria penar naquela maldita garota. Não agora. Ela deveria estar se divertindo com aquele velho nojento (provavelmente ele não cuspia no chão e fitava o cuspe) na sua mansão, enquanto ele a entupia de dinheiro e a fazia se sentir especial. E tudo o que Rey tinha á oferecer era um grande monte de nada.

Ele não tinha um tostão no bolso, não era um sujeito feio, poderia ser considerado charmoso por algumas mulheres. Nem satisfazer a maldita na cama ele sabia, ela ficava ali parada inerte como uma boneca enquanto ele fazia todo o trabalho. Era como comer uma defunta. Seus olhos desiguais continuavam a olhar para o vazio, e Rey mal conseguia terminar a ação, antes de ela bocejar ele tinha ejaculado na perna de Cherry. Ejaculação precoce era o menor de seus problemas no momento.

Rey não era nenhum Einstein, não tinha nenhuma mente brilhante, porém estava começando a desconfiar que a stripper o tivesse abandonado. Ela simplesmente decidiu ficar alguns dias na casa (mansão) do velhote e mandou Rey passear. ‘’Oh não se preocupe paizinho, pode ir embora. Depois eu ligo para você vir me buscar’’. Ela disse sorrindo com sua cara deslavada e arrebentada pelos punhos de Rey. Nenhum beijo e despedida ou agradecimentos. Ela resolveu passar umas férias do diabo com o velhote e deixou Rey na mão. Quem ela pensava que ele era? Seu maldito motorista?

E só esse pensamento, daquele velho entrando e saindo dentro dela o enchia de fúria, enquanto ele jogava suas preciosas notinhas verdes nela, ela se derretendo pra cima dele. Ou pelo menos era isso que Rey imaginava que estava acontecendo. Será que o que o tornava tão atraente para Cherry era seu dinheiro? Se Rey fosse um cara montado na grana ela sentiria um pingo de empatia por ele? Rey ponderou se ele sabia o nome dela...

A velha caixa de correspondência continuava no mesmo lugar de sempre, agora estava enferrujada e desbotada pela ação do tempo. O tempo passava para todos, mesmo para aqueles que ficaram dez anos parados dentro de uma cela mofada. A tinta preta estava descascando, mas se você apertar bem os olhos consegue ler o escrito ‘Furniers’ na lata velha, memória de uma vida tão distante. Rey flexionou os dedos que estavam fechados, suas unhas sem cortar estavam cravadas na pele fazendo-a arder levemente. Os nós dos dedos estavam brancos pela força impelida, antes que ele pudesse pensar em abrir a mão tinha esmurrado a caixa de correio de sua antiga casa.

Repetidamente ele bateu no pobre pedaço de lata, até o sangue escorrer por entre seus dedos e cair no seu velho jeans desbotado. Rey bufou, gritou e grunhiu como um animal, e no final das contas não era isso o que ele realmente era, um animal indomesticado? Sentia todo o ódio fluir dentro de si, talvez nem fosse ódio fosse frustração. Rey era um velho homem frustrado. Não sabia como, mas tinha voltado para a casa que dez anos atrás a policia o tinha levado á força, a casa onde sua mulher morava com outro homem, criando seus filhos sem ele e ela sequer o permitia visitar as crianças. Era arriscado voltar lá, mas valia a pena a tentativa. Era como se houvesse um imã naquele terreno o atraindo de volta para o lugar. Sempre que ele acordava suado á noite na cama velha e fedorenta do motel ele estava sonhando que estava voltando para casa.

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