4º Capítulo - Dias lentos e primeiras impressões

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Mal queria acreditar na chuva que se recusava a abandonar aquela região que eu sempre estivera habituada a ver banhada pelo sol.

Era o meu primeiro dia de estágio e quando acordei de manhã, apercebi-me do pormenor estúpido de nem sequer ter perguntado a que horas devia aparecer lá. Assim não me restava mais nada a não ser supor e pedir desculpa caso estivesse errada.

- Será que devo levar o meu portátil? – Perguntei, depois de prender o meu cabelo.

Porém, ao ver o vendaval do exterior, achei que seria melhor usar o computador da empresa ainda que aparentasse pertencer à época jurássica. Mais uma vez, chamei um táxi para me levar e outra vez, tive que subir aqueles lances de escadas para chegar ao terceiro andar. O meu estilo de vida sedentário ficava mais do que evidente quando ao subir aquelas escadas, já respirava mais ofegantemente. Ia bater à porta quando ouvi passos nas escadas e resolvi esperar um pouco já que podia ser um dos meus colegas. O meu palpite estava correto. Lá estava o Célsio com os seus óculos embaciados e cabelo de risca ao lado, completamente molhado.

- Bom dia!

- Bom dia. – Cumprimentei-o com um tom menos entusiasmado. – Ontem nem perguntei a que horas devia estar aqui por isso, até tive medo de estar atrasada sem saber.

Ele olhou para o relógio, sorriu para mim e disse:

- Entramos sempre às nove ou oito e meia se tiveres ainda trabalho para acabar do dia anterior ou sais mais tarde também se for preciso.

- Ah estou ver, horários flexíveis.

- Estás a gostar de Alicante?

- Gostaria mais se não chovesse. – Disse, passando à sua frente pois abriu a porta e deu-me passagem. – Obrigado. İBuenos días!

Cumprimentei o meu chefe e a Milenka que pelos vistos tinha chegado mais cedo e já se encontrava concentrada no trabalho. Mesmo assim, ainda me sorriu e desejou-me um bom dia de trabalho. Em seguida, o Sr. Romero, o meu chefe, optou por deixar o Célsio ocupar-se de fazer as “honras da casa” e apresentar-me à minha secretária de trabalho e tirar qualquer dúvida que pudesse ter. Agradeci a atenção mas disse que normalmente aprendia as coisas com relativa rapidez mas isso não demoveu o Célsio que veio explicar as coisas com uma dedicação que nenhuma pessoa normal teria na frente de um computador da era das cavernas.

- Nós trabalhamos com o Trados 2007? Porque não com o Studio 2009? Os clientes não exigem os programas mais recentes? E não têm a versão mais recente do Wordfast? Eles aceitam trabalhar com estes programas?

Perante todas aquelas perguntas, ele apenas colocava um sorriso amarelo e acabou por explicar que os programas mais atuais tinham licenças mais caras e os clientes não se importavam assim tanto com a modernidade dos programas e sim com um trabalho bem feito.

Creio que não consegui disfarçar o meu descontentamento com aquela situação e por isso, ele resolveu deixar-me sozinha. Nem queria acreditar que nem dinheiro para as licenças aquela empresa tinha. Por um lado, nem devia surpreender-me já que de aparência aquela empresa já dizia tudo mas por outro lado, pensei que fizessem um bom investimento em software. Passo a explicar para quem não é consciente do trabalho de um tradutor, não nós não escrevemos frases no Google Tradutor ou usamos dicionários online para traduzir palavra a palavra. Existe todo um trabalho de pesquisa, aprendizagem e decisões sobre as melhores palavras e as melhores construções frásicas, ou seja, tentar fazer com que o texto traduzido pareça ser natural e um original na língua de chegada. Este é outro ponto em que vou tocar, em tradução, usamos termos como língua de partida (presente no texto original) e língua de chegada (aquela presente no texto traduzido). Existe toda uma transferência a nível gramatical, cultural que também passa pelo bom senso.

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