A visita da Sónia ocorrera há mais de duas semanas e desde então, podia dizer que se iniciara uma rotina. Depois de colocar em pratos limpos a situação, ou seja, esclarecer ao Axel que independentemente dos seus sentimentos, acabaria o livro e que até então, podíamos continuar debaixo do mesmo teto. Claro sob a condição de que respeitasse também os meus sentimentos e caso a resposta não fosse favorável para ele, pedi que separasse as coisas e que tentasse olhar para mim como alguém que trabalhava para ele e apenas isso. Embora tenha dito que não seria fácil, prometeu que daria o seu melhor.
Portanto, ultimamente, até tomávamos o pequeno-almoço juntos pela manhã e logo depois, seguia para a TradMaster de onde regressava ao fim da tarde, jantava e dedicava-me inteiramente ao livro muitas vezes até meio da madrugada visto que ultimamente, as palavras pareciam eletrizantes e fluíam com bastante rapidez. Não quis que nada se perdesse e por isso, só me deitava quando aquele fluxo de palavras se detinha ou mostrava ter mais pausas em que tinha que pensar mais um pouco. Deixava alguns apontamentos em algumas folhas e deitava-me para que no dia seguinte, à noite, pudesse pegar a partir do mesmo ponto em que tinha parado.
Relativamente ao Axel, andava ocupado com alguns trabalhos que lhe tinham pedido para avaliar. Por vezes, estava em casa e outras vezes, realizava algumas reuniões em hotéis próximos. Ouvi várias vezes as suas conversas ao telemóvel em que se recusava veementemente a dirigir-se a outra cidade ou outro país para discutir o que quer que fosse. Rendidos à sua insistência, concordavam em vir ao seu encontro. Isso levava-me a pensar na reputação que devia ter ao ponto de convencer outras pessoas a virem até ele, quando possivelmente seria mais simples fazerem o contrário.
- Fabiana, será que me podes passar a versão final da tradução daquele folheto da conferência em Madrid que traduzimos há alguns dias atrás? – Perguntei, parando na frente da sua secretária.
Sem que a sua concentração abandonasse o ecrã do computador, respondeu que mais tarde faria isso dado que naquele momento, encontrava-se demasiado ocupada. Era a terceira vez que lhe pedia aquele texto que tinha sido minúsculo, uma vez que se tratava apenas um folheto de apresentação acerca dos temas a serem abordados. Poderia até considerar um resumo e não tinha sequer a extensão correspondente a uma página. Ela corrigira em pouco tempo, recordava-me bem disso e portanto, era apenas mais uma implicância comigo. Nas últimas vezes em que lhe tinha solicitado o texto, recebi a mesma resposta e regressei ao meu lugar. Porém, desta vez, não estava com paciência para lidar com sua má vontade. Assim sendo, insisti mais uma vez para que me enviasse o texto com as correções que tinha feito, já que precisava que no meio do estágio e da escrita do meu próximo livro, precisava arranjar tempo para o meu relatório que me daria o grau de Mestre em alguns meses. Só que para isso, teria que apresentar trabalho feito e o facto de ela estar a empatar-me, não ajudava. Perante a minha insistência, não teve escolha e finalmente, encarou-me com os seus olhos castanhos e algo esverdeados que brilhavam com um certo ódio que continuava a não entender. Soltou os seus cabelos longos e ondulados sobre os seus ombros e respondeu:
- Não ‘tá vendo que estou ocupada? Faço bem mais do que vocês.
- Estou a pedir que me envies um texto, só isso. Estou a fazer este estágio para conseguir acabar o meu Mestrado. – Tornei a explicar. – Como já disse antes, preciso de alguns textos para usar como exemplos daquilo que fiz no estágio. De preferência os que tenham algumas correções ou problemas para poder comentar. Será que vou ter que repetir isto cada vez que vier pedir-te alguma coisa? Não era mais simples enviares-me os textos logo na altura quando os corriges em vez de me fazeres vir até ao teu computador e ficarmos eternamente neste jogo?
- Tenho método de trabalho, coisa que muita gente não tem. – Replicou, retirando os seus óculos de hastes finas e transparentes enquanto olhava para mim com um ar que misturava a indiferença com alguns traços de irritação.
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Recomeçar
Storie d'amoreCatarina sofreu uma grande perda na sua vida e isso fez com que encarasse as coisas de forma diferente. Construiu alguém, uma pessoa, uma barreira que se propunha a suportar o resto da sua vida. Será mesmo possível prever o que a vida tem guardada p...