Capítulo XVIII

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"O mundo gira. Nenhuma tristeza é tão eterna que não deixa um espacinho para a felicidade."
- Não se Apega Não

Sasuke
A nossa viagem atrasou cerca de uma semana.
Era para termos saído antes, porém Naruto precisava resolver alguns assuntos do reino e junto com isso a carta que mandamos para Tsunade Senju demorou mais para retornar do que esperávamos, atrasando nossa viagem em quase sete dias.
O feudo ficava a dois dias de distância e íamos em uma pequena comitiva, não queríamos impor poder ou algo do gênero, queríamos mostrar que estávamos indo em paz e com boas intenções.
Na resposta enviada a nós, Tsunade avisou que o Norte do território estava em meio a um conflito e que para evitar qualquer eventualidade havia mandado um mapa com a rota mais segura para que chegássemos até o nosso destino. No momento estávamos em território Senju, porém faltava cerca de quatro horas para chegarmos até o palácio.
Nos deparamos com a primeira cidade assim que cruzamos o grande muro que cerca toda a terra do feudo e a minha primeira reação foi de espanto.
Naruto havia pesquisado e analisado o reino que visitaríamos e avisou que aqui tudo era diferente, mas eu não esperava que fosse tanto. Todas as cidades que passamos até agora são extremamente organizadas e limpas, as pessoas por mais humildes que sejam são bem vestidas e cuidadas, sem falar que em todas elas há um prédio gigantesco onde funciona um instituto de educação. Em nenhuma delas as casas são ao redor de uma igreja central, claro que vi algumas igrejas ao longo das cidades, porém percebi que não era a religião católica que imperava ali, para ser sincero parecia que nenhum tipo de culto se sobrepunha a outro.
Nossa comitiva era composta por cerca de quinze soldados montados em seus cavalos, cada um de nós estávamos em uma carruagem própria com o símbolo do clã ao qual representávamos. Eu estava sozinho na carruagem Uchiha, meu irmão, Itachi, teimou que iria me acompanhar, porém o obriguei a ficar e cuidar do reino junto com Deidara, Kankuro e Hanabi, já que eles não sabiam muito sobre como ficar à frente de um reino inteiro.
Por direito Itachi é o herdeiro legítimo do trono Uchiha, porém ele abdicou em meu nome. Ele nunca quis as responsabilidades que vinham junto com a posição de herdeiro. Assim que assumi o trono, aos dezoito anos, Itachi me contou o real motivo de não ter aceitado a posição que nasceu para ocupar. Eram três motivos, segundo ele.
O primeiro se resumia ao fato do meu irmão mais velho não conseguir ficar em um lugar apenas, ele queria viajar, descobrir mais do mundo em que vivíamos e aprender novas culturas e ficando preso a um trono ele nunca conseguiria ser livre de fato, sempre com responsabilidades maiores que seus sonhos. O segundo motivo era a falta de habilidade para contornar situações desfavoráveis e as torná-las favoráveis, Itachi disse que nunca conseguiu obter a maestria necessária para comandar algo, diferente de mim que sempre conseguia o que queria. O terceiro e último quesito que o fez desistir do trono foi a falta de frieza para lidar com certas situações. Itachi sempre foi um homem Pacífico e calmo, ele nunca conseguiria ordenar nada que fosse contra essa sua conduta, diferente de mim que já até perdi a noção de quantas vezes ordenei ou presenciei situações que tirariam o sono de qualquer um. Eu conseguia lidar com as consequências que viriam com o trono, mas Itachi não, e ele sabia disso, por isso passou o direito do trono para mim.
Eu entendia o lado do meu irmão, todo o poder do título que me acompanha tem suas consequências. Eu não era mais o menino que assumiu as responsabilidades aos dezoito anos, nem de longe eu era parecido com ele agora. Quando comecei a governar minha maior meta era encontrar minha irmã, porém a medida que o tempo foi correndo meus anseios mudaram. A busca por Sakura ficou parada no passado, eu não conseguia mais dar murro em ponta de faca, procurando por algo que acreditava nunca mais encontrar, os anos que passei a procurando, todas as decepções que vieram a cada fracasso e toda a culpa que me perseguia desde o acontecido acabaram me sufocando e eu desisti. Desisti de Sakura. A partir dali eu estava à beira do precipício, mas para ser mais realista eu sempre estive à beira do precipício, eu só precisava que algo me ajudasse a criar forças para me jogar. E eu me joguei. Acontece que o precipício não foi a minha morte, não, me jogar dele apenas me afundou ainda mais naquele imenso nada.
Vazio.
Nunca uma palavra fez tanto sentido na minha vida.
Era reconfortante sentir aquele nada em mim. Por anos tudo o que sentia era culpa, dor e saudades, mas a partir do momento que eu pulei sem me importar com o que iria me acontecer eu abdiquei de tudo o que eu era e o que veio à tona foi o meu lado mais feio. Sempre conseguia o que queria, porém o que eu mais precisava nunca me veio. Eu precisava de mais uma chance, mais um abraço daquela rosada que eu amava. Eu sei que eu era uma criança e eu também sei que ela era uma criança, porém ela era minha, ela estava em meu coração e quando a tiraram de mim levaram uma parte minha junto com ela. Aquela risada gostosa, o barulho dos seus pés descalços correndo pelo palácio, as manhãs que ela invadia o meu quarto e me acordava aos pulos, as tardes que eu tinha livre e brincava com ela... Tudo aquilo foi tirado de mim, tirado de uma forma tão abrupta e dolorida que me afetou mais que qualquer outra coisa.
Eu lembro que depois de vários anos sem notícias dela eu rezava para que ela estivesse morta, não conseguia imaginar ela sozinha em algum lugar, sofrendo e com medo, pedindo ajuda, mas se que ninguém conseguisse ajudá-la. Aquilo era um dos meus piores pesadelos, porém quando desisti de carregar todo aquele peso esse medo parou de me assombrar, porém mal sabia que o meu pior pesadelo estava para acontecer ainda.
Eu era desejado, as mulheres caiam aos meus pés e eu me aproveitava disso, mas chegou um ponto que aquilo não me satisfazia mais e aquele vazio apenas aumentava cada vez mais, foi aí que descobri a guerra. Todo aquele sangue, os gritos e o medo que os outros sentiam quando me viam fazia uma estranha sensação tomar conta de mim, eu era poderoso e porque não afligir nos outros a dor que senti por anos?
A cada batalha, a cada gota de sangue derramada e cada vida ceifada por minhas mãos me trazia uma satisfação tão grande que acabava por alimentar o monstro que estava dentro de mim, o problema era que o monstro cada vez mais se fundia a mim e eu acabei me tornando ele.
Ganância, arrogância e prepotência. Eu me coloquei em um pedestal, achava que nunca mais iria ser abalado, afinal quem iria conseguir me atingir? Eu não me importava com mais nada. Porém a vida é uma juíza muito filha da puta, ela espera que estejamos no ponto mais alto, ela espera até o momento certo para nos derrubar, e eu cai, mas a queda foi alta demais dessa vez.
Agora eu sei que tudo o que aconteceu foi a segunda chance que tinha pedido há anos atrás, mas estava tão cego que não percebi que aquela era a minha oportunidade. Aquela mulher de cabelos rosa mexeu comigo desde a primeira vez que a vi, mas fui arrogante e tentei impor a ela e a mim mesmo que nada daquilo era real, que aquilo não passava de sexo. Mas eu sabia que ela não queria aquilo, não daquela forma, porém tomei o que achava ser meu, sem saber que mais tarde me arrependeria de ter agido daquela forma. Aquele vazio que me fazia companhia começou a desaparecer e a culpa era dela, as minhas defesas foram caindo uma a uma, mas a típica arrogância Uchiha não me deixou, o orgulho falou mais alto e não tentei me redimir por tudo o que tinha feito e quando menos esperava a perdi novamente, mas dessa vez com meu filho em seu ventre, um filho que eu não sabia da existência até descobrir a verdade sobre quem ela era. Sakura estava ali comigo o tempo inteiro e eu não me deixei ver o que estava bem na minha frente.
Ali começou o meu pior pesadelo, mas dessa vez eu não precisava imaginar nada, porque tinha sido real. Real demais.
O tombo que levei foi o mais doloroso. Tudo o que eu temia que os outros fizessem com ela eu fiz.
Eu me transformei no homem que eu odiava.
A dor nos muda, mas dessa vez eu não iria deixar que ela me consumisse. Já tinha deixado isso acontecer uma vez e tudo o que tinha conseguido era mais culpa, dessa vez iria tentar me redimir. Eu sabia que ela estava viva, sabia que elas tinham conseguido fugir daquela invasão rebelde no palácio. Eu iria procurá-la, mas não antes de me tornar alguém digno para tal.
Eu iria me redimir por tudo, iria me tornar uma pessoa da qual meu filho poderia se orgulhar e da qual Sakura pudesse perdoar. Mas ainda tinha um longo caminho para percorrer, e para ser sincero acho que nunca conseguirei chegar lá, mas eu posso tentar e estou tentando.
Eu mais do que ninguém sei que o que eu fiz não tem perdão, a minha salvação está bem longe de ser real, porém eu não sou mais aquele homem e a cada dia que passa eu me distancio mais e mais dele. Se eu pudesse me imporia a pior das sentenças pelos meus crimes cometidos, mas quem realmente precisa me punir é Sakura, eu já faço isso toda vez que acordo de manhã. Sakura tem que ter o direito de olhar em meus olhos e me mandar para o inferno ou fazer da minha vida um inferno, e eu não vou poder reclamar porque eu sei que mereço tudo o que ela me deseja de mal.
Mas antes disso tudo eu irei contar a verdade para ela, irei contar que tem uma família que a ama até hoje e sente sua falta e que se ela desejar vê-los eu a levarei até eles e que assim que o fizer sumo da vida dela para sempre se assim desejar.

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