Capítulo 01

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Roberto chegou em casa confuso, irritado, batendo a porta com força. Naquele dia fora submetido a um processo de autodestruição e pensava rancoroso: "Isso não vai ficar assim. Não posso tolerar ter sido feito de bobo pela pessoa em quem mais confiava. Quem poderia imaginar que, depois de me alisar a vaidade em elogios e tapinhas nas costas ele acabasse por me apulhalar sem dó nem piedade?".

Dentro da sala espaçosa, decorada com simplicidade e sem muitos adornos, ele andava de um lado para o outro, como fera acuada, dando vazão a seu humor e sua revolta.

Sentia a cabeça pesada, doendo, como se a testa estivesse sendo apertada sem cessar por um círculo de ferro. Seu estômago queimava, e o almoço que engolira rapidamente havia mais de cinco horas ainda não tinha sido completamente digerido, provocando de vez em quando uma sensação de azedume em sua garganta. 

Foi ao banheiro e procurou um vidro de sal de frutas. Depois dirigiu-se à cozinha, colocou água num copo e despejou um pouco do remédio, ingerindo-o em seguida. Sentiu um arrepio no corpo e fez uma careta desagradável. 

Se ao menos o mal-estar passasse! Ele precisava se acalmar. Havia uma situação difícil para enfrentar, e Roberto precisava estar com saúde. Tinha família para sustentar. Dois filhos na escola: Maria do Carmo com cinco anos e Guilherme com sete. Ele fora contra a ideia de enviar Maria do Carmo para a escola aos dois anos de idade. mas Gabriela trabalhava e não queria deixar o emprego de forma alguma. 

Quando se casaram, oito anos atrás, ele se empenhou de todas as formas para que ela deixasse a empresa onde trabalhava como secretária. Afinal, ele havia montado um negócio próprio que lhe rendia um bom dinheiro. Mas Gabriela fora irredutível. Não ia largar o emprego do qual tanto gostava. Ela dava muito valor à sua independência e gostava de ganhar o próprio dinheiro. 

Roberto não concordava com isso. Mulher casada precisava tomar conta do lar. Ele tinha condições de arcar com as despesas. No fundo, sentia ciúmes. Saber que Gabriela, todos os dias, durante a maior parte do tempo, estava em companhia de outros homens, chegava a tirar-lhe o sono. 

Apaixonara-se por ela desde o primeiro dia.  Alta, cabelos louro-escuros, olhos verdes, boca carnuda e vermelha, corpo elegante e bem feito, pelo cor de pêssego levemente rosada, Gabriela representava para ele o máximo de atração. 

Quando, depois de muita insistência, ela aceitou sair com ele pela primeira vez, Roberto sentiu-se o homem mais feliz do mundo. Namoraram durante dois anos. Ele confiava nela. Era moça honesta e de bom comportamento. Mas percebia claramente o quanto ela despertava a atenção masculina quando passava indiferente, desfilando sua beleza. 

Ele fez de tudo para que ela desistisse de trabalhar depois do casamento. Mas ela foi taxativa:

- Não sou o tipo de mulher dependente. Trabalho desde os quinze anos. Eu me sentiria muito mal se tivesse que depender do seu dinheiro. Sou competente para cuidar de mim. Depois, não gosto dos trabalhos domésticos. Não tenho jeito para certos serviços. Por isso, vou continuar trabalhando depois do nosso casamento. Esse é para mim um ponto muito importante. 

 - Pense em mim, em como vou ficar nervoso imaginando você lá, junto com todos aqueles homens. Tenho certeza de que muitos dão em cima de você mesmo sabendo que é comprometida. Imagino o que farão depois que for casada!

Gabriela fulminou-o com o olhar: - Estou com você porque o amo. Escolhi me casar com você, isso deve ser suficiente. Que me importa o que os outros pensam? A malícia é deles. Eu sei o que quero da minha vida e o que vou fazer com ela. Se não pode entender isso, sinto muito, mas você não tem condições de se casar, nem comigo, nem com qualquer outra mulher. 

Ninguém é de Ninguém - Zibia GasparettoOnde histórias criam vida. Descubra agora