02 - Uma Vida

2.8K 283 457
                                    


A residência do casal que havia me encontrado em uma floresta completamente desconhecida por mim, era o cúmulo da simplicidade. Não estava sendo mal agradecida nem tampouco estava achando ruim, o fato era que não havia como não prestar atenção na humildade do lugar. Não que eu esperasse uma casa ultra moderna, mas também não esperava que a casa fosse daquele jeito.

Era um cubículo com um quarto, sala, e um projeto de banheiro. A cabana - como eu bem intitulei - era coberta de palha, com piso de terra batida e a área interna escura, úmida e enfumaçada. Os móveis, bastante rústicos, resumiam-se à mesa e bancos de madeira e os colchões de palha.

Minha testa latejava por conta do ferimento que os estilhaços de vidro causaram em minha sobrancelha esquerda, o que fez a mesma ficar falhada no sentido vertical. Eu sabia que no local do corte nunca mais nasceria pêlos para preencher a falha, e que eu ficaria permanentemente com aparência de funkeira. Eu mereço!

Após limpar os vestígios de sangue de minha face, sentei-me em um banco de madeira e fui servida com um pouco de água, pois estava com sede. Conversei com Normani e Arín sobre quem eu era e como havia ido parar ali, como eu havia imaginado, eles não haviam acreditado em uma palavra do que eu tinha dito, claro. Se é que servia de prova, mostrei-os os equipamentos que havia trago comigo na mochila. De início eles ficaram retraídos por conta da tecnologia nunca vista ou cogitada por eles, mas depois mostraram-se bem curiosos. Mostrei-os a câmera fotográfica, e pedi permissão para usá-la, para que eles vissem a funcionalidade do objeto.

— Tudo isso é impressionante, Lauren! – Normani falava encantada enquanto passava os dedos pela câmera que repousava em cima da mesa de madeira. – se você for mesmo o que diz, uma viajante do tempo, você de certa forma desafiou a Deus. Ninguém pode simplesmente voltar no passado ou simplesmente avançar para o futuro.

— Eu sou a prova viva de que existe viagem no tempo, e que o ser humano pode sim estar no passado, presente, ou futuro. E na verdade, eu desafiei e venci as leis naturais, e não a Deus. Ele não existe! – falei com convicção.

— O quê? – Arín exclamou um pouco mais alto do que o tom que usava a minutos atrás, me dando um susto pelo som alterado de sua voz.

— Se vocês acreditam nessa, tudo bem, mas eu não acredito! – dei de ombros.

— Você está ficando louca? Deus existe sim, e nós devemos servi-lo veemente.

— Não discuta, Arín. Ela certamente é atéia, e nós não podemos fazer nada a não ser lamentar se ela pensa dessa forma! – revirei os olhos discretamente para aquele comentário da negra a minha frente.

Aquelas pessoas eram ignorantes o suficiente para acreditar na existência de algo cuja a existência nunca foi provada? Eu simplesmente não perdia o meu tempo correndo atrás de algo que não existia. Podiam chamar-me do que fosse, mas continuaria cética quanto a Deus.

— Se quiser continuar viva por aqui, não exponha esse seu pensamento infame. Eles a jogaria em uma fogueira, para morrer de forma lenta e dolorosa. – os pêlos dos meus braços se eriçaram ao pensar na possibilidade. – os habitantes daqui são muito religiosos. Mas, deixemos essa conversa para trás, vamos cear.

Como já era noite, supus que o que ela chamava de ceia, fosse o jantar. Eu estava em um tempo e lugar diferente do que era acostumada, então qualquer coisa alí era normal para eles, e eu teria que me acostumar, pois pelo o que eu supunhava, não voltaria tão cedo para meu lugar de origem. Os alimentos postos a mesa foram um pão escuro e sopa de vegetais e ossos, nada chamativo aos meus olhos, mas não recusaria, pois seria muita falta de ética para com os anfitriões. Não estava tão ruim assim, até que dava para engolir, com um pouco de esforço, é claro.

ENTRE MUNDOSOnde histórias criam vida. Descubra agora