Capítulo 18: Ai Daqueles que se Amaram

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"Ai daqueles
que se amaram sem nenhuma briga
aqueles que deixaram
que a mágoa nova
virasse chaga antiga
ai daqueles que se amaram
sem saber que amar é pão feito em casa
e que a pedra só não voa
porque não quer
não porque não tem asas."

— Paulo Leminski


A claridade machucava meus olhos quando finalmente os abri, não reconheci o lugar, uma sensação de desespero tomou conta de mim. Até que vi Charles sentado ao meu lado e meu corpo todo se acalmou. — Onde estou? — Perguntei, sentindo que minha voz ainda está fraca.
— Em Dover, — ele sorri de forma reconfortante, e segura minha mão com delicadeza. É quando noto uma tala em volta de seu pulso — no hospital.
— E Emma? — Consigo perguntar, após me recordar da fração de segundo que pude vê-la, antes de a levarem para longe de mim outra vez. Charles apenas balançou a cabeça negativamente, em um sinal silencioso de que nossa aventura não dera certo. — Me desculpe por ter te colocado em apuros, sua bondade comigo não deveria ter sido recompensada desse modo.
— Helene, eu nunca me arrependerei de tentar ajuda-la, somente de não ter feito de um jeito mais eficaz. Gostaria que estivesse com sua irmã nesse momento, mesmo que tivéssemos que enfrentar alguns dragões para isso. — Abri um sorriso quase que imediatamente, ele sempre tem as palavras certas para me consolar.

Uma enfermeira puxa a cortina que nos separa dos demais para o lado, e se vira em minha direção com uma expressão amigável. — Vejo que está acordada Srta. White, está se sentindo bem?
— Sim senhora, muito obrigada — respondi, tentando me ajeitar na cama. A observei mexer em alguns armários ao meu lado, antes de colocar a mão em minha testa.
— Não me parece febril, isso é um bom sinal. — Ela aparentava ser jovem, tinha as bochechas coradas e os cabelos pretos presos em um coque na nuca. — De qualquer modo vou dar um remédio para dor, irá ajuda-la até o fim do dia, acho que poderei manda-la para casa até lá.

Ela me estendeu uma colher, a qual continha um liquido amarelado amargo, que engoli de uma vez, como mandava minhas irmãs fazerem. Assim que ela nos deixou a sós novamente, Charles se levantou segurando o chapéu entre os dedos. — Preciso ir para casa, o Sr. Brown já deve ter contado tudo para minha mãe a essa altura. Duvido que qualquer um dos dois tenha engolido minha desculpa sobre o assalto, gostaria de poder contar a verdade, mas sei que irá te colocar em problemas. Vou dizer a eles que a encontrei na volta para casa, e tivemos um pequeno acidente com a carruagem, acho que irão acreditar.

— Tudo bem — falei — muito obrigada, você sabe, por tudo.

Charles sorriu, segurou minha mão uma ultima vez e deixou um beijo em minha bochecha, que me fez corar no mesmo segundo. E então ele se foi, me avisando que mandaria William me buscar no fim da tarde.

Grace fez questão que eu descansasse por mais um dia ou dois, e logo ficou claro que todos haviam acreditado na história do acidente, o que me deixou aliviada, pois não saberia mentir caso me perguntassem. Havia passado o dia descansando, mas sentia saudades da companhia constante de Charles que tive nos últimos dias. Conforme o tempo passava, a memória parecia cada vez mais como um sonho, onde nós dois havíamos fugido de tudo e todos. — Me conta outra vez como o Sr. Taylor deu um soco no Sr. Brown! — Isabelle pediu, é claro que se havia alguém que merecia saber a verdade, era ela.

Estávamos deitadas no quarto tarde da noite, com o vento soprando os galhos contra a janela, e os cobertores até o queixo. — Céus, quantas vezes precisarei repetir? — Perguntei, segurando uma risada.

— Várias, — ela começou, se virando na cama para ficar de frente para mim — é como se você houvesse entrado em um livro e estivesse me contando a história!
— Belle, precisamos dormir, amanhã eu volto para o trabalho — insisti.
— Deus, boa sorte! Essa casa esteve de cabeça para baixo enquanto você esteve fora — falou, virando-se de barriga para cima e colocando os braços acima da cabeça enquanto fitava o teto.
— Como assim?
— Bem, não gosto de fazer fofocas, mas o Sr. e a Sra. Taylor andam discutindo muito. Consigo ouvir quase tudo enquanto estou limpando o salão de entrada. Tenho quase certeza que tem a ver com seu queridinho
— Charles? — Perguntei, para confirmar, enquanto observava as sombras que os galhos faziam na parede.
Sr. Taylor, você quer dizer. Céus, ainda fico chocada que você o chame pelo primeiro nome.
— Ora, ele detesta que o chamem assim. — Ela riu, eu sabia que Isabelle achava engraçado quando eu falava como se o conhecesse como ninguém, mas não conseguia evitar.

Amor e Outras GuerrasOnde histórias criam vida. Descubra agora