Capítulo 7

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Guido reparou, com um azedume tóxico, que aquele não era um simples carro, era uma BMW. Não um carro popular, seguro e sem graça como o seu. Uma porra de uma BMW. Com bancos de couro e um painel que parecia ter sido copiado de uma nave espacial. Adônis apertou um botão no volante e o tu-tu característico de um telefonema soou em notas perfeitas pelos alto-falantes colocados em lugares estratégicos para oferecer uma experiência de som única:

- Situação? - falou a voz do homem que atendeu.

- O pardal resgatou o filhote.

- Entendido. - e desligou.

Lá se ia o único trunfo do seu carro. Olhou para Durex. O policial tinha um sorriso de mestre-gato no rosto e apontava para o painel, olhando para Guido, como se dissesse: "Meu Deus, isso é ainda melhor dentro de uma BMW!", ao que Guido respondeu com uma carranca emburrada, apesar de concordar completamente.

- Para onde vamos? - Margarida rompeu o silêncio, transformando em palavras a pergunta que parecia flutuar dentro do carro.

- Para uma casa segura enquanto ato as pontas soltas desse caso.

Quem fala assim? Pensou Guido. "O pardal resgatou o filhote, ato as pontas... blá, blá, blá". Começou a achar que estava um pouco implicante com o homem que o salvou de no mínimo uma noite desconfortável e tediosa. Quando reparou nisso e começou a desfocar do homem que ele tomou para si como adversário – algo que seria desaconselhado pela maioria, pois ele não teria chance de ganhar – sentiu um pensamento escondido por debaixo de toda aquela adoração (tesão) por Margarida. Quem era realmente aquela mulher? Por que alguém iria querer sequestrá-la e, mais importante, por que ela teria a ajuda de um deus grego-nórdico com habilidades ninja e uma BMW? E que falava coisas como aquela besteira do pardal?

O que parecia ser uma noite em que ele havia tirado a sorte grande havia dado um duplo twist carpado e aterrissado de bunda no chão. Ia esperar chegar em um lugar mais apropriado antes de se embrenhar na ingrata missão de encontrar a verdade. Um lugar de onde ele pudesse correr ou no mínimo se esconder, não em uma pequena caixa de metal sobre rodas indo para um lugar indefinido.

O lugar indefinido foi se transformando em um edifício alto, numa rua de um bairro nobre, com portaria toda de vidro, segurança, porteiro e tudo mais que se procura quando têm-se pertences passíveis de despertar inveja alheia. Adônis parou o carro na garagem - o lugar apropriado para uma BMW - e os quatro saíram do carro, os dois amigos ainda desconfiados e sem entender muito da noite, Margarida aparentemente confiante e nada confusa e Adônis com sua jactância masculina e seu sorriso oblíquo irritante.

Seguiram-no em direção a um de três elevadores, o mais à direita, presentes ali no saguão da garagem. O elevador tinha três botões apenas, dispostos verticalmente um encima do outro, no topo o P, no meio o T e embaixo o G. Adônis apertou o P e a gaiola metálica suavemente começou sua ascensão. Uma viagem silenciosa e constrangedora, o que incomodova Guido, que teve de falar alguma coisa para não enlouquecer num espiral de insegurança.

- O que é o P?

- Penthouse. - respondeu seu rival.

- Por quê não C? De cobertura.

- Se for em inglês é mais sofisticado. O preço aumenta. - quem respondeu dessa vez foi Margar ida.

A porta se abriu nesse momento e eles foram despejados diretamente na sala ampla e luxuosa da penthouse. Com direito a sofá gigantes e brancos, tapetes felpudos e grossos e janelas enormes cercando todo o apartamento, deixando as luzes da cidade enfeitarem a casa. Como se a cidade inteira estivesse ali somente para se mostrar para quem se sentasse naqueles sofás brancos como ursos polares. Guido constatou que Durex estava deslumbrado pela riqueza do lugar. O amigo sempre fora encantado com dinheiro e as coisas advindas dele. Guido nunca ligou muito pra isso, mas mesmo assim não conseguia fechar a boca.

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