Capítulo 1

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Era tão irritante o som dos tambores. Tudo dentro de si tremia a cada batida, e ficava ainda pior em cima de um cavalo.

Parecia que a qualquer momento meu corpo poderia cair e se espatifar no chão de terra — e tudo isso graças a comitiva real da Princesa de Aradaik, que chegava a Mylathow para uma temporada de “descanso”. Entretanto sua dama de companhia — e melhor amiga, eu mesma — sabia o verdadeiro motivo para que a princesa de repente decidisse visitar o reino vizinho. Estava ali atrás do amor verdadeiro! Poderia até ser clichê, se a Princesa Makenna fosse uma pessoa romântica e melosa, mas ainda sim procurava seu tal parceiro para realizar um de seus sonhos, e uma obrigação na sua família: ter um filho.

Seus pais prezam muito o laço que o povo de Aradaik possuía ao nascer e, quando Makenna teve um sonho onde mostrava que seu parceiro estava em Mylathow, a incentivaram, e insistiram, a vir até aqui.

Para ser sincera, acho que ela só tem esse sonho de casar e blá blá blá depois de tanto ouvir "você precisa se casar, ter filhos e continuar com a linhagem da família." Mas nunca falei isso em voz alto, claro, não na frente da família real, só para minha amiga.

Todas as mulheres, que têm o sangue original de Aradaik correndo nas veias, tinha alguém especial que nasceu para ser seu. Enquanto não se encontrassem, as mulheres não engravidavam de mais ninguém. Bastava achar seu parceiro. O que para algumas não era tão simples assim. Poderiam se apaixonar por outro alguém, mas talvez não seria tão intenso como com seu parceiro.

Eu estou aqui como companhia, já que aos dez anos de idade fui encarregada de sempre ficar ao seu lado em basicamente tudo! Até quando Makenna estivesse procurando alguém para dividir a cama por uma noite em alguma festividade, ou pelos corredores, para dançar e beber. E eu, na maioria das vezes, compartilhava do mesmo desejo, não era a toa que nos dávamos tão bem. As mulheres de Aradaik tinham um certo desejo e prazer insaciáveis.

E mesmo que eu não fosse originalmente de Aradaik, já que sangue de curandeiros de Phyzank corriam em minhas veias, a princesa tinha conseguido me “corromper” para essa vida.

Brincadeira, nos corrompemos juntas.

— Será que terei que ordenar-la a colocar um sorriso no rosto, Allyria?

Virei a cabeça para meu lado direito, podendo assim observar a princesa montada em um cavalo de pelagem preta como a escuridão, completamente diferente do meu que tinha pelos brancos e dos cavalos dos quinze guardas atrás de nós com pelagem amarronzada. Makenna me olhava com uma sobrancelha arqueada e voltou a falar sem esperar uma resposta:

— Você está com uma expressão horrível no rosto, parece que quer matar alguém. Assim assustará as pessoas.

Sério que ela não estava sentindo nenhuma dorzinha com toda aquela viagem? Pois eu estava! Eu tinha todo o direito de ficar emburrada, viagens longas me deixava dessa forma. E aquela tinha durado uma semana e graças aos Deuses estava acabando.

— Não venha abusar de seu poder contra mim, princesa — falei com um falso tom arrogante, lhe lançando um sorriso de canto. — Feliz com o pedido atendido?

— Oras sua afrontosa! Lhe darei para os lobos comer!

A princesa afinou a voz e colocou uma expressão de fúria no rosto, como uma garota mimada. Ela realmente tinha lobos de estimação, e muitos outros animais — assim como panteras e tigres — eram usados na segurança do castelo e das vilas.

A olhei boquiaberta, representando uma expressão de desgosto e surpresa, mas tudo isso não durou tanto tempo já que logo nós duas estavam caindo na gargalhada. Compartilhavamos o mesmo desgosto por essas garotas mimadas que tudo tinha que fazer um pequeno escândalo. Crescemos com a mesma educação e graças aos deuses, e nossa amizade, não acabamos desse jeito. Mas aqui, no reino de Mylathow, devíamos mudar um pouco o nosso jeito de ser juntas. Eu principalmente, devia me comportar como uma educada dama de companhia. O que seria uma tarefa difícil.

A Veracidade das SombrasOnde histórias criam vida. Descubra agora