capítulo 10

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O ser humano é capaz de coisas inimagináveis, não sabemos quais são os nossos limites e talvez seja por isso que sempre vamos tão longe.

Uma criança pequena quebra a sua primeira barreira quando seu primeiro passo é dado, ela não sabe andar até então, e fazer, antes era impossível. Depois vem a segunda barreira. A fala. Chega a ser engraçado todos os grunhidos, todos os sons absurdamente incompreensíveis que os pequenos fazem até que de repente surge um “mamãe”. Logo mais e mais barreiras são quebradas, até se tornarem adultos e ainda assim continuam.

Não é preciso saber o que temos de fazer, nós apenas fazemos.

Algumas pessoas vão além, são capazes de fazer muito mais do que andar ou falar. Talvez estejam predispostas a serem sobre-humanas ou simplesmente acontece.

Eu nunca quis ver os fantasmas, e nem mesmo sabia que podia vê-los até que os vi pela primeira.

Era uma quinta feira diferente de qualquer outra. Meu pai comprou uma casa de campo e estávamos a caminho de lá. Eu estava ansioso, pedi um cavalo para meu pai e ele me prometeu comprar.

No banco do carro eu cantava uma canção de ninar que ele sempre cantava pra mim quando queria que eu dormisse.

Vamos logo passarinho
Já é hora de dormir
Vem pro ninho
Fecha os olhinhos
O seu pai esta bem aqui
Não demora
Tá na hora
Você tem que descansar
Vamos logo
Feche os olhos
Pra esse dia acabar.

Eu estava com quatro anos na época. Papai também era jovem, porem muito responsável.

-- Você vai adorar a casa nova passarinho. – Ele disse sem tirar os olhos da estrada.

-- O Thor vai estar lá? – Perguntei animado esquecendo completamente da canção.

-- Quem é Thor? – Ele riu.

-- O meu cavalo. – Falei ainda mais animado. – Ele vai se chamar Thor.

-- Jimi o seu cavalo não pode se chamar Thor...

-- E por que não?

-- Por que não é um cavalo, é uma égua.

-- E qual a diferença?

-- Éguas são meninas, Thor é nome de menino.

-- Isso não importa. – Dei de ombros. – Vou chamar ela de Thor.

Ele então ficou tenso.
Parou o carro.

Segui o seu olhar preocupado.
Havia um carro e uma motocicleta vermelha um de cada lado da pista. A moto caída com pneu dianteiro retorcido, metade sobre o asfalto a outra metade sobre o mato que crescia discretamente a beira da estrada. O carro não estava em melhor estado. O capo amaçado violentamente e o motor fumaçando.

Um acidente.

O motoqueiro jogado a alguns metros do carro, no meio do asfalto. Um casal tentava falar com ele. A mulher chorava em desespero e o homem abaixado tentando verificar o pulso do motoqueiro.

Próximo do carro uma moça de uns dezesseis anos falava desesperada no celular, dentro do veiculo um garotinho assustado chorava e podiam-se ver também as mãos enrugadas do motorista segurando imóvel o volante.

-- Fique aqui Jimi. – Meu pai falou já saindo do carro.

Ele foi até o casal. A mulher explicava algo a ele fazendo gestos exagerados. O homem meneava a cabeça preocupado, algo muito ruim havia acontecido.

De repente vi alguém no reflexo do vidro da janela. Foi muito rápido, mas havia alguém sentado no lugar onde meu pai estava sentado minutos antes. Virei rapidamente assustado e me deparei com o banco vazio.

Abri a porta do carro. Eu precisava contar ao meu pai que vi um homem no carro. Eu estava com medo.

O nosso carro estava estacionado a alguns metros longe do casal, imagino que para me poupar de ver todo aquele sangue que agora se espalhava sobre o chão. Eu já estava na metade do caminho até eles quando o som de uma buzina quebrou o silencio.

Um carro vinha em minha direção. Meu corpo parou. Meus olhos fixaram-se no veiculo que estava já muito próximo. O motorista apertava a buzina tentando chamar a minha atenção, que certamente já tinha. Ele era um senhor. Cabelos grisalhos pele morena, olhos totalmente brancos arregalados de susto. O carro não parou e quando chegou a meio metro de mim aconteceu.

O capô do veiculou amassou sem nada o tocar, mas parecia uma batida forte. O carro foi perdendo forma, se desmaterializou tão rápido que mal pude acompanhar e o que me acertou foi uma nuvem de fumaça acinzentada que desapareceu em segundos levada pelo vento.

Minha respiração estava rápida demais. Meu coração pulsava rápido demais, mas minhas pernas não funcionavam.

Freios.

Virei-me instintivamente.
Um motoqueiro virava a curva da estrada em alta velocidade. Ele tentou frear, mas a velocidade não reduzia. Preparei-me novamente para o impacto, porem não houve.

A centímetros de mim a motocicleta pareceu bater em algo que jogou o motorista para o alto enquanto ela rolava pelo asfalto. Antes de cair  ele se desfez tornando-se fumaça e perdendo-se no ar. Meus olhos incrédulos seguiu a direção para onde a moto foi arremessada e lá estava ela. A mesma motocicleta vermelha com a roda contorcida a beira da estrada. O mesmo piloto caído no chão desacordado e...

Olhei para o carro.

O mesmo carro que vinha em minha direção.
Espera onde estava o senhor que dirigia?

Andei devagar na direção do veiculo ignorando o que acontecia ao meu redor e encontrei o senhor. Ele estava sentado no banco do motorista, petrificado. Os olhos vidrados e a boca semiaberta.

Ele estava morto. O susto foi grande e o seu coração doente não suportou a emoção.

Tudo durou segundos.
Duas vidas foram tiradas. Dois fantasmas vistos. Muito sofrimento pra quem ficou e pra mim... Naquele dia minha vida nunca mais seria normal.

Depois de então eles se tornaram mais frequentes. Eu sempre os via. Em todo lugar e o que antes era assustador se tornou normal. Eles não me machucavam. Eu não tive mais medo.

Porem neste fim de semana mais uma vez as coisas mudaram. Agora eu estava com medo, porque um deles quase me matou. Jeremy ia além de qualquer coisa que eu já tinha visto, além de Calebe não havia nenhum outro capaz de me tocar. Por quê?
A duvida martelava a minha cabeça e por mais que ir embora era a melhor escolha, eu precisava ficar um pouco mais e descobrir o que realmente estava acontecendo.

-- Bem vindo ao sótão. – Falou Calebe com ar brincalhão assim que entrei pela porta.

A Casa de Jeremy rily Onde histórias criam vida. Descubra agora