prólogo

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Prólogo

Os fantasmas sempre fizeram parte da minha rotina. Eles sempre estavam lá, debaixo da cama, dentro do armário, estavam lá o tempo todo. Eles não são transparentes, não são pálidos, e nem todos são ruins.

Eles sabem que posso vê-los, sabem do meu poder, eles sempre vêm até mim. Já tentei me esconder, mas não é tão fácil, até nos sonhos eles me visitam.
No inicio foi um pouco assustador, mas depois se tornou tão normal quanto respirar.

Nunca contei sobre eles, ninguém acreditaria.

Eu estava sentado na varanda da casa, simplesmente adorava aquele lugar, havia uma mesa feita do tronco de uma arvore que eu e meu pai cortamos quando viajamos para a Amazônia, ao redor dela quatro banquinhos feitos da mesma arvore. Eu sempre sentava naquele que ficava mais próximo do lago. Sim, havia um lago.

Era outono e as folhas cobriam a superfície da agua cristalina, que naquele momento parecia um grande espelho refletindo o céu. O sol estava nascendo deixando a cor ocre da folhagem ainda mais viva.
Eu adorava acordar cedo para ver o nascer do sol, era o meu ritual matinal. Levantava-me com o céu ainda escuro, fazia chocolate quente, nunca café, nunca chá. Chocolate quente. E tomava sempre na mesma xicara marrom com grãos de café desenhados nela. Depois, vestido com o pijama cinza que usava todas as noites, eu ia para a varanda e sentava no mesmo banco e lá ficava até o sol surgir.

Steve, o meu fantasma predileto, sempre aparecia do outro lado do lago, sempre trajando a mesma camisa vermelha e calças pretas, ele acenava sorria e simplesmente desaparecia. Isso acontecia todos os dias, mas naquele momento ele não estava lá.

Nossa casa era perfeita, meu pai investiu muito nela. Construída com madeira rustica e paredes de vidro, o teto era coberto por grama, o assoalho era de madeira e o nosso jardim era a floresta, que crescia ao redor da casa. Meu pai era arquiteto, ele projetou cada centímetro da casa, mas a ideia do telhado foi minha.

O céu estava colorido, anunciando a chegada do sol da manhã, eu estava sentado e o vento estava frio. Algo se movimentou do lado de dentro da casa, atrás da parede de vidro o que chamou minha atenção. Aquele foi o dia mais triste. O dia mais sombrio. Meu pai estava parado de pé e olhava diretamente para mim, e por mais humano que parecesse eu sabia que não era ele, era a parte dele que eu não queria ver.

A caneca deslizou entre os meus dedos e partiu-se em vários pequenos cacos quando se chocou contra o chão de madeira, onde o liquido se espalhou sujando os meus pés. Olhei diretamente para o meu pai com os olhos já inundados. Eu sabia o que ele era. Eu sabia o que significava.
O fantasma estava usando o seu típico terno cinza risca de giz, o cabelo negro penteado para trás de forma elegante, os olhos que um dia foram castanhos agora estavam brancos, mas parecia me fitar, parecia querer dizer algo. Então ele foi aos poucos se desmaterializando, seu corpo se transformou em uma nuvem de fumaça acinzentada, que flutuava no ar e desapareceu como se fosse levada pelo vendo.

Meu pai estava morto.

Segundos depois, Diógenes, o nosso mordomo, me deu a noticia que eu já sabia. Foi um acidente, ele estava voltando de uma viagem, ainda faltavam oitenta quilômetros para chegar em casa, por algum motivo ele perdeu o controle, o carro capotou algumas vezes e...

O enterro foi no dia seguinte, ninguém foi visitar a família, éramos somente eu, ele e Diógenes. Sempre foi assim. Neste dia não choveu, mas também não houve sol, o céu estava cinza e o vento soprava frio arrastando as folhas secas pelo gramado do cemitério. Foi Diógenes quem organizou tudo, ele fez um bom trabalho.

Dois dias depois alguém bateu a porta de minha casa, eu não queria ver ninguém mas não pude me esconder detrás das paredes de vidro, abri a porta e lá estava uma senhora de meia idade, com cabelos loiros escondidos debaixo de um chapéu preto, assim como o seu vestido. Ela tinha os olhos mais azuis que eu já havia visto. Seus olhos eram tão azuis quanto os meus.

A Casa de Jeremy rily Onde histórias criam vida. Descubra agora