"Feito com amô!"

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LEÔNIDAS


Sai da reunião do conselho muito cansado. Fui firme, coloquei meus pontos de vista e assumi o papel de recuperação da empresa, uma tarefa nada fácil. Cheguei a minha sala com  minha mente trabalhando a mil, interfonei para Srt. Sampale:

_ Venha a minha a sala e traga sua agenda. - Nem dei tempo dela falar boa tarde e desliguei. 

 Batidas na porta.

_ Entre. - Ela estava com a agenda preta na mãos.

_ Em que posso ajudar?

_  Quero que marque reuniões com todos os setores táticos. Nossos níveis  de vendas caíram muito, estamos perdendo espaço no mercado.  Não conseguimos competir com os nossos comerciais atuais! Quero uma pesquisa de mercado focada em que os consumidores querem, quais experiências? o que esperam? Contrate uma empresa terceirizada de marketing para assessorar nosso setor de criação. Quero também especialistas no setores de pesquisa e qualidade.  Também quero uma pesquisa de clima entre os funcionários. Anotou tudo? O que eu for lembrando envio por email. Pode sair.

_ Para qual horário devo marcar as reuniões? 

_ Para ontem! E você comparecerá a todas elas. Quero tudo anotado! 

E foi assim que comecei minha peregrinação por todos os setores, minha semana passou voando. Cada dia novas ideias de recuperação iam surgindo, e encontrei em Helena Sampale uma mulher inteligente, de ideias e soluções rápidas. Discutíamos sobre tudo o que era relacionado a empresa. Reconhecia sua competência e equilíbrio. Mas também não conseguia deixar de notar sua beleza, sua elegância, e confesso que estava ficando perdido.

Estávamos chegando a última reunião daquela semana, seria com o setor de criação. Soube que simplesmente a analista do setor dispensou a ideia de uma startup de marketing consagrada assessorá-los. Dei corda durante a semana e não intervi, mas se não houvesse um bom resultado me esperando hoje a coisa ia ficar feia.

Entro em nosso mini auditório  e uma loira fabricada, com unhas extremamentes  longas e saltos "me foda agora", estava em pé em frente a bancada de apresentação. A loira se chamava Amelie e  se apresentou como analista de publicidade, logo começando  a falar sobre nossas perspectivas de mercado. Srt. Sampale a todo momento se mostrava impassível, e eu não sei porque queria observar suas reações durante essa reunião. Na verdade, para quem eu estou mentido? Queria observar suas reações o tempo todo. O julgamento dela me levava a discordar ou aceitar ideias.

Era primeira vez que não me sentia interessado sobre algo que um funcionário falava. A voz de Amelie me incomodava, aquele jeito provocativo e exagerado me fazia tamborilar os dedos. Não vou mentir, a mulher era extremamente bonita e há alguns meses era o tipo de mulher que me atrairia e eu transaria sem problemas, mas agora a achava chata. 
Depois de que me pareceram horas, mas deveria ser apenas trinta minutos, ela colocou o vídeo da nossa próxima propaganda que passaria em horário nobre. E, eu juro, que eu quase infartei.

Uma mulher negra, caracterizada de empregada, com um uniforme cafona de babados sorria para a câmera. Em uma cozinha super limpa, a mulher  que parece ter um travesseiro amarrado na cintura tira um bolo do forno cantarolando. Coloca o bolo na mesa, e nesse momento a chaleira começa a chiar. Ela pega o nosso pó de café, coloca no coador e café, então  entra na cena  uma mulher branca e bem vestida e pergunta: 

_ E esse café? Não vai ficar pronto não? - e sorri.

_ Claro, Senhora! Ele vai ficá muito gostoso, pois é feito com amô. - a empregada fala de um jeito errado bem caricato.

A mulher branca pega o bule de café pronto, dá uma cheiradinha e fala:

_ Café Vidal! O café da família tradicional.- e sorri mais uma vez.

Olho para o lado e vejo que Sampale está totalmente incomodada. E no resto dos presentes,  uns não esboçam emoção, e uma grande parte do mini auditório aplaude para puxar o saco. 

Peço que liguem a luz com um gesto. Amelie sorri:
_ O que achou, Leônidas? - Não sei de onde surgiu tamanha intimidade.

_ Amelie, de quem foi a ideia do comercial? - pergunto com a minha voz mais calma. Helena ergue a sobrancelha, aquela mulher me conhece, sabe que estou prestes a explodir.

_ Minha, Lêo.... - A interrompo na hora.

_ Bom saber! Pois você mesma irá pagar a todos esses atores para que esqueçam que um dia fizeram este comercial ! Não deixe de lado a  equipe de filmagem e som também. Quero que queime o cenário, o figurino, as gravações. Não quero rastro vinculando a VidalCofee  a qualquer coisa em relação a este comercial. Fui bem, claro?!?  E mais. Você tem até quarta feira para me entregar um novo comercial, baseado em pesquisa de verdade dessa vez! Eu quero meu público, não essa paródia da realidade. Seu emprego depende disso. Vamos, Helena!

Naquele acesso de raiva chamei Helena pelo primeiro nome. Não sei se ela percebeu, e esperava que não. Aquele comercial idiota parecia tão errado, tão ofensivo e nem mesmo eu entendia o porque. Só desejava tirar Helena dali, protege-la e pela primeira vez não quis refrear isso. E, como sempre, não queria avaliar meus sentimentos.





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