Capítulo 47

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Já havia passado 15 dias que tinha deixado o hospital, mas meu martírio não diminuía em nada. Eu tinha pesadelos durante a noite, que me fazia acordar assustada e chorando, sendo amparada pelos braços de Fernanda, que não me abandonou durante todos esses dias.

Eu não falava sobre meu problema com ninguém, pois, cada vez que o fazia, era como retornar para aquele lugar, para aquele momento. Lembro-me quando tive que dar meu depoimento na delegacia, foi um dia horrível para mim, pois, tinha que dar detalhes e isso me machucava demais.

Ontem, foi meu primeiro dia na terapia com uma doutora que me foi indicada. Fiquei exatamente uma hora dentro de uma sala, olhando para ela e sem falar uma única palavra – a não ser as coisas básicas como meu nome, idade, etc, nada mais.

O que pesa para mim nisso tudo, é saber que as pessoas ao meu redor estão tão abaladas quanto eu. Olho para o rosto de Plínio, por exemplo, e o noto cansado, triste e sem saber o que fazer para me ajudar. Ele, junto à Vanessa e Isabel, tentam me manter longe de qualquer coisa que me lembre esse episódio terrível, além de cuidar para que Gabriel não "perceba" nada.

Óbvio que meu filho percebe que a mamãe dele está triste, tanto que tem ficado mais agarrado a mim esses dias. Eu tento me manter forte por ele, mas é complicado. Muitas vezes sinto que se não fosse por ele e por Fernanda, eu já teria sucumbido na minha dor.

Falando nela, Fernanda é outra que está abalada demais com o que me aconteceu. Eu percebo, muitas vezes, seu olhar cansado, ou como ela tem se perdido em pensamentos. Ela tenta ficar ao meu lado a todo o instante, o que agradeço demais e me faz amá-la mais. Sua paciência com minhas crises de choros ou pesadelos noturnos, onde acordo chamando seu nome, me enternecem, mas eu sei que estou lhe fazendo mal. Fernanda está tão destruída quanto eu e isso me corta o coração.

Eu queria preencher meus dias, mas tinha medo de sair. Ficava em casa, a maior parte do tempo, eu e uma senhora que meu irmão contratou para me acompanhar, mas não me sentia confortável de conversar com ela, sempre que a olhava, era como se visse pena em seus olhos e aquilo me feria, mesmo sabendo que ela não sabia, exatamente, o que me ocorreu. Não sentia prazeres em coisas que antes amava fazer como ler, cozinhar, ouvir música, etc. Eu estava, cada dia mais afundada em um buraco e, o pior, levando comigo todos a minha volta.

Para piorar minha situação, Anderson havia sumido do mapa. Ele não era visto em lugar nenhum. O que me deixava mais insegura ainda, pois temia que poderia esbarrar com ele em qualquer esquina, o que aumentava minha reclusão dentro de casa.

Estava em "meu quarto", tentando me concentrar em um livro qualquer que peguei nas coisas de Vanessa, só para poder preencher minha cabeça e esquecer meus desamores, quando Fernanda entrou, vindo da agência depois de um dia de trabalho. Ela tem chegado cedo praticamente todos os dias, só para ficar comigo.

- Oi linda. - Ela falou assim que nossos olhos se cruzaram.

Sorri em sua direção e ela veio até mim, me dar um beijo rápido nos lábios. Depois de tudo, esse era o máximo de aproximação, junto aos abraços, que me permitia ter com ela.

- Oi... como foi o dia? - Perguntei curiosa, confesso que sinto falta do trabalho.

- Tudo bem. - Ela respondeu se sentando de frente para mim. - Muita coisa para organizar, mas nada que não se resolva. E você? Como passou o dia?

Suspirei diante de sua pergunta. O que poderia responder? Não queria preocupá-la, mas também não podia fingir que estava tudo bem.

- Foi... suportável. - Falei e ela me olhou estranhada. - Eu tentei preencher minha cabeça fazendo algo em casa. - Tentei explicar. - Ler, cozinhei um bolo, mas... - Dei uma pausa desviando o olhar dela, que me observava atentamente. Não havia julgamento em seus olhos, mas eu tinha vergonha de admitir. - Ainda me sinto insegura.

Sombras do Desejo (Romance Lésbico)Onde histórias criam vida. Descubra agora