Capítulo 18

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Gareth estava ali, na sala do trono de seu pai, olhando pela janela aberta, para a Corte do Rei tal como seu pai gostava tanto de fazer. Seu pai costumava caminhar pelo balcão, mas Gareth não sentia nenhuma necessidade de fazer isso. Ele estava perfeitamente feliz ali, do lado de dentro, ao lado da janela, mãos levemente entrelaçadas atrás das costas, olhando para o seu povo lá fora, desde as sombras.

Seu povo. Eles eram seu povo agora.

Ele ficou parado, enraizado no lugar, com a coroa firme em sua cabeça, tal como estava desde a cerimônia de coroação. Ele não iria tirá-la tão cedo. Ele também usava o manto real branco e preto mesmo no calor do verão e segurava na mão o longo cetro de ouro do seu pai. Ele estava começando a sentir como um rei — um verdadeiro rei — e ele adorava a sensação. Todos os seus súditos se curvariam diante dele. Diante dele, não de seu pai. Isso lhe fez sentir uma descarga de adrenalina, diferente de todas as que ele havia sentido antes. Todos os olhos estariam voltados para ele, todas as horas do dia.

Ele realmente tinha conseguido. Ele tinha dado um jeito de matar seu pai, de encobrir o crime e de eliminar todos os obstáculos entre ele e o reinado. Todos haviam sucumbido. E agora que eles o haviam coroado já não poderiam voltar atrás. Agora, não havia nada que pudessem fazer para reverter isso. No entanto, agora que Gareth era rei, ele mal sabia o que fazer. Toda sua vida ele tinha sonhado com aquele momento. Mas gora que ele tinha conseguido realizar seu sonho, ele não sabia o qual era o próximo passo. Sua primeira impressão foi a de que ser rei era solitário. Ele tinha estado ali, sozinho naquela sala por horas, observando a Corte. Mais abaixo, nas salas interiores, seu Conselho o aguardava para uma reunião. Ele tinha decidido fazê-los esperar. Na verdade, ele desfrutava fazendo-os esperar. Ele era rei e poderia fazer alguém esperar por ele se ele quisesse e por quanto tempo ele quisesse.

Enquanto ele tinha estado ali, observando seu povo, ele tinha ponderado como solidificar e garantir seu poder. Para começar, ele mandaria encarcerar e logo executar Kendrick. Era arriscado demais manter Kendrick vivo. Ele era o primogênito e também o mais amado de sua família. Ele sorriu ao pensar que os guardas já estavam a caminho para encontrar Kendrick e aprisioná-lo. Em seguida, ele mandaria matar Thor. Ele também era uma ameaça, dado que tinha sido muito achegado ao seu pai. Quem poderia saber o que seu pai lhe dissera quando estava em seu leito de morte? Talvez ele até mesmo tivesse identificado Firth. Gareth estava satisfeito consigo mesmo por ter posto em marcha um plano para o assassinato de Thor. Ele tinha inteligentemente pago a um membro da Legião para fazer o truque. Logo que eles chegassem à Ilha da Neblina, ele iria emboscar Thor e acabaria com ele. Ele estava certo de que Thor não retornaria.

Quando Thor e Kendrick estivessem fora do caminho, seria a vez de Gwendolyn. Ela também representava uma ameaça. Afinal, o último desejo de seu pai era que ela governasse. Enquanto ela estivesse viva, a possibilidade de uma revolta seria constante.

Finalmente, e o mais importante, era a questão que mais ocupava sua mente: A Espada da Dinastia. Ele tentaria erguê-la? Se ele pudesse fazê-lo, isso o distinguiria de qualquer rei MacGil que já tivesse governado. Isso faria com que o povo o amasse para sempre. Isso significaria que ele era o escolhido, aquele que estava destinado a reinar. Isso validaria sua posição e asseguraria o seu trono para sempre. Gareth tinha sonhado a vida inteira com o momento em que ele ergueria a espada, tinha sonhado com isso quando ele ainda era um menino. Uma parte dele estava certa de que ele conseguiria.

No entanto, havia outra parte dele que não estava tão certa disso.

A porta de sua sala foi aberta bruscamente e Gareth virou-se, perguntando-se quem poderia ser tão imprudente para entrar assim na sala do rei. Ficou boquiaberto quando viu que era Firth, caminhando pomposamente entre os guardas, os quais olhavam confusos para Gareth. Firth tinha ficado muito descarado desde que Gareth tinha sido coroado — atuando como se governasse junto com o rei. Gareth estava irritado com sua entrada abrupta e se perguntava se ele tinha cometido um erro ao promovê-lo com o cargo de assessor. No entanto, ao mesmo tempo, ele teve de admitir que estava feliz em vê-lo. Uma parte dele estava cansada de ficar sozinha. Ele mal sabia de quem poderia ser amigo, agora que era o rei. Ele parecia ter se isolado de todos em sua vida.

Gareth assentiu com a cabeça para os guardas, os quais fecharam a porta atrás de Firth. Firth atravessou a sala e abraçou Gareth. Ele inclinou-se e tentou beijá-lo, mas Gareth virou-se.

Gareth não estava a fim dele. Ele tinha interrompido seus pensamentos.

Firth parecia magoado, mas em seguida, rapidamente sorriu.

"Meu senhor." Ele disse, dilatando as palavras. "Você não adora ser chamado assim? É tão você!" Firth esfregou suas mãos em deleite. "Você acredita? Você é o Rei. Milhares de súditos estão esperando seu chamado para satisfazer todas suas vontades. Não há nada que nós não possamos fazer!"

"Nós?" Gareth perguntou sombriamente.

Firth hesitou.

"Eu quis dizer... você, meu senhor. Consegue imaginar? Tudo o que desejar. Neste exato momento, todos esperam por sua decisão."

"Decisão?"

"Sobre a espada." Firth disse. "Todo o Reino está sussurrando. É só nisso que todos estão falando. Você tentará erguê-la?"

Gareth o estudou. Firth era mais perceptivo do que ele pensava, talvez fosse bom tê-lo como assessor.

"E o que você sugere que eu faça?"

"Você deve tentar! Se não o fizer, você será tido como fraco demais para sequer tentar. Eles vão entender que isso significa que você não está destinado a ser rei, já que aos olhos deles, se você realmente tivesse pleno direito, você certamente tentaria erguê-la."

Gareth pensou sobre o assunto. Havia algo de verdade em suas palavras. Talvez ele estivesse certo.

"Além do mais..." Firth disse, sorrindo, aproximando-se dele, entrelaçando seus braços e caminhando com ele até a janela. "Você está destinado a ser rei. Você é o escolhido."

Gareth se virou e olhou para ele, já se sentindo envelhecido.

"Não, não estou." Ele disse honestamente. "Eu tomei o trono. Ele não foi passado para mim."

"Isso não significa que você não devia tê-lo." Firth disse. "A vida só nos dá aquilo que realmente devemos ter. Para alguns, o destino é dado a eles; outros precisam tomá-lo entre suas mãos. Isso o faz grande, meu senhor, não inferior. Pense nisso." Ele disse. "Você é o único MacGil a ter tomado um trono, o único que não ficou sentado ociosamente esperando que o trono fosse entregue de bandeja. Isso não quer dizer nada? Isso quer dizer muito, quer dizer que governará para sempre. E que se fizer isso, simplesmente imagine: todas as pessoas, de todos os lados do Anel e ainda além, se curvarão diante de você, para sempre. Você unirá o Anel. Ninguém poderia duvidar de sua legitimidade."

Firth virou-se e olhou para ele, seus olhos brilhavam com emoção e antecipação.

"Você deve tentar!"

Gareth se afastou de Firth e atravessou a sala. Ele pensou sobre isso, desejando compreender cabalmente. Firth tinha marcado um ponto. Talvez ele estivesse destinado a ser rei. Talvez ele tivesse subestimado a si mesmo; talvez ele tivesse apenas sido muito duro consigo mesmo. Afinal, seu pai estava destinado a morrer, do contrário ele não teria morrido. Talvez tudo tinha acontecido dessa maneira porque Gareth estava destinado a ser o melhor rei. Sim, talvez matar seu pai resultou no bem do reino.

Gareth ouviu um grito e virou-se, olhou para Corte do Rei e viu o desfile abaixo, era a celebração para o novo rei, ele viu as bandeiras sendo levantadas e seus soldados marchando em formação. Era um belo e perfeito dia de verão. Quando ele olhou para baixo, não pôde deixar de sentir que tudo isso realmente tinha sido destinado a ele. Era tal como Firth tinha dito: se ele não estivesse destinado a ser rei, ele não seria o rei. Ele não estaria ali naquele momento.

Ele sabia que essa era a decisão mais importante de todo o seu reinado e que era uma decisão que ele teria de tomar imediatamente. Ele desejou que Argon estivesse ali naquele momento, para oferecer-lhe conselhos, mas ele também sentiu que Argon o odiava e mesmo que ele lhe desse conselhos, ele duvidava que fossem conselhos apropriados.

Gareth suspirou e então finalmente se afastou da janela. Havia chegado a hora de tomar a primeira grande decisão de seu reinado.

"Convoque os guardas." Ele ordenou a Firth, enquanto se virava e caminhava até a porta. "Prepare a sala da dinastia."

Ele parou e virou-se para Firth, que ficou parado, olhando-o animadamente.

"Eu vou erguer a espada."

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