Domum (minha casa)

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Passei dias perturbado com aquilo. Dias.

Não contei a ninguém, nem mencionei tal fato para Morrisset e Amelie.

Nada acontecia. E eu me encontrava naquele estado profundo e disfarçado chamado choque. Os empregados passavam por mim e logo cochichavam uns com os outros. Todos sabiam que algo de estranho acontecia comigo.

Robert. Este sim era meu demônio na terra. Já disse que não o suporto? Por estes dias ele veio usando uma colônia forte, parecendo estar recém saído de um prostíbulo caindo aos pedaços. Tentou se familiarizar com Madallene, que finalmente havia chegado e tinha, como sempre, um lugar especial perto da escada, mas ela pareceu não gostar dele e saiu voando apavorada por toda a casa. Quebrou alguns vasos e claro, faria questão que o meu adorável tutor pagasse.

Eu estava com os braços para trás e minha postura estava ereta. Mais uma vez eu estava ali, perto do precipício. O limite perigoso. Parecia que a ponta do meu nariz iria congelar. Sorte a minha que fosse verão ou inverno eu sempre teria aquele fardo em mãos para me esquentar. Do contrário, eu adoraria sentir o frio lancinante dos altos daquela colina misteriosa.

"De onde você saiu?" Perguntei ignorante. Estava cansado de manter a classe com ele. Afinal, meu pai ainda não havia voltado e eu mandava naquela pocilga na sua ausência.

"Hum" Pigarreou. "Toronto." Robert respondeu ao meu lado.

Ele não gostava de mim. Eu tinha plena certeza.

"Hum. Todos quando estão no Canadá vêm de Toronto. Vocês só sabem morar lá?! Esta província é enorme!" Agarrei um pouco mais forte a cerca de ferro.

"Vejo que está mal humorado hoje. Me diga: o que está o afligindo?" Falou em um falso tom de generosidade.

"Não estou mal humorado. É apenas esta sua colônia que me dói nos nervos. Você cheira a meretriz." Permaneci sem olhá-lo. Pude notar que ele se mexeu desconfortável dentro do casaco grosso. "E aliás... Não há porquê eu me abrir com você. Afinal de contas, é os olhos e os ouvidos de meu pai."

"Creio que mousieur está se precipitando."

"Mousieur é uma pinóia. Oh, pelos céus Robert, pare de gastar sua diplomacia comigo. É deplorável. Sei que não suporta estar aqui. Eu também não. Então pare de fingir ser alguém que não é."

Perguntei-me naquele instante se eu estava estressado. E se por acaso, eu estivesse descontando em quem não deveria levar chumbo. Mas de fato, meu tutor estava sendo hipócrita. Eu sabia que ele tinha um pé no álcool, por isso buscava usar colônias tão fortes e com certeza usava substâncias químicas, como a tal da cocaína.

"Tudo bem." Foi apenas isso que disse.

Se não quis se mostrar de verdade e tentar me enganar, o que naquele nível já não era tão possível assim, era porque meu pai havia, por algum motivo, pagado muito caro para ele.

Depois de mais dois dias, passei a dormir melhor. Mas claro, que com a sorte que eu tinha, só conseguira uma noite em paz de sono.

Eu estava uma pilha de nervos, talvez isso se devesse ao fato de eu estar a usar demais os miolos. Estava me desgastando; me consumindo. Queria muito saber administrar aquilo que estava sentindo ;conseguir compreender por completo a razão de eu ter sentido tanta tristeza dentro daquela sala...

Pensava em tudo isso debaixo dos lençóis. Encolhido como uma concha à beira da praia. Tinha escutado uns barulhos no corredor que me fizeram ter aquela atitude ridícula de me esconder nas cobertas sentindo arrepios de medo.

Então eu ouvi o barulho da porta do meu quarto. Aquele rangido sofrido e lento. Espremi os olhos começando a tremer como uma vara verde, rezando o Pai Nosso e pedindo humildemente que aquilo passasse de uma vez. Logo depois passos.

Toc.

Toc.

Toc.

Toc.

Toc.

E então...

Plim

Plim

Comecei a chorar compulsivamente. Eu estava como nunca antes apavorado. Não aquele pavorzinho passageiro. Apavorado mesmo. Tinha até urinado nas minhas ceroulas. Ouvi o barulho que a poltrona fazia quando alguém sentava e pelos céus... Como eu queria ter coragem de sair correndo dali.

"Regarde moi." A voz soou rouca pelo meu quarto.

[Olhe para mim]

Cada pedacinho meu congelou. Eu estava incomodado com o odor e o constrangimento da urina, mas aquela voz... Minha Nossa Senhora... Nem sei o que falar...

"Je... Je ne peux pas-" Quase não consegui falar. Era surreal.

[Não posso]

Minha cama começou a tremer. O pavor se tornou pânico.

"Regarde moi!" Ordenou novamente.

Trêmulo eu afastei o lençol. O quarto estava escuro. A janela iluminava pouco, mas o suficiente para eu enxergar sua perna e seus dedos tamborilando próximos ao joelho. Então... Era humano? Uma pessoa? Ele se inclinou e prendi o ar esperando ver a face de um monstro.

Mas não.

Ele era lívido. Um rosto delicado, olhos de uma cor estranha e muita, muita raiva em seu semblante.

"Vous ne devriez pas rester ici. Sortez de ches moi. C'est ma maison! Intrus!"

[Você não deve ficar aqui. Saia da minha casa. Esta casa é minha! Intruso!]

Sua voz ecoou por todo o quarto e quando eu comecei a gritar minha cama parou de tremer. Permaneci aos gritos e com os olhos fechados. Até que Robert apareceu afobado no quarto.

"O que passou?! O que passou?!"

"Ali! Ali!" Apontei em direção à poltrona.

Morrisset chegou com sua lamparina.

"Frank... Não há nada ali..." Robert falou. Abri os olhos assustado, recuperando o ar perdido com meu desespero.

E para a minha surpresa e preocupação, não havia realmente ninguém lá.



Nota 2024: só pra deixar claro q eu n falo francês, tá kkkk e eu n sei o quanto do francês q aparece aqui é preciso. Eu tinha dezessete anos e o google tradutor, relevem kkkkkk

Ghost In The Snow || Frerard ||Onde histórias criam vida. Descubra agora