Capítulo 3

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O barulho insistente de uma ligação preencheu o quarto e eu suspirei ainda com os olhos fechados, disposto a ignorar. Eu ainda podia sentir o resquício do sonho, como se estivessem presos ás pontas do meu dedo. Eu me virei, e ainda com o travesseiro tampando meus ouvidos, tentei voltar para os vampiros brilhantes e quentes do sonho. Nada é tão fácil assim. O som estridente resoou por minutos até que fosse impossível não se irritar.
- Damon, desliga isso. Até quando vai deixar tocar?
Eu resmunguei e me ajeitei na cama. Dois segundos depois, Minha consciência voltou de repente, me fazendo entender onde eu estava e o nome de quem eu havia dito.
Meu corpo foi puxado para a realidade quando senti a cama mexer e sentei no colchão, assustado. Senti uma pontada de dor e não teve como negar que tudo aquilo aconteceu de fato. Damon estava virado de lado com o telefone na mão, parecendo considerar atender a chamada ou apenas ignorar pela décima vez. No fim, ele atendeu com uma cara nada contente.
- Quê foi agora, Stefan?
A voz rouca me deu arrepios e sem querer, me lembrei de algumas horas atrás quando ele gemia assim no meu ouvido e eu respondia como um louco.
- Não, estou ocupado nesse momento. Não sei se percebeu pela minha falta de vontade em atender. - Respondeu sarcástico.
E a expressão brincalhona e debochada deu espaço a uma séria e tensa, que se refletiu em mim quando o vi sentar-se na cama encostado a cabeceira. Não poderia dizer que não estava assustado com a repentina mudança de comportamento, e quando pensei em me levantar para sair, lhe dar mais privacidade e ir embora, senti sua mão em minha coxa. O encarei, e seu olhar me dizia claramente para continuar na cama. Então voltei a me deitar, observando os músculos de seus braços e abdômen enquanto ele resmungava descontente com o irmão. A mão dele ia e vinha se enroscando nos fios do meu cabelo em uma carícia gostosa e automática. Eu estava prestes a voltar a dormir quando ele desligou falando:
- Já estou indo.
Ele colocou o celular de volta na cômoda e ficou em silêncio, e nesse momento eu tive certeza de que ele estava inventando alguma desculpa para me pôr para fora, como eu sabia que ia acontecer desde o momento em que ele me beijou na noite anterior.
- Stefan está bem? - Perguntei para sair do silêncio.
- Não é sexy perguntar sobre o meu irmão enquanto está na minha cama. E nu.
Damon respondeu com diversão, apesar de estar sério. Eu ri baixo e mais uma vez sentei na cama, não evitando uma careta pela pequena dor que eu havia esquecido. Ele se levantou da cama e saiu sem dizer nada pela porta aberta.
Não sabia que horas eram, mas o sol estava nascendo e eu ainda tinha aula em pouco tempo. Pensei então em me levantar, mas a preguiça era tanta que apenas quando Damon entrou outra vez no quarto com uma cartela de comprimidos e um copo de água eu acordei com sua nudez.
- Você foi até a cozinha pelado? - Perguntei indignado.
- Não tem nada aqui que você não tenha visto ou sentido. - Damon sorriu e me deu o comprimido. - É para a dor.
- Obrigado.
Tomei toda a água de uma vez. Damon saiu andando pelo quarto pegando as roupas e mexendo nas gavetas, e eu acompanhava a bunda redondinha dele pelo cômodo.
- Posso tomar um banho antes de ir? - Questionei quando ele finalmente parou, me olhando.
- Ainda falta duas horas pra você ter que sair. Se quiser voltar a dormir, Mi casa es su casa. - Ele fez uma reverência exagerada e eu revirei os olhos.
- Como sabe meus horários?
- Sou observador.
- Hm... Não quero atrapalhar. - Me enrolei no maior lençol que encontrei na cama e levantei. - Caroline deve estar louca atrás de mim.
- O máximo que pode acontecer é você ser ignorado. - Damon deu de ombros e me jogou uma toalha. - Vou buscar suas roupas.
Apenas concordei e iniciei uma caminhada lenta até o banheiro. Pensei que Damon já havia descido, mas assim que senti o ardor na minha bunda e o estalo de um tapa, eu soube que ele continuava me observando.
- Que merda, Damon! Ainda dói, seu idiota. - Gritei e o ouvi descer as escadas.
- Com dor é melhor.
Bufei irritado e liguei o chuveiro, a água quente me relaxou aos poucos, e enquanto me ensaboava, notei que algo escorria pelas minhas coxas e era muito mais viscoso do que a água. Minhas bochechas coraram e eu tratei de lavar minha entrada com cuidado e meticulosidade. Era estranho e vergonhoso pensar no que eu fiz, me entreguei a ele sem nem ao menos hesitar. No entanto, eu sabia que não era errado. Assim como na noite anterior, eu não me arrependia de nada, mesmo sabendo que nunca passaríamos do sexo casual. E como não éramos namorados ou algo assim, saí do banheiro para não ocupa-lo.
O quarto estava vazio, a não ser por uma troca de roupas em cima da cama e uma blusa que não era minha.
Dei de ombros e vesti tudo rapidamente. A blusa ficou larga e mostrava minha clavícula marcada de mordidas e chupões. Peguei a cartela de remédios e enfiei no bolso do moletom, descendo logo em seguida.
Damon já estava trocado e picava uma série de frutas em um pote na cozinha. Eu quis rir, porque não imaginava que ele soubesse cortar alguma coisa.
- Onde está minha blusa?
- Houve um pequeno acidente com ela. Mas você fica bem assim, não se preocupe.- Ele piscou.
Eu ia contestar, dizer que eu queria ela de volta antes que algum dos meus novos amigos me virassem do avesso por ter passado a noite com ele, mas meu celular começou a tocar em algum lugar da sala.
Saí em busca dele, remexendo atrás das almofadas onde ele poderia ter caído, e depois de um tempo procurando o encontrei soterrado pelo sofá.
Trinta e seis ligações de Caroline. E mais cinquenta mensagens que não fiz questão de ver. Voltei para a cozinha com o celular em uma mão e o coração na outra. Liguei para ela na mesma hora.
- Bom dia, Carol.
Eu ouvi a respiração pesada dela, e me preparei para a bronca.
- Bom dia, Stiles. Como foi sua noite? Dormiu bem? - Disse ácida.
Olhei para Damon, que apenas riu com minha cara de desagrado e me trouxe uma tigela com frutas e o que parecia ser creme de leite.
- Me desculpa. Sério, eu ia para casa mas acabei desviando um pouco o caminho.
- Ele te machucou?
- Não, eu juro que não. Só bebemos demais e eu não queria voltar dirigindo.
- Você apenas dormiu?
- É... Dormi. Será que você pode levar a minha mochila? Não vou ter tempo de passar aí... - Ouvi um concordar rápido e então o bipe. - Ela desligou na minha cara..
- Você se acostuma.
Concordei e dei a primeira garfada na salada de frutas. O creme de leite harmonizou completamente com as frutas.
- Meu Deus, isso está muito bom. - Disse enquanto experimentava mais uma.
- Claro que sim, fui eu quem fiz.
Damon secou as mãos e andou até parar na minha frente com os braços cruzados. Ele parecia ligeiramente preocupado e irritado.
- Você não quer que ela saiba que passamos a noite juntos. - Ele afirmou. Não era uma pergunta.
- Só quero prepara-la antes para esse choque. - Respondi amuado. - Ela só falou mal de você, e se soubesse que eu dormi com você, ela me expulsa de casa.
- Então se arrepende.
- Eu não disse isso. - Falei rápido e o encarei - Por Deus, tudo o que eu menos sinto agora é arrependimento. Eu faria de novo, com toda a certeza. E mais uma vez, e mais outra.
Vi Damon sorrir com os olhos azuis brilhando, e naquele momento desejei ser um avestruz para enfiar minha cabeça em um buraco. O moreno enlaçou minha cintura e virou o banco em que eu estava sentado. Sua boca envolveu a minha com o mesmo fogo da noite anterior e eu arfei com o gosto dele.
- Se me provocar assim, vai acabar chegando atrasado. - Damon segredou. - Stefan está me esperando...
- Eu sei. E eu preciso chegar mais cedo na faculdade. - Mordi o lábio inferior dele e o senti sorrir.
- Mas poderíamos...
- Não. Eu preciso mesmo ir, Damon. - Me afastei aos poucos mesmo que o desejo fosse continuar sentindo-o contra mim.
Desci do banco e peguei meu moletom junto do celular. Ele me observava um tanto frustrado, então resolvi quebrar o clima.
- Não vai me levar até a porta? - Perguntei brincando.
O vi revirar os olhos e sair andando na minha frente. Quando ele abriu a porta e me deu passagem, sorri para ele e o beijei outra vez, como uma despedida. Ele me apertou forte como se não tivesse a intenção de soltar, mas se afastou.
- Quem sabe eu apareça aqui outro dia, gracinha.
Eu disse e pisquei, assim como ele havia feito na noite anterior. Andei até meu carro sem olhar para trás, sabendo que se eu o fizesse, acabaria por ceder a ele outra vez. Sentei no banco e olhei pelo retrovisor. Damon estava encostado na porta com um sorriso pervertido no rosto e eu sorri, imaginando que aquilo era exatamente algo que eu esperaria dele.
O caminho até a faculdade foi mais longo, nada que me preocupasse de mais. Sabia que Caroline estaria me esperando e provavelmente me esfolaria vivo, e ainda assim, aquela havia sido uma noite muito boa e... Produtiva.
O estacionamento da faculdade estava cheio, pelo horário. Faltava meia hora para as aulas começarem, e depois de cinco minutos de puro tédio, Caroline chegou. Puxei a blusa mais para trás, a fim de evitar que ela visse as marcas deixadas por Damon e sai do carro. Ela carregava uma carranca no rosto e eu sorri nervoso assim que ela me encarou.
- Obrigado por me trazer a mochila.
- Da próxima vez que você resolver brincar de casinha com Damon, não vou te ajudar. - Ela franziu o cenho.
- Não foi nada de mais, eu já disse - Falei resignado.
- Como eu vou saber? E se ele fez alguma coisa pra você eu juro que...
- Ele não fez nada. Nós bebemos e... É isso.
Não é como se meu encontro com Damon não tivesse significado nada. Eu perdi minha _virgindade_ com ele, e de alguma forma que eu não sabia explicar havia sido muito melhor do que eu esperava. Ele era um homem, claramente, e apesar de ser tudo novo para mim, gostei mais do que deveria.
- Tem certeza?
- Claro que sim. Eu lembraria se meu corpo tivesse sido violado durante a noite - Revirei os olhos e pendi a mochila no ombro.
- Me avise se for fazer isso de novo. Minha mãe ficou preocupada e eu também.
- Eu sei. Desculpe por isso, não vai mais acontecer.
- Espero que não... Bom, tenho que pegar as meninas. Nos vemos mais tarde.
Ela virou as costas e saiu. Eu respirei fundo algumas vezes antes de trancar o carro e entrar no campus. Dessa vez foi muito mais fácil achar a sala, e como da última vez, me sentei na primeira cadeira.
Na hora do almoço, a dor de cabeça veio de repente e eu sabia que precisava do meu remédio. Caroline pareceu não perceber, mas sentia Bonnie me encarando de forma diferente.
Estava claro como o dia que Bonnie sabia de alguma coisa, e a ideia de ver uma das amigas da minha prima bisbilhotando minha vida não foi agradável. Eu gostava da morena, ela tinha boas qualidades para ser uma ótima amiga, mas de alguma forma ela parecia ainda mais misteriosa do que Damon ou qualquer outro havia se mostrado. Meu instinto e esperteza me mantinham alerta para qualquer movimento ou fala que pudesse me levar a distinguir algo a mais sobre ela. O queixo torto me lembrava vagamente Scott, e eu sequer havia lhe enviado uma mensagem desde o fim de semana. Bonnie também tinha uma mania engraçada de gemer e suspirar quando ria, como se estivesse sempre cansada. Apesar de eu achar divertido, sabia que existia ali muito mais do que me contavam. Caroline poderia ser bem astuta ao esconder coisas e Bonnie seguia para o mesmo caminho.
Assim que terminei minha pequena avaliação sobre como a amiga de Caroline era estranha, fui direto para casa e me enfiei debaixo dos cobertores antes de discar o número do meu melhor amigo.
- Scott? Hey, cara.
- Stiles. Pensei que tinha esquecido da gente. - A voz de Scott atravessou a linha. - Como está indo?
- Bem, na realidade, pensei que seria mais difícil. - Disse sorrindo. - Mas não posso dizer nada, não estou aqui nem a um mês.
- E não imagina como esse lugar está um caos desde que você saiu. Se antes eu achava Derek mal humorado, agora ele está simplesmente impossível.
- E os outros? Estão bem?
Scott demorou para responder e eu senti a sua hesitação como se fosse a minha. Eu sabia que não tinha o direito de perguntar sobre eles quando o causador de tudo fui eu. Mas dentro de mim eu ainda me importava demais para apenas ignorar.
- Estão, na medida do possível. Você sabe... Demora um tempo para tudo voltar aos normal.
- É... Sinto falta da cidade, mas é melhor assim. - Suspirei resignado.
- E quando planeja voltar?
- Quando terminar a faculdade, talvez.
- Ninguém quer você fora do Pack, certo? Só pense um pouco e fale comigo antes de fazer qualquer besteira.
- Não que você pudesse fazer algo estando aí. - Eu disse debochado.
- Você pode se surpreender.
Eu estava prestes a retrucar quando ouvi um barulho oco do outro lado da linha. Chamei Scott algumas vezes antes dele responder sem fôlego.
- Derek chegou para o treino. Foi mal, cara. Tenho que ir.
- Claro, nos falamos depois.
Scott desligou logo em seguida. Fui até a cozinha e enchi um prato de comida da noite retrasada e comi sozinho. Pensei se meu pai estaria sentindo minha falta durante os jantares ou então das comidas árabes que só eu naquela cidade sabia fazer.
Eu evitei ligar para ele, pois sabia que se ele me pedisse para voltar eu não negaria. Noah era meu pai em primeiro lugar e eu sempre ia ama-lo sem me importar se ele não estava sequer falando comigo quando fui embora ou se eu estivesse meio possuído por um Kitsune maligno. Eu sentia o poder dele dentro de mim, apenas esperando por uma brecha para me enganar e coagir. Era tentador, e o resto do que eu ainda tinha de mim, sabia que uma hora ou outra ele iria vencer, como fazia no momento.
Meu corpo todo continuava a doer, e dessa vez eu não me importei se ainda estava de tarde ou se Liz podia chegar a qualquer momento.
Eu subi para o meu quarto e passei uma boa quantidade do pó cinza na minha mão e punho. Tranquei a porta e coloquei o relógio para despertar meia hora antes de Caroline voltar, rezando para que eu conseguisse acordar.
No fim, sequer precisei do despertador. Caroline demorou mais que o usual para voltar e de certa forma isso me preocupou. Quando ela chegou, seu corpo emanava raiva e insegurança, bem como a maldita preocupação.
- Quê aconteceu?
- Stefan não voltou até agora e não atendeu nenhuma das minhas ligações. - Ela disse irritada.
- Ele ligou para Damon hoje.
- O quê? Quando? - Ela me olhou analítica.
- Quando estavamos tomando café.
- Ele tomou café com você? - Ela disse surpresa.
- Bem, ele fez uma salada de frutas. E então Stefan ligou.
- Hm, não sei todos os detalhes. Damon ficou sério e disse que Stefan queria que o encontrasse em algum lugar. - Dei de ombros e sorri reconfortante. - Ele deve estar bem, certo? Não se preocupe de mais.
- Eu não sei... Quando eles saem assim só acontecem coisas ruins.
- Quê eles fazem quando saem? - Perguntei curioso.
- Você sabe, se metem em encrenca. - Ela desconversou. - Mas tem razão, estou me preocupando a toa.
- Então, vamos assistir um filme e pedir uma pizza?
- Você que manda, priminho.

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Depois de quase três semanas sem uma única palavra de qualquer um dos irmãos, comecei a pensar que talvez eles realmente tivessem se envolvido em alguma confusão mortal e que naquele momento estavam sendo enterrados em uma vala mal feita no meio do deserto do Texas.
Caroline passava a maior parte do tempo fora de casa tentando descobrir alguma coisa relevante que nos mostrasse o paradeiro de um dos dois, mas nada aparecia. Ela estava tão preocupada quanto eu por motivos igual e pessoas diferentes.
Claro que eu me importava com Stefan, ele era legal e gentil. Eu havia transado com o irmão dele e esse ser não saia da minha cabeça de forma alguma. Não era uma simples preocupação boba, porquê de alguma forma eu sabia que minhas dúvidas tinham fundamento. Era um desespero avassalador, como se eu soubesse que algo ruim estivesse acontecendo e não pudesse fazer nada para ajudar.
A única coisa que me distraia de um ataque de pânico em horas como aquela era ler os livros da biblioteca da universidade, onde eu consegui arranjar um emprego depois que o assistente da bibliotecária se mudou para outra cidade.
Obviamente, a vaga estava aberta justamente porquê ninguém em sã consciência gostaria de trabalhar com livros por ali. No entanto, o trabalho era de meio período e eu só tinha de aparecer durante a semana, ficava até um pouco depois de a faculdade fechar e ia para casa dormir.
Naquela noite não foi diferente. Eu estava organizando alguns papéis e imprimindo solicitações de cópias dos outros alunos. Irina Blackwell, a senhora caquética que cuidava da biblioteca, estava sentada na mesa atrás da bancada com um dos livros em mãos ainda que observasse qualquer coisa que eu fizesse.
Eu peguei a pequena lista de livros e, ainda tentando entender a letra dos alunos, fui até uma das prateleiras do segundo andar da biblioteca. O lugar era gigantesco, e para alguém como eu com ansiedade e TDAH era fácil se perder por ali.
Assim como o primeiro andar, o segundo era cheio de livros e mesas para os alunos ficaram durante o intervalo. Eu procurava os livros quando senti alguém me prender contra a madeira. Eu estava pronto para gritar pela velha no andar de baixo quando ouvi ele me perguntar baixinho.
- Sentiu minha falta, gracinha?

O Garoto que Fugiu do Mundo - Fanfic StamonOnde histórias criam vida. Descubra agora