As últimas semanas da minha vida estava sendo um borrão. Me mantive bastante ocupada no serviço, teve um escândalo com um político da cidade e todos os jornais estavam em cima para ter a cobertura das informações em primeira mão, e bem, o jornal em que eu trabalho conseguiu uma entrevista exclusiva. Por isso, boa parte da semana, tudo que fiz foi editar matéria, correr de um lado para o outro e ter que aguentar os xingos do Rodrigo em cima de nós. Nem tempo para nós dois tivemos nesses últimos dias.
Cheguei um dia em casa, exausta, e me joguei no sofá, pela portada varanda comecei a observar a chuva que caía lá fora, era um temporal, senti a casa gelada novamente, para variar. Acabei adormecendo e tive um sonho bem peculiar com vovó. Estávamos sentadas na varanda aqui do apartamento, eu era pequena, e ela me contava uma história, lembro que chovia que nem hoje, e eu, criança curiosa, perguntei porque chovia tanto e o porque dos trovões tão fortes, que tremia o vidro de todas as janelas. Ela disse que era Deus lavando a sua casa, e que esse barulho estrondoso eram os móveis sendo arrastados do lugar, naquele momento achei o máximo, olhei para o céu e tudo o que consegui pensar foi: " Que casa grande Deus tem! Quais móveis será que ele está arrastando? Geladeira? Estante?". Nesse momento, recebi o abraço mais doce da minha avó, e também um beijo na testa.
Minha avó não era do tipo religiosa, ela acreditava em todos os deuses presentes nas mais diversas religiões, mas ela sempre teve certeza que existia uma força maior acima de nós, e que era responsável por tudo. Devido a isso, eu sempre acreditei em Deus, ele só não tinha um forma definida para mim, mas sempre que rezava, a minha oração, eu podia sentir uma presença muito boa ali, que aquecia meu coração. E foi assim que acordei no meio da noite, toda torta em meu sofá, as duas da manhã.
Sentei no sofá, me sentindo totalmente revigorada, e então decidi pegar um dos livros da vovó, aleatoriamente, ela sempre me disse para deixar o acaso acontecer as vezes, que as coisas sempre acham um jeito de chegar até nós.
Me perdi no tempo, fui para um universo paralelo, pois perdi completamente a noção da hora lendo aquele livro, e por fim, pude finalmente entender como que os astros influenciam nossa vida. Sei que hoje é difícil acreditar em tudo isso, no misticismo, mas eu acho que temos medo, pois não vemos nada disso, nós apenas sentimos, e partindo desse pensamento, percebi que com o amor se relaciona da mesma forma. Nós temos medo de amar, de sentir e de se entregar, de dizer que gostam em apenas duas semanas, sendo que na verdade, isso não dá para medir, não tem uma norma dizendo que você só pode dizer eu te amo depois de um ano de namoro, é por isso que as pessoas se tornam frias.
Eu decidi não ter esse medo mais. Eu estava bem grande para continuar com esse drama e fantasia na minha cabeça. Percebi que talvez eu nunca tenha amado o Léo, tudo foi apenas circunstâncias da situação, do meu jeito de me prender a algo só porque parece mais fácil, e o mesmo aconteceu com ele. Nós tínhamos uma conexão? Sem dúvida, não podia negar, mas eram tantos obstáculos que se tornou difícil desenvolver esse sentimento. Já o Rodrigo, ah, eu não sei explicar como me sinto ao lado dele, é tão bom, pois sinto que consigo ver uma parte dele que ninguém mais consegue, ele fica totalmente transparente para mim, e eu espero, e quero, que ele também consiga me enxergar além da alma.
Como se parecesse telepatia, ou simplesmente o acaso, a campainha toca, e é ele. Abro a porta e sinto minhas bochechas queimarem, meu coração bate rápido, e tem também aquela famosa sensação de borboletas no estômago. Antes que ele diga algo, eu o beijo, com paixão, e ele retribui, entramos nos beijando e não paramos, fomos até meu quarto, minha cama, e paro por um momento, não porque estou hesitando, mas porque eu quis contemplar aquela pessoa maravilhosa. Aos poucos fomos nos despindo, a luz do amanhecer iluminava meu quarto, algumas frestas do sol entravam e reluziam em sua pele bronzeada, fui tomada por uma onda de excitação e me senti extasiada.
Ficamos deitados por um tempo, e pela primeira vez em tempos eu me sentia bem, acolhida, amada, o seu abraço já tinha virado casa para mim, e eu adorava, ele estava de olhos fechados fazendo carinho no meu cabelo e eu deitada em seu peito, quando, finalmente, trocamos as primeiras palavras do dia.
- Você é muito maravilhosa Oli. - Disse, me dando um beijo na testa.
Eu nem soube como responder, mas lhe dei um beijo, espero ter sido um agradecimento suficiente. Ele continuou:
- Não sei se ainda é cedo para dizer, mas, eu gosto de você Oli, me sinto diferente ao seu lado, quero sempre ser uma pessoa melhor. Sei que não tivemos muito tempo a sós nessas semanas, mas cada momento que a passamos juntos, mesmo que sejam segundos, melhoram tanto o meu dia. Nossas mensagens, a nossa conexão, as vezes eu penso que é coisa de outro mundo. - Ele riu.
- Ei, nunca é cedo para nada. Eu também gosto de você.
Vi um sorriso surgir em seu rosto, e meu coração bateu rápido novamente, acho que é o que chamam de amor.
Tomamos um banho, e o Rodrigo desceu na padaria para comprar algo para o café. Pouco tempo depois, a campainha toca, fui abrir feliz achando que era ele e me deparo com uma mulher, um pouco mais alta que eu, ruiva, que eu nunca tinha visto antes na minha vida, mas ao nosso primeiro toque no aperto de mãos, senti como se a conhecesse a séculos.
- Olá, no que posso ajudar?
- Ué, não me reconheceu?
- Bia.. - Não tive muito tempo de terminar a frase pois ela já foi entrando no apartamento.
- Deixa eu te dar um abraço! Foi tão triste ela partir, sinto muito.
A Bia não me passava confiança, nunca nos demos bem, tenho incontáveis memórias de como discutimos na infância e adolescência, a vovó sempre ficava do meu lado, porque ela era má, as meninas do colégio que o digam. É claro que de primeira eu não a reconheci, ela mudou tanto. Não sei muito bem a história, mas a um tempo atrás teve um escândalo com ela, onde se mudou no dia seguinte e nunca mais tivemos notícias. Lembro da minha mãe dizer que de pessoas com energias ruins deveríamos nos manter afastados. E ela aqui agora, no momento mais feliz da minha vida, só podia ser pegadinha do acaso.
- Ah, claro. Mas o que faz aqui?
- Como deve saber eu estava em Paris, quando soube da notícia tive que vir correndo, foi uma perda devastadora.
- Pois é, eu sinto até hoje. Aceita algo? Água, café?
Nesse momento Rodrigo chega, e eu fico sem reação, sem saber explicar direito, me sinto intimidada com ela aqui, na verdade, sempre me senti, e odeio ver que começo a perder o controle de mim mesma.
- Ah, eu não sabia que esperava visitas. Eu trouxe nosso café. - Ele sorriu se aproximando de mim e me abraçou pela cintura. Pude perceber que ela não tirava os olhos dele, e aquilo começou a me deixar muito nervosa.
- Que fofos! Estão juntos a quanto tempo?
- Ah, é... - eu me perdi na resposta, porque não sabia como responder de uma forma sem parecer que indicasse um relacionamento mais sério, até porque não sabia em que patamar nós estávamos, porém já havia mais de um mês.
- Tem um tempinho não é Oli? - Ele sorriu e eu sorri de volta.
- Tem sim. - ele apertou minha mão - A propósito Rodrigo, essa é Bia, minha prima.
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Através do Tempo
عاطفيةCapítulos semanais. :) O livro tem um blog sabia? Entra lá para conferir detalhes exclusivos da história! https://annalfp13.wixsite.com/atravesdotempo Olívia, uma jornalista de 21 anos acaba de perder a sua avó. Enquanto arrumava as coisas da casa...