Capítulo 13- Limites

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- Agora você vai me dizer o que andou fazendo por aí. E porque foi suspensa três dias da escola Sementha Jackson! - Gritou Vassilisa eufórica, levantando do sofá com rapidez demais para uma mulher com pernas tão curtas e gordas como ela. 

- Mãe eu... - Ela pensava e pensava em mais desculpas e formas de contornar Vassilisa, mas nada vinha a sua mente no momento. Justamente quando mais precisava. 

- Eu não sei mais o que fazer com você Sementha! Você é mentirosa, irresponsável. Não vai na escola, não se cuida, está enorme de gorda! Coisa ridícula! E ainda deixou sua irmã com a amiga vagabunda?! Isso, isso é o cumulo! - Vassilisa não dava chance da garota se explicar, ela era um vulcão em erupção. 

- Emma não é vagabunda! - Ela defendeu a melhor amiga, pois achava errado a mãe de acusar a amiga sendo que ela era uma boa pessoa, só não tinha sorte para arrumar um cara legal antes de Filipe é claro. 

- Ela é uma vadiazinha ordinária! Ela está grávida! Ela nem casada é! Isso é errado! E você, está grávida também Sementha?!!! - Vassilisa puxou o braço da filha com muita força, fazendo Sam sentir dor. 

- Aí mãe para! Está me machucando! - Samantha tentava se soltar, mas foi aí que o bicho pegou.

- Machucando?! Haha! - Disse ela irônica. -  Você ainda não viu nada! Nada! Porque a minha vontade é matar você á pancada! Sua vaca do caralho! - E ela continuava, golpe atrás de golpe, arrastando a garota para o sofá da sala enquanto Sam se debatia, tentando inutilmente se libertar daquela agressão doméstica. - Enquanto eu trabalho você fica por aí aprontando! Fica se encontrando com macho e trepando sua vagabunda! Isso é exemplo para sua irmã?! Hein Sementha Jackson?! - Vassilisa estapeava, puxava o cabelo da filha e batia nela como nunca. Descontava na filha toda sua raiva e frustração. 

          A mulher era uns dez á quinze centímetros mais baixa que a filha, também pintava o cabelo de loiro, era gordinha e tinha muita força. Vassilisa teve um dia péssimo segundo a mesma, porque seus colegas no trabalho falavam como sua filha era linda, mesmo sendo gorda e aquilo para ela era uma humilhação. Ela era uma mulher complicada, tinha ideias próprias que considerava certas, porém feria o sentimentos das filhas e distanciava todos a sua volta com seu gênio difícil. Jogou a filha no sofá enquanto Sam chorava implorando para ela parar com aquilo. 

- Vamos, abra essas pernas que eu quero ver se você ainda é virgem! E aí, aí de você se não for Sementha! Eu te mato!- Vassilisa não percebia o quanto era perturbada, achava que estava agindo corretamente e prevenindo a filha de ser uma mãe adolescente, mas o que ela fazia era abuso. Ela acreditava que estava sendo uma boa mãe, fazendo o que qualquer mãe descente faria a uma filha, mas ela estava completamente equivocada. 

- Não! Não! Não! Eu não quero que você faça isso! Me solta! Me solta sua louca! Eu vou ligar para polícia! - A garota se debatia tentando se defender, mas a mãe estava com muita raiva para se importar com os chutes, rasgou a calça dela e arrancou da garota, deixando á exposta. 

- Agora sim, sua vadia! Eu vou ver o que você anda aprontando! - Vassilisa rasgou a calcinha de Sam, que urinou-se enquanto chorava e sentia sua mãe tocando sua intimidade. 

          Vassilisa tinha um comportamento antiquado, errado e sádico. Ela achava que fazia tudo certo e que tinha direitos  sobre suas filhas de manter suas castidades, castigando Sam que era adulta caso tivesse relações com homens. Se houve a minima hipótese dela se relacionar com mulher, seria mil vezes pior. A mãe tocava sua filha acreditando saber "ver" se ela era ou não pura. Sam chorava e não conseguia mais lutar. A garota de dezessete anos tremia enquanto os dedos da mãe tocavam sua intimidade, descobrindo a verdade. A garota só queria morrer ou matar sua mãe. Ela não era assassina, então optou pela morte. 

        Foi então que Vassilisa soltou-se de Sam e a abraçou, pedindo desculpas e dando beijos na testa da filha que estava em estado de choque. 

- Desculpe filha, eu precisava fazer isso para o seu bem. Você não deve mais andar com Emma, ela não é uma boa influencia para uma moça de bem como você. Agora, vá tomar um banho e amanha conversamos sobre o seu castigo. -Disse ela deixando a filha ali, jogada no sofá, em estado de transe. 

        Samantha acordou de seu choque. Sentiu-se humilhada, exposta e com raiva de si própria por permitir que a mãe fizesse tal coisa. Levantou do sofá com pressa, com medo que Vassilisa voltasse e fizesse algo pior. Juntou suas roupas rasgadas, a mochila na beira da porta e correu para o banheiro onde se trancou, se sentindo um pouco mais segura. 

         Diante do espelho, Sam chorava e lavava as mãos, sentindo nojo de si mesma. Nojo e repulsa, ódio de ser fraca e de ser gorda. Ódio de não se sentir bem com seu corpo. Ódio de ser julgada pelo seu peso. Ódio de sua mãe. Ódio de seu pai que era ausente. Ódio da escola, do diretor, da professora de Biologia de todos e todos, menos de Aron. (Aron....) pensou ela, sem conseguir encarar o seu próprio reflexo diante do espelho. 

      Despiu-se do restante que havia de roupa, entrando no box. Ligou a água quente o mais forte que tinha. Chorando, tremendo, ela pensou em sua única tática de escape. A única coisa que fazia com que parasse de pensar tanto, pois sua cabeça latejava intensamente, afinal ela tinha sido espancada e abusada. 

        Foi até o comodo da pia, abriu a ultima gaveta, tirando dali uma pequena embalagem de giletes. Pegou uma delas, quebrou o cabo de plástico e voltou para o box. Fitando seu corpo, sua vida caótica, sua mãe via a sua mente. Todas as coisas horríveis que ela ouvia constantemente. Suas decepções amorosas, a escola, o vício do cigarro, as bebidas que levavam embora a sua sobriedade nas noites que ela queria se matar. Pensava em tudo, menos nas coisas e nas pessoas boas que tinha. 

      Debaixo da água, molhou seu longo cabelo loiro, fechando os olhos castanhos da cor da terra molhada. Com a lamina em sua mão, ela fez o que vinha fazendo desde que tinha onze anos, mutilando-se. Corte e mais cortes superficiais. Ela não queria nada profundo, mas queria sentir algo além da raiva, algo além da vontade de matar sua mãe com uma faca ou de tirar sua própria vida. Era disso que precisava naquele momento, uma dor insignificante, algo físico para conter o caos que estava dentro dela. 

        Conforme ela cortava sua pele, suas pernas ficavam avermelhadas e doloridas. Ela sentia a dor invadir sua alma, levando com a água quente os vestígios de sangue. A água ardia seus ferimentos, mas levava as impurezas e de certo modo, evitava que seus ferimentos ficassem sujos e criassem algum problema maior além de cicatrizes. Pequenos, longos e persistentes cortes, em fila até o joelho. Vinte em cada coxa. Bastou para aliviar seu panico. 

        Deixou a lamina com os demais objetos do banho e começou a se lavar. Lavou o cabelo, os seios que eram grandes, arredondados porém flácidos. Esfregou as costas, lavou sua intimidade com calma, tremendo ao toca-la e lembrando do que acabará de passar. Por fim, quando terminou o banho escondeu a arma do crime em uma embalagem na gavela, fez um curativo daqueles, enfaixando as pernas desde o interior das coxas até perto do joelho. Secou-se bem e saiu do banheiro enrolada na toalha e levando sua mochila. 

        Seu quarto era perto, ela entrou logo e se trancou. Tudo que não queria era Vassilisa entrando ali e pedindo desculpas. Ela não queria vê-la, nem ouvir sua voz pela eternidade. Mas ela era sua mãe, Sam morava com ela porque não tinha para onde ir. Essa era sua desgraça. 

         Vestiu seu pijama com certa pressa, guardou suas coisas e chorou outra vez. Na cama ao lado, sua irma Medussalina dormia como um anjo. Debruçada na janela do quarto, ela fitava o céu que estava azul escuro, sem estrelas. Tão triste quanto sua alma. A neve estava derretendo, ou ao menos derreteria pois não nevava mais. Aconchegou-se na cama, pensando que teria que impor limites em sua mãe, mas como faria isso sem acontecer novamente isso, ou pior?

         Eram perguntas difíceis das quais ela não tinha respostas agora. Deixou-se embalar pelo sono, pelo cansaço de um dia de trabalho e pela dor. Tanto física quanto da alma. Doía muito seu ato autoinfligido, mas dói-a mais ainda para ela a dor de seu coração em viver naquelas circunstancias. Antes de cair de vez no sono, pensou que ao menos não tinha tirado sua vida, pois o amanhã chegaria. E um dia, esse amanhã seria um dia bom. Um dia de liberdade. 

Samantha Jackson  e a Profecia do Colar da LuaOnde histórias criam vida. Descubra agora