De onde vêm as lágrimas?

Em Busca De Respostas

*Yasmim*

Meus olhos estavam focados no céu, minhas lágrimas escorrendo pelos mesmos. Lembro de Mohammed, ele estava aqui, e logo não estava mais.

-Pessoas morrem - ouço a doce voz da baleia penetrar minha minha mente - embora seja triste, temos que saber lidar com isso.

-Ele já estava morto - digo mentalmente - você não o ouviu? Ele estava morto há muito tempo. Pobre criança. Pobre.

-Yasmim - Kami me chama, percebo que no horizonte o sol começa a nascer. Irônico - vai ficar tudo bem, ok? Algumas mortes são inevitáveis e...

-Por que está tentando me consolar? - pergunto rispidamente - não sou eu quem precisa de consolo. A família dele precisa, os amigos que ele deixou, o país, ou seja lá quem o amava. Eu sou só uma desconhecida, eu não preciso de sua pena - sento sobre a baleia que voltava a nadar na superfície da água, o horizonte era uma linha fina de azul, amarelo, rosa e vermelho, tudo misturado. Lindo e mortífero - não fique com pena de mim.

-Não estou, é só que...

-O que?! - grito me virando para o garoto, ele se afasta bruscamente de mim.

-Eu nunca te vi assim...

Suspiro fundo e volto a olhar para o horizonte.

-Desculpa ter gritado com você - digo me acalmando, o garoto se aproxima de mim e se senta ao meu lado - sabe, eu nunca tive uma amizade de verdade como a sua... - paro para pensar um pouco - além do meu irmão mais velho é claro. Obrigada por estar comigo mesmo nos momentos mais difíceis.

O vejo rir fraco para mim.

-Você não parece ser do tipo solitária - fala - quero dizer...

-Sou bonita demais para ficar sozinha? - completo, ele se cala na hora como se estivesse se culpando pelo que iria dizer - é, eu já ouvi isso antes, muitas vezes - suspiro fundo - a hipocrisia das pessoas que diziam essas palavras me irritava.

-Como assim?

-Eu me identifiquei com Mohammed - falo - eu também tive algo roubado de mim. Minha inocência. Foi um amigo da família que fez isso comigo, mas ninguém acreditou quando eu disse para todos o que acontecia entre as quatro paredes. Fui abusada sexualmente por um idiota que se auto declarava santo. Hipócrita. E o pior é que sempre diziam as mesmas coisas...

-Sobre ele ou sobre você?

-Sobre mim - digo e me lembro da minha vida antes de vir parar aqui, parecia uma eternidade atrás - diziam coisas idiotas. "Você não tem depressão, isso é só drama de garota mimada. Seu irmão se matou? Idai? Você nem parece se importar. Você foi estuprada? Ah, é porque estava usando shorts curto. Todos os garotos mexe com você na rua? Ninguém mandou ser bonita. Só tem amizades falsas e interesseiras? A culpa é sua. Está se cortando e não consegue comer nada? Pelo menos viaja todo fim de ano. A escola está sendo um fardo para você? Pelo menos seu cabelo é bonito natural. Está com ansiedade e treme a toda hora? Pare de fingir! Sua vida é perfeita! Não consegue dormir? Ouve vozes? Tem pesadelos? Você está inventando coisas para chamar a atenção! Gosta de mulher e não de homem? Quanto desperdício em uma pessoa só! Tem problema em ficar em lugares lotados? Tô nem aí! Pelo menos sua pele não tem nenhuma espinha! Você está fudida mentalmente? Ninguém liga! Ninguém vê o que acontece dentro de você! Apenas finja estar bem, sorria, seja simpática, tenha um namorado, arranje um trabalho, tire notas boas, faça faculdade, crie uma família, seja perfeita. Esse é o seu trabalho no mundo, coloque todos os seus problemas embaixo do tapete e seja a garota da capa de revista da semana! Ninguém verá a modelo suicida se passar a maquiagem sobre os cortes nos pulsos e nas olheiras profundas...".