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       Há muitas maneiras lidar com a dor, além de diversas formas de seguir em frente, como também muitas maneiras de sair do luto. Por que estou falando isso? É simples, minha mãe e o resto da minha família acha que estou deprimido, acham que estou completamente maluco. Talvez seja verdade. Não posso simplesmente parar de sentir o que está dentro de mim e começar a escrever uma nova história. Não sou igual a minha mãe. Não posso do nada, apagar os sentimentos que tive por Alice, e recomeçar uma outra fase de minha vida, isso me igualaria a ela, estaria fazendo com a Alice o mesmo que ela fez com meu pai.
 
      Eu amei Alice como nunca amei nenhuma outra garota. Tenho certeza que ela também me amou. Nunca vou me esquecer daquele acidente que à tirou de mim.
 

      Passeando pelo imenso parque da pequena cidade, lembro-me de quando voltávamos juntos da escola. Ela segurava minha mão e andava dando pequenos saltos pelo ar, me beijava e dizia que eu era o seu "pequeno rei da escuridão". Alice, era única pessoa capaz de me conhecer de uma maneira incrivelmente extensa. Ela sempre gostou de bagunçar meus cachos e de alisar minha pele negra, dizia que eu era tão valioso quanto o petróleo. No começo achei isso um pouco racista, mas fui cedendo com o tempo, percebi que era só o seu jeito fofo de mostrar sua incessável fonte de afeto.
 

       É extremamente terrível permanecer em um lugar onde tudo lembra a pessoa que você ama. A escola, o parque, o bairro, a cidade de apenas 30.974 habitantes que agora é 30.973 devido sua partida.
 

       Minha mãe tem razão. Sou fraco como ser humano. Já faz um ano que ela morreu e ainda não superei, já faz um ano que ela não segura mais a minha mão e ainda não superei sua partida, já faz um ano que eu não à tenho em meus braços e não a beijo.  Aqui estou, ajoelhado em seu túmulo olhando fixamente para sua lápide e relembrando de todos os nossos momentos inesquecíveis. Como poderia esquecer de todos os seus sorrisos e seus beijos? Só se eu fosse insano.
 

        Como permiti que aquele acidente acontecesse? Era para ser eu naquele carro! Foi tudo culpa minha!
  

       Eu nunca vou deixar de amá-la. Queria poder passar o dia inteiro aqui ao lado do que sobrou de dejetos mortais, mas não posso deixar minhas emoções e sentimentos que tenho por Alice pararem ou atrapalharam o restante da minha vida acadêmica. Então, volto para o carro, mas antes de pressionar o acelerador, encaro bem fundo o lugar que abriga o grande amor da minha vida. Uma pequena lágrima resolve se deslocar de meu olho esquerdo e se deslizar pela minha face. Respiro fundo, limpo o trajeto que a tal lágrima fez em meu rosto,  coloco os óculos escuros e acelero, assim deixando o lugar onde o corpo de minha amada repousa.
   
   
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         Em casa, me concentro em todos os trabalhos que tenho que apresentar e fazer. Ligo meu notebook e começo a mexer nas pastas em uma tentativa de encontrar o meu trabalho sobre: "o coração humano". Então, vasculhando o computador, encontro uma pasta de fotos que estava perdida em meio a tanta desordem. Clico na foto, e começo a admirar as fotos da Alice, vou clicando em na tecla que tem uma seta indicando a esquerda, assim fazendo as fotos passarem em um simples passo de mágica. O sorriso dela é totalmente hipnotizante. Como eu sinto a falta dela. Sei o que todos pensão: "você tem que seguir em frente, ela iria querer que você continua-se sua vida."

          Não é fácil deixar para trás quem você ama, por mais que eu tente seguir em frente, não dá. Alice Braga é como se fosse minha droga, não consigo mais parar e nem me controlar, é como se ela fosse a minha adrenalina. Eu juro a mim mesmo que tento esquecê-la, porém sou fraco demais para abandonar seu fantasma. Talvez seja por isso que eu ainda não desfiz as coisas dela. Tenho uma estúpida esperança, que ela vai entrar por aquela maldita porta, pular no meu colo e me beijar como ela sempre fez.

          Levanto-me da cadeira e vou em direção a estante pegar um pen drive. Não posso deixar de notar um porta-retratos que está com uma foto em que Alice está sentada na grama do parque municipal. Eu tirei aquela foto quando a gente fez 2 anos de namoro, ela tinha feito um piquenique surpresa para mim. Ela era uma péssima cozinheira, no entanto, sei que ela se esforçou o máximo para me agradar.
 

            São por essas mínimas coisas que não consigo desligar-me de meus afetos amorosos.

         
            Seguro o porta-retratos, e o encaro fixamente por segundos, depois coloco no lugar. Pego o pen drive e volto para o meu trabalho. Gostaria que o fantasma de Alice se aglutina-se ao seu corpo no cemitério e para-se de me espavorir. As lembranças são encantadoras, no entanto, ao mesmo tempo aterrorizantes. Não sei se é propício continuar com essa relação doente. É como se eu estivesse em uma droga de labirinto, e Alice Lee Braga fosse as paredes que me aprisionam. Medo, essa é a palavra! Medo de não conseguir abandoná-la, medo de começar a empenhar-me para superar esse fantasma que realmente amo. E se ela realmente for embora? O que vai sobrar? Não posso perder a única coisa que amei na vida! Mas preciso ter a esperança que amanhã vai passar, então vou para o meu quarto dormir, em uma tentativa de esquecer um pouco dos meus problemas e de do fantasma que me assombra perpetuamente.

ALICE E EUOnde histórias criam vida. Descubra agora