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Depois da tempestade na casa dos pais, Luccino dormia em um dos carros da oficina. A expressão de desarme que todos tinham durante o sono poderia ocultar toda a confusão que havia acontecido um dia antes. Otávio chegou de mansinho na oficina, tão cedo que a chuva ainda não dava sinais de chegada. Por sorte, não fez barulho: deparou-se com a figura incólume do mecânico, a beleza que todos têm ao dormir, quando podemos ver um pouco da real expressão das pessoas, aquela serena, aquela plena, tranquila, sem a afetação do mundo.

O capitão teve vontade de tocar a face pálida de Luccino, mas teve de receio de lhe acordar. Até que, quando começou a chover, ele estava tão concentrado que não sentia algumas gostas respingando do teto direto para o seu uniforme. Concentrado nos detalhes que queria guardar do italiano: o cabelo bagunçado, um fio rebelde caindo na testa, a boca emoldurada. Quando o capitão percebeu que existia uma goteira perto do veículo, apressou-se para pegar o cobertor próximo e embrulhar Luccino para que não sentisse frio. Foi nesse momento em que ele o acordou, num sobressalto envergonhado.

Ao fundo, começaram a tocar as primeiras notas de uma música...

Desta vez não esqueceria. Henrique anotou os primeiros versos da música que conseguiu pescar na memória, para não se esquecer de procurá-la no Youtube mais tarde. Depois, voltou à novela. Não queria perder um segundo sequer.

... Uma música que Luccino e Otávio não escutavam, abafada pela tempestade lá fora. Luccino despertou perguntando se Otávio estava ali há muito tempo. Otávio continuou encarando-o sem responder e se aproximou da janela do carro com cuidado.

"O que aconteceu?" Perguntou, com a voz leve. "Está de pijamas ainda".

"As coisas não terminaram bem lá em casa..."

Otávio soltou o ar, olhando para a boca de Luccino.

"Eu queria... Ter ficado. Mas você me mandou embora." Completou, engolindo em seco.

Os dois silenciaram por um instante, para concentrar as palavras que viriam a seguir. O capitão sentia o coração ser confusão e mãos. Sua confusão tamborilava pelas suas próprias mãos. Uma marcha de angústia seguia por seu peito, temendo a atitude de Luccino quando ele saiu pela porta da frente depois da confusão.

"Você negou tudo, não foi? Eu entendo. Como eu te disse, eu sou órfão, mas eu imagino que por serem seus pais você..."

"Otávio!" Luccino foi pontual, interrompendo os achismos de Otávio. "Eu não neguei nada."

"Não?" Completamente surpreso, Otávio de um impulso só abriu a porta do carro e sentou ao lado de Luccino, sentindo a energia entre os dois entrar em choque. O capitão rodeou os ombros do mecânico com seus braços e os rapazes ficaram numa proximidade perigosa...

Henrique segurava-se no sofá, sentindo o balanço de todas suas terminações nervosas. Queria poder gritar de empolgação, mas em sua casa não podia. O pensamento era que ficava em polvorosa. Gritava "beijem, beijem!". Será que se beijariam? Ah, mas se colocaram um casal gay em plena novela das 18h, um beijinho teria que ter! Quando Luccino e Otávio se aproximaram no carro, Henrique prendeu a respiração. Olhou atento para sua mãe no sofá, ao lado dele, uma das mãos segurando a cabeça com a expressão impassível.

"Eles podiam se beijar, né mãe?"

"O quê?" Perguntou, distraída.

"Eles podiam se beijar. São tão bonitinhos."

A mãe deu de ombros, sem olhar para ele. Henrique afundou no sofá, sentindo a vibração do celular no bolso. Era uma mensagem no Whatsapp, do Caio, a qual imediatamente fez Henrique sorrir. Logo o Caio que nunca foi de novela, tava bem assim: "Você tá assistindo? MEU DEUS EU QUERO MEU LUTÁVIO AGORA". Só aquilo para fazer Henrique rir.

Com amor, LutávioOnde histórias criam vida. Descubra agora