Capitulo 80

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Estava exausta pela longa viagem que fizemos, mas demorei a dormir. Voltar ao nosso apartamento antigo, me trouxe tantas lembranças, foi aqui que a nossa história aconteceu, cada cantinho desse apartamento guarda um pedacinho da nossa história, acho que foi por isso que William não quis se desfazer dele.
       Foi acordada por ele sussurrando que  Guilherme tinha fome. Me sentei na cama, deparando-me com a ampliação enorme da minha foto, ainda pendurada na parede, as lembranças quase me fizeram chorar. Eu lembro perfeitamente, da reconciliação com William e de ver o quadro pela primeira vez, dele me dizendo que foi uma forma que encontrou de me ter por perto, mesmo eu estando longe.
Desde aquele dia, nunca mais voltamos a ficar longe, nosso amor só cresceu, a vinda de Guilherme nós uniu ainda mais. Will é um marido e um pai maravilhoso. E tudo que sei, é que nunca vou conseguir agradecer a Deus o suficiente pela vida que eu tenho, pela família que ele me deu.

— Bela? O que está pensando? Você está longe... — Sorrio pra ele.
— Só lembrando do dia que vi o quadro pela primeira vez... — O olhei vendo seu sorriso de lado crescer.
— A nossa reconciliação... — Ele também lembrava.
— Sim... — Seu olhar focou em mim e logo em seguida sua boca estava na minha, sua mão agarrando meu cabelo, me mantendo presa, mas eu não fugiria, nunca. Escondi meu rosto no seu pescoço desfrutando do seu abraço, eu o amo tanto...

O dia estava silêncioso e nublado, como se estivesse prevendo uma notícia ruim. Eu precisei de um tempo sozinha antes de ir para o hospital, um tempo pra conversar com Deus. Queria pedir a ele um milagre, mas isso dificilmente aconteceria, então eu pedi a ele forças, para aguentar tudo o que estava por vir.
Pensei estar sozinha, mas quando braços fortes rodearam o meu corpo, eu soube que não. Me aninhei em seu peito, respirando seu perfume. William apenas acariciou meu cabelo, lentamente e com carinho, me dando a tranquilidade que eu necessitava.
— Obrigada... obrigada por estar aqui.  — Sussurrei.
— Eu sempre vou estar contigo.
— Sei o quanto é difícil pra você. — Me afastei do seu peito, mirando seu rosto, tocando sua barba por fazer. — Então obrigada... Eu não conseguiria sozinha, você é quem me mantem de pé.
— Eu amo você, Bela. E não importa o que aconteça, não vou sair do seu lado.
— Obrigada... Te amo tanto. — O abracei novamente, ficando ali quietinha, criando coragem pra ir ver meu pai.

William realmente não saiu do meu lado,  por nada, Camilla até se ofereceu pra ir comigo, mas ele não deixou, disse que ele me acompanharia até o hospital. Assim que chegamos, preenchemos uma ficha de visitantes e uma enfermeira nos orientou o caminho até o quarto. Assim seguimos pelo corredor:
— Você não precisa entrar. — William me olhou de lado, diminuindo seus passos.
— Eu prometi que ficaria ao seu lado.
— Eu sei... Mas também sei o grande sacrifício que isso seria. Então você não precisa entrar, saber que você está na porta, me esperando é o suficiente pra mim.
— Mesmo? — Ele diz após alguns segundos de silêncio, parecendo preocupado.
— Mesmo, eu sei a dor que ele te causou, e não precisa perdoa-lo por minha causa, só precisa me abraçar quando tudo acabar.
— Eu vou estar aqui.
— Eu sei. — Toquei seu rosto com uma mão e ele me puxou, beijando minha testa. Sorri levemente querendo tranquiliza-lo e fitei a porta ao lado, abrindo-a devagar.

Assim que entrei eu o vi, ele já me olhava, como se estivesse me esperando e pela primeira vez em todos esse anos, meu pai sorriu ao me ver. Ele estava magro, muito magro, eu podia ver seus ossos desenhados sobre uma fina camada de pele, havia alguns aparelhos ligados a ele que faziam barulho, apitando. Eu quase não o reconheci, do homem forte que me fazia sentir medo, já não restava nada.
Quando ele ergueu a mão me pedindo pra me aproximar, foi que eu percebi que havia estagnado no lugar. Então devagar eu me aproximei.
— Oi. — Foi tudo que consegui falar com a voz embargada.
— Oi... — Ele falou respirando forte. — Eu pensei que nunca mais veria você. —Havia uma docura em sua voz, algo que eu nunca vi antes.
— Eu demorei pra ler a carta... — Falei me desculpando por não ter vindo antes. Ele sorriu lentamente, seus olhos estavam opacos e grandes demais para seu rosto magro.
— Você está aqui... Depois de tudo que eu fiz, você está aqui, eu não mereço isso. — Mordi o lábio, lutando contra a vontade de chorar.
— E como o senhor está? — Mudei de assunto, sentindo medo, do que ele iria me   dizer.
— Estou bem. Trocaram minha medicação, não sinto mais dor...
— Que bom... — Desviei o olhar para um aparelho, o que media os batimentos do seu coração. Eu não sabia o que dizer, a gente nunca conversou por muito tempo, não temos intimidade alguma, sempre ficamos desconfortáveis um com o outro.
— O que os médicos disseram? Não tem nada que... —  Me surpreendo quando ele pega a minha mão, me trazendo para mais perto, eu olho para nossas mãos juntas e em seguida pra ele.
— O câncer se espalhou, não se pode fazer mais nada. — Limpo rapidamente uma lágrima que escorreu. — Não fique assim, estou bem com isso, essa doença, me fez enxergar onde eu errei... E eu errei tanto com você, tanto... — Notei que ele também chorava, mas deixei que falasse, precisava saber o tamanho do seu arrependimento, precisava ouvir o quanto ele me amava. — Sei que fui egoísta em não te entregar pra Isabel, mas não aguentaria perder as duas, você era minha princesinha.
—Não, eu não, Amanda que era. — Acusei, lembrando dele me afastando e colocando Amanda no meu lugar. — Nunca me tratou como sua filha, sempre fui descartada e humilhada...
—Me perdoa... Eu não sei o que te dizer... Nunca esqueci Isabel e você era idêntica a ela, eu não conseguia te olhar... Depois eu percebi que era o melhor, te manter longe de mim, você era boa, eu estragaria você, eu estrago tudo que toco... Me perdoa, por favor... — Me afastei, dando um passo atrás, enxugando meu rosto, eu precisava de ar.
— Sei que não fui um bom pai, sei que eu machuquei você, mas pensei estar fazendo o certo...
— Não, fez porque era perverso, descontou em mim o sofrimento que a minha mãe te causou. — Ele abaixou o olhar e não se atreveu a negar. — Eu era apenas uma criança, sua filhinha, que precisava tanto de carinho...
— Me perdoa... Eu sou um monstro, eu sei... mas preciso morrer sabendo que me perdoou... — Acenti com a cabeça, meu rosto completamente molhado pelas lágrimas.
— Eu perdoou... mas antes, eu exijo que peça perdão, por ter tentado matar meu filho... — Ele tremeu, enquanto chorava sem parar, escondendo o rosto entre as mãos, envergonhado.
— Eu sinto muito, me perdoa, eu nunca quis... Foi uma estupidez, perdão... Você não merecia isso, perdão, perdão... Eu tenho tanta vergonha... Perdão, perdão filha.... Perdão... — Segurei suas mãos trêmulas e beijei sua testa.
— Tudo bem, tudo bem... — Ele me abraçou e deitei sobre seu peito, chorando como uma criança.
— Filha... minha filhinha, minha princesa, eu te amo tanto... — Eu queria falar algo, esperei minha vida toda, pra ouvir essas palavras, mas agora me sinto anestesiada  e só consigo abraça-lo mais forte.

— Eu machuquei ele? Ou ela... — Abri os olhos raciocinando sobre sua pergunta.
— Não, não machucou, Guilherme é um menino lindo, esperto e saudável.
— Por favor, nunca diga a ele, o que eu fiz...
— Eu nunca vou dizer... Vou dizer que o avô dele, o amava muito. — Ele chorou forte, soluçando sem parar e começou a tossir. Levantei do seu peito olhando-o.

— Tudo bem?... Certo, não fala mais nada, descansa, você precisa descansar...

— Não... Preciso que saiba... que eu te amo que tenho muito orgulho de você, que se eu pudesse voltar atrás...  — Ele tocou meu rosto, as palavras saiam atrapalhadas, ele chorava muito... — Só quero que seja feliz, seja muito feliz...
— Eu já sou muito feliz. — Ele sorriu pra mim, um sorriso fraco que não alcançou seus olhos opacos, de alguma forma eu soube que ele estava me deixando naquele instante.
— Eu te amo muito pai... muito... — Quando os aparelhos começaram a apitar, eu me desesperei, gritando por ajuda, foi o pior momento da minha vida, William me abraçou tão forte, mas nem mesmo ele conseguiu aliviar a dor que rasgava meu peito.
William cuidou de tudo, principalmente de mim, ele me manteve de pé, quando quase desmaiei ao ver meu pai no caixão, ver ele alí, foi muito doloroso, caiu a ficha, ele estava realmente morto, e não havia nada que eu pudesse fazer.
Não havia ninguém no velório, Jorge não havia feito amigos, ele também não tinha família, só havia eu.
E se eu não tivesse vindo? Ele ia morrer e ser enterrado sozinho. O pensamento me entristece ainda mais.
Isabel ligou dizendo que viria, ela chegou pouco depois que o corpo, a minha surpresa foi ver que ela não veio sozinha, toda nossa família estava ali. Os pais do William, Heriberto e Rafael, todos vieram. É estranho pensar que meu pai fez todos aqui sofrerem e ainda assim, são os únicos que vieram ao seu enterro. Isso me faz ver o quão incríveis são essas pessoas.

Pouco antes de fecharmos o caixão para o enterro, Amanda chegou acompanhada de um senhor de idade. Camilla me susssurou que era o marido dela. Ela não falou com ninguém, foi até o caixão, beijou Jorge e o abraçou, chorou por um longo tempo. Então o senhor que a acompanhava, falou algo pra ela e os dois se foram. Ela me olhou na saída, eu podia ver a dor dela, ela realmente amava meu pai, ele foi o melhor pai que ela poderia ter, ainda assim ela o abandonou. E casou-se com um homem com o dobro da sua idade, apenas pra não perder a vida luxuosa. Isso faz eu me perguntar se eu não seria como ela se tivesse sido educada por Jorge...
— Dizem que ele não deixa ela respirar se ele não está do lado.
— Que? — Sai do meu devaneio, olhando Camilla.
— O marido da Amanda, uma amiga dela falou que ele não deixa ela fazer nada, é muito ciumento e possessivo. Até obrigou ela a trancar a faculdade, porque mulher dele, não precisa estudar e trabalhar.
— Bom... foi o caminho que ela escolheu, não desejo mal a ela, mas não acho que ela vai ser feliz assim.
— Com certeza não, aqui se faz e aqui se paga, e ela tem muito a pagar... — Mesmo Amanda não sendo uma irmã pra mim, eu fico triste por ela, Rebecca nunca soube ensinar nada a ela.

Quando chegou a hora, me despedi do meu pai, lembrando do seu sorriso, da sua voz dizendo que me amava, que tinha orgulho de mim,  que eu era sua princesinha... Tudo que eu sempre quiz ouvir dele. E agradeço a Deus, por ter me permitido ver ele. Sei que a dor de perde-lo vai me acompanhar por muito tempo, mas estou feliz, por ter uma família que me apoia e por ter podido me despedido dele.
  Esse capitulo dá minha vida se encerrou, todo o sofrimento, o abandono, a solidão já não fazem parte do que eu sou agora, um capitulo de paz, amor e alegria se iniciou na minha vida, se iniciou no dia que um rapaz chamado William, entrou na minha vida, me pedindo em casamento.
— Vamos pra casa? — Ele surgiu ao meu lado, tocando minhas costas.
— Sim. — Deixei o buque de flores sobre o túmulo do meu pai, e abraçada a William, segui para longe dali.

Voltei 😍 Desculpa pela demora

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Voltei 😍 Desculpa pela demora. Vamos terminar essa linda história, só falta 1 capitulo 😢

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