Prólogo

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4 de dezembro de 2014

Momentos.

Existem momentos pelos quais nenhuma pessoa merece passar. A perda de alguém que você ama é um deles.

Minha mãe não me dirigiu uma palavra desde que eu apareci lá em casa dizendo que meu irmão estava morto.

Ela não acreditou em mim, pensou que não passava de uma brincadeira de mal gosto. Mas quando ela viu que eu estava arrasada, quando se convenceu de que minhas lágrimas eram verdadeiras e que o sangue na minha roupa era do meu irmão, ela teve um choque.

Começou a gritar e me balançar, pedindo para que eu dissesse que tudo não passava de uma brincadeira e que meu irmão iria aparecer der repente. Só consegui negar com a cabeça.

O que eu podia dizer? Mentir para ela e para mim mesma não iria adiantar em nada.

— Sinto muito — consegui dizer entre o choro e os solavancos que minha mãe dava em mim. — Sinto muito.

Ela me largou e caiu no sofá. Eu me encolhi no chão, com as lágrimas ainda descendo.

Meu pai chegou minutos depois, e diferente da minha mãe ele não me balançou nem gritou comigo, apenas me abraçou e abraçou minha mãe.

Ela não fala comigo desde então. Parece que tudo isso foi a muito tempo, mas aconteceu ontem a noite.

Vocês devem pensar: o que uma criança faz na rua de madrugada com um adolescente? Desculpem não explicar, não tenho condições para isso agora.

Minha mãe não fica perto de mim no enterro do meu irmão; ela nem mesmo me olha. Seus olhos não tem mais lágrimas para chorar, diferente dos meus.

Meu choro silencioso é uma raridade em meio aos gritos e soluços da nossa família e amigos. Eles foram rápidos em organizar tudo, fico grata por isso.

Sou a última a colocar minha rosa sobre as outras. A minha é branca, e se mistura entre as outras flores da mesma cor.

Essa é minha rosa preferida. Meu irmão a deu para mim no meu aniversário de dez anos.

Ele disse que representava a pureza e a inocência, pediu que eu nunca perdesse isso. Naquele dia eu estava radiante, feliz como nunca havia estado.

Coloquei a rosa na cabeceira da minha cama e fiquei admirando por um bom tempo. Eu amava rosas, mas passei a amar mais ainda depois daquele dia.

Quando me dou conta, já estão terminado de jogar a terra na cova do meu irmão. Minha mãe é a penúltima a jogar a terra. Antes de dar lugar ao meu pai, ela levanta a cabeça e me lança um olhar de dar medo.

Naquele momento percebi que ela me culpava pela morte do Alan.

Me encolhi no meu casaco grande demais. Quando meu pai terminou de jogar a última pá, ao invés de voltar para perto da minha mãe, ele vem até mim.

Me deixo ser amparada pelo meu pai. Permito que as lágrimas rolem pelas minhas bochechas pálidas, pingando na minha roupa.

Alan. Meu irmão mais velho. Tão carinhoso e amoroso, o filho preferido da mamãe. Sempre me protegia quando ela me dava bronca e levava a culpa por coisas que nós dois fazíamos.

Eu e ele éramos irmãos na mais perfeita definição da palavra, e quando ele fechou os olhos uma parte de mim também se foi.

Fecho os olhos e deixo meu pai me embalar.

♦️

Mal chegamos em casa quando minha mãe me pega pelo braço e me leva aos puxões para o quarto. Começo a chorar e me debater como louca e ouço meu pai gritar e vir atrás de nós.

Com um puxão forte, sou arrancada das garras da minha mãe e caio nos braços do meu pai.

— O que pensa que está fazendo Kat? — a voz do meu pai soa furiosa, como um rugido.

— Ela o matou! — minha mãe grita de volta — Matou meu filho!

— Ela não o matou e você sabe! — mamãe me olhou e avançou na minha direção, sendo contida por meu pai — Pare com isso Kat!

Ele a segurou pelos braços e eu me afastei. As lágrimas dela voltaram a cair e seus gritos ficaram mais histéricos.

— Meu filho! Ela matou o meu filho!

— Ele era meu filho também! — meu pai a sacudiu para que parasse de se debater — O que aconteceu com ele foi um acidente, não teve nada haver com a Mia.

— Como não? — ela se soltou do meu pai com força — Foi por culpa dela que ele caiu! Foi ela quem o fez cair!

— Pare com isso Kat!

— Ela matou o meu filho!

Fiquei em choque. Minha própria mãe me acusando da morte do meu irmão.

Dei um passo a frente com a mão estendida na direção dela.

— Mamãe... — ela se virou para mim com tanta rapidez que eu até me assustei. — Não foi...

— Nunca — sua voz agora era um rosnado — Nunca mais me chame de mãe!

Sem mais nenhuma palavra, ela se virou e subiu as escadas correndo.

Meu pai se abaixou e me abraçou.

— Sei que não foi culpa sua filha — escondi a cabeça no pescoço dele — Não foi sua culpa.

Esse foi o dia em que minha vida acabou.

Deixe-me Ir / PARADOOnde histórias criam vida. Descubra agora