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Roger nunca tinha ligado para o natal.

Pelo menos, não em seu sentido religioso. Para ele, a data era mais uma desculpa para reunir seus amigos e ficar bêbado numa festa exagerada do que um dia com intenso significado moral e filosófico. Mesmo assim, é claro, ele jamais reclamava. Qualquer ocasião que o desse a oportunidade de se afogar em álcool era uma ocasião perfeitamente válida. Uma comemoração de sua vida já era melhor do que nenhuma comemoração.

No natal de 1969, no entanto, Roger Taylor não via muitos motivos para comemorar. Ou, se via, tinha escolhido ignorá-los.

Nos últimos dias Roger vinha se afundando num poço cada vez mais profundo de tristeza e autodepreciação. Assim que saiu da cafeteria em que falara com Olivia pela última vez, tinha decidido que ele não era digno do amor que ela pudesse o dar. Cerca de trinta e seis minutos depois, entre seus soluços silenciosos e a fumaça do cigarro que fumava enquanto dirigia, decidiu que, na verdade, não era digno do amor de ninguém. Tinha certeza que, eventualmente, todos os deixariam. Queen poderia estar num bom caminho agora — indiscutivelmente estavam recebendo mais atenção do que jamais tinham recebido, incluindo a época da Smile —, mas Roger estava certo que, com o tempo, a banda veria que ele era uma pessoa completamente descartável e repugnante, incapaz de manter relacionamentos saudáveis com quem quer que estivesse ao seu redor. Até mesmo Brian, seu amigo de mais longa data, deveria perceber isso.

E, tudo isso, na verdade, era fruto de um medo de deixar as pessoas se aproximarem. Quanto mais perto elas chegassem, mais elas poderiam ver seus defeitos. Roger ainda não tinha tanta certeza assim de quais defeitos eram esses — talvez sua tendência a uma personalidade levemente destrutiva e o fato de nunca ter tido comprometimento o suficiente para se relacionar sério com uma mulher entrassem nessa lista —, mas, mesmo que suas falhas ainda estivessem enevoadas em sua mente, uma coisa da qual ele tinha sim certeza era de que não queria, de forma alguma, que as pessoas se envolvessem com ele o suficiente para serem capaz de enxergar seus erros.

Roger, com certeza, tinha extremas dificuldades em aceitar a condição humana de possuir defeitos.

Por isso, tinha optado por passar o natal desse ano sozinho em sua casa. Brian, é claro, insistiu que ele não fizesse isso. Seria o primeiro natal em que Queen passaria como uma banda, e ele tinha feito planos de um jantar especial em sua casa. Roger recusou seu convite quatro vezes, mas finalmente cedeu na quinta tentativa, quando sua exaustão emocional já tinha chegado ao limite suportável.

Chegou na casa de Brian pontualmente, o que era uma surpresa considerando que, na verdade, ele não queria ir. Brian parou de cozinhar um prato vegetariano e saiu correndo da cozinha quando ouviu o toque da campainha. Sua expressão ao abrir a porta e se deparar com Taylor mostrava que ele estava um tanto quanto surpreso. Ainda que Roger tivesse confirmado sua presença, Brian continuava com dúvidas de se ele realmente compareceria ou não. Quando o viu, deu o maior sorriso que Roger já o vira dar.

John chegou logo em seguida, seu sorriso tímido sempre presente em seu rosto. A primeira coisa que fez ao entrar na sala foi dar um longo abraço em Roger. Isso o pegou de surpresa, não estava acostumado com demonstrações de carinho tão abertas vindas de Deacy. Quando ele jogou seus braços ao seu redor, Roger teve que segurar a lágrima que tentou com muita insistência sair de seu olho. Desde quando ele tinha virado uma pessoa tão sentimental? Não sabia, mas certamente não gostava desse seu lado. Ainda assim, sentiu-se grato pelo afeto de John. Se a sua noite tinha começado péssima, agora ela estava, indubitavelmente, melhor.

Freddie chegou alguns minutos depois, distribuindo beijos para todos, como sempre costumava fazer. Não sabia porquê, mas a visão de Freddie, tão alegre quanto sempre, fez Roger sorrir. Havia algo nele que transmitia paz, independente de qual fosse a situação. Quando ele chegou perto de Roger, parou para olhar em seus olhos por alguns segundos, e puxou-o para si com uma força que tão grande que fez seus corpos se chocarem produzindo um som alto. A surpresa pelo abraço repentino fez com que Roger gargalhasse com sinceridade pela primeira vez em alguns dias.

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