Capítulo IV

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Me sinto fora de órbita, não sinto nada mas ao mesmo tempo tenho um turbilhão de sentimentos em conflito dentro de mim, mesmo estando diante dos fatos, ainda não acredito no que está acontecendo. Estou no necrotério do hospital, mas sem coragem de olhar para o corpo dela.

— Já decidiu como vai ser o velório? – ouço alguém falar e me viro, dando de cara com o médico legista.

— Ainda não, nem falei com meu pai ainda. – falo e me viro novamente, encarando o chão.

— Tem o cemitério municipal, você pode fazer uma ficha e eles cuidam de tudo. – o médico fala e eu cogito a possibilidade, aceno com a cabeça e saio da sala, do lado de fora o policial Silva me esperava.

Andamos pelo corredor até a sala de espera novamente, lá me sento e penso no que fazer, pego meu celular e ligo para o meu pai, mas o celular dele está desligado, sem mas opções resolvo ligar para Tody.

— Que surpresa. – ele diz animado do outro lado da linha, são raras as vezes que ligo pra ele.

— Han.... Tody... – falo com um nó na garganta, odeio ter que pedir ajuda para outras pessoas, sendo elas próximas ou não, sinto que estou incomodando.

— O que houve irmão? Que voz é essa. – Tody fala já parecendo preocupado.

Então, com muita dificuldade, explico para ele tudo o que aconteceu, seguro as lágrimas o máximo possível, Tody então diz que virá para o hospital, com isso eu encerro a ligação e espero ele chegar, fico ali com meus pensamentos olhando para o nada quando sinto uma mão no meu ombro.

— Iai cara, como você tá? – Tody pergunta e eu me levanto notando que ele veio com companhia.

— O que ele tá fazendo aqui? – pergunto já exaltado, odeio pessoas que não conheço direito envolvidas em meus assuntos pessoais.

— Calma cara, ele estava na porta da sua casa quando passei lá pra pegar suas roupas. – Tody fala e eu respiro fundo, pego a bolsa da mão dele e vou me trocar.

Pedi que Tody trouxesse roupas para mim, já que saí de casa sem ao menos me importar com as minhas roupas suja e do estado da casa, que pensando bem, não sei como irei arrumar toda aquela bagunça. Me troco e volto, devolvendo a bolsa para meu amigo.

— Temos que ir para a delegacia agora, o delegado já o está esperando para o depoimento. – o policial que estava comigo esse tempo todo me avisa e eu fico sem saber o que fazer, olho para Tody e ele vem até mim.

— Relaxa cara, eu fico aqui e resolvo tudo. Pode ir. – ele fala passando seu braço pelo meu pescoço. – Mas por que tem um policial aqui? – ele pergunta no meu ouvido.

— Valeu, depois eu te explico. – falo e ele concorda com a cabeça. – Já preenchi o pedido para o enterro ser no cemitério municipal, só cuida do resto. – falo e ele concorda novamente.

Saio acompanhado pelo policial, ao passar por Ítalo o encaro o fazendo abaixar a cabeça, dizem que posso ser bastante assustador quando quero e talvez esse seja um desses momentos. Vamos para a delegacia onde o delegado Fernando está me esperando, não entendo por que tenho que fazer esse tipo de coisa, mas se é pra entender melhor o que aconteceu, me sujeito a passar por isso.

Ao chegarmos na delegacia, sigo o policial Silva até uma sala onde tem uma placa escrito “ Delegado Fernando”, nessa hora me dá um frio na barriga e se ele achar que fui eu que fez aquilo com a minha mãe?! O policial abre a porta, manda eu entrar e fecha a porta ficando do lado de fora, fico parado ali.

— Sente-se. – o delegado fala e aponta pra cadeira, eu me sento. – Antes de tudo quero que saiba que não estou aqui pra te acusar de nada. – ele fala e eu volto a respirar.

— E por que eu estou aqui afinal? – pergunto já sentindo o nervoso tomar conta de mim, não pela situação, mas sim por não ter fumado nenhum back hoje.

— Você está aqui para dizer o que sabe e o que viu quando encontrou sua mãe naquela situação. – ele fala e eu concordo com a cabeça.

Fiz meu depoimento, que durou cerca de duas horas, as duas horas mas longas da minha vida, não lembro de quantas vezes tive repetir que não tinha nada haver com o que aconteceu, todas as formas possíveis, para poder convencer o delegado, ainda escutei um sermão de meia hora, sobre as consequências de ser um viciado em maconha e como isso pode evoluir até me matar, como se eu não soubesse.

Quando sair da delegacia, já estava escuro lá fora, me distanciei um pouco e acendi um cigarro, dei uma tragada longa, que fez meus olhos arderem, fumo um, dois, três e depois perco as contas de quantos já fumei, começo a perambular nas ruas desertas até chegar no hospital.

Na porta da emergência, encontro Tody e Ítalo saindo, Tody vem até mim e me segura antes que eu caísse, estava tão chapado que não conseguia ficar de pé, não sei nem como conseguir chegar até o hospital, eles falavam comigo, mas eu não entendia nada, só via as suas bocas mexendo e borrões de seus rostos, sentir Tody me apoiar em seus ombros e me levar até seu carro, ele me coloca no banco de trás deitado, ele e Ítalo entram também e saímos.

Minha cabeça parecia está sendo esmagada por um elefante, meus olhos ardiam como se tivessem passado pimenta neles e meu corpo estava pensando uma tonelada, me sentia fraco, impotente, incompetente. Sou um fardo para todos, quem merecia está naquele necrotério de hospital era eu, sendo enterrado como um indigente.

Depois de alguns minutos sentindo o balanço do carro em movimento e com os pensamentos a mil por hora, eu apago em um sono pesado e conturbado, sonhei com um lugar escuro e barulhento, mas eu não conseguia emitir nenhum som, mãos, vindas da escuridão que me cercava, tentavam me agarrar e me arrastar para onde vinham.


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