Estávamos na mecânica de Gus. Todos nós sentados em uma mesa, todos um ao lado do outro no retângulo de ferro. Tinham uns sete do nosso grupo contando comigo, mas eu me sinto tão de lado em certos momentos - como este - que ao menos sei se posso me contar como "alguém do grupo".
A IronArts, como era conhecida, é muito mais que uma simples mecânica ou lar de lata velhas. É como o nosso Pop's ou algo assim. Os carros desmontados compõem as mesas e as maiores para mais gente são como a nossa; retangular, de ferro, alta e com bancos de bar também de ferro. Era ao ar livre grande parte do estabelecimento, mas mesmo assim insistíamos em ficar na parte interna.
Sempre tinha muita gente, hoje não era diferente. Mesmo que 90% das pessoas estejam na área externa, e aqui dentro éramos apenas nós, outro grupo de amigos e mais algumas pessoas soltas.
- Ele está te olhando - Camille me disse, olhei-a com o cenho franzido. As sobrancelhas próximas uma da outra e as pequenas rugas que se formaram no centro da minha testa revelavam o quão perdida eu estava na fala da minha amiga.
Ela revirou os olhos para mim, soltando uma lufada de ar pesada.
- Ele está te olhando - repetiu. - Ali a direita, o garoto com argolas está te olhando.Virei a cabeça em 90° graus para a direita. Cammie estava certa, o garoto sentado sozinho na mesa olhava diretamente para onde eu estava sentada. Mas isso não significava que ele olhava para mim. Camille estava ao meu lado e ele poderia facilmente estar admirando as suas madeixas loiras avermelhadas.
Sua mesa e a minha eram próximas, se eu pudesse medir diria que estamos menos de cinco metros um do outro. Próximos o suficiente para eu ver suas feições faciais, mas longe para eu não ouvir o que ele fala durante o áudio que grava no aplicativo de mensagens.
Me virei novamente para a minha amiga, Cammie tinha uma expressão de encorajamento; seus olhos me diziam "converse com ele, chame-o e crie um romance de verão". Balancei a cabeça em negação e ri baixinho da cara de indignada da loira ao meu lado. Entretanto, me virei novamente para olhá-lo - lê-se apreciar.
Ele era consideravelmente alto, provavelmente passava dos 1.70. O cabelo era comprido para um corte masculino, e as argolas em suas orelhas se misturavam com os fios caramelo. Suas mãos eram cheias de anéis grandes e bonitos - muito mais do que eu tinha nas minhas - e algumas unhas pintadas de preto lascado. O sorriso brilhando no rosto, mostrando os dentes brancos e alinhados - talvez por aparelho, ou por boa genética -. Vestia uma blusa preta larga e uma skinny da mesma cor, rasgada nos dois joelhos e um All Star clássico.
Ele me olhou por um segundo, então voltou-se para o aparelho e para os meus olhos de novo. O verde claro encontraram os meus e por um milésimo de segundo eu esqueci quem eu era. O desconhecido sorriu tímido mas aberto, adorável se eu não estivesse pensando qual era a primeira letra do meu nome e, na verdade, quem ligava?
- Acho que vocês deveriam conversar - ela deu pitaco novamente. Rolei os olhos. Querer não é poder, desejei dizer. Pensei em algumas boas respostas para dizer, mas não disse nada. O silêncio perturba ela muito mais do que mil palavras que eu poderia ter dito. - Garota, eu realmente acho.
- Não ligo. - Ela deu de ombros diante a minha fala, voltou a se entrosar no meio da conversa aleatória que os meus amigos faziam, me deixando de lado; de novo.
Apenas o olhei novamente, por breves minutos e segundos. Ele transmitia algo tão bom, tão leve, tão único. Me transmitia sensações estranhas, como borboletas passeando por toda a minha corrente sanguínea e abelhas fazendo de meus órgãos flores, para que assim retirassem o pólen e levasse para outra flor: ele.
O desconhecido ao menos tirava o olhar da tela azul e aquilo já me incomodava de uma maneira peculiar, como é possível que eu que incomode tanto com a falta de atenção de alguém que ao menos me deu atenção?
Observei seus dedos se moverem rapidamente, a caixa torácica levantar e subir calmamente. Era tão ritmado quanto uma música de ninar, calma e leve. Já fazia uns cinco minutos que eu e ele estávamos na mesma posição: eu o olhando e ele digitando loucamente para alguém.
Do nada ele parou e respirou fundo, aquelas respiradas onde inspiramos até o pulmão doer e soltamos em seguida sentindo um certo alívio tomar conta do nosso corpo. Eu quase pude ouvir ele soltando o ar pela boca, mas meu cérebro não processava nenhum som. Apenas a forma como a boca dele se movia em pequenos sorrisos e bicos que eram acompanhados de sobrancelhas franzidas e ruguinhas no centro da testa.
O garoto balançou a cabeça três vezes, mexeu no cabelo e batucou Shape Of You rapidamente na mesa com os indicadores. Parecia tomar coragem para fazer algo, a forma que ele mexia o corpo sem parar alegava ser algo sério - ou ele apenas estava envergonhado o suficiente para fazer o que deveria.
Antes de levantar, ele olhou para a nossa mesa de novo. Começou pela ponta direita, na minha extrema, e seguiu o seu olhar até que ele estivesse completamente sobre mim. Desceu e subiu o glóbulo ocular, como se me analisasse, à esse ponto eu o observava apenas com o canto dos olhos.
O garoto pegou uma das frutas que Augustus sempre deixava em cima das mesas, uma maçã. Com a faca ele tirou um pedaço e levou até a boca, de novo, de novo e mais uma vez. E foi ali, pela primeira vez, que eu desejei ser uma fruta apenas para sentir como era estar próximo dele dessa forma. Ridícula situação.
Any, que estava ao meu lado, saiu com Justice em direção ao banheiro. Naturalmente as segui com olhar e varri rapidamente o prédio apenas para ter certeza que elas estavam seguras. Feito isso, estiquei meus braços sobre a mesa e escorei o queixo nas minhas mãos, deitando um pouco a cabeça no braço até me sentir suficientemente confortável. Fechei os olhos por um tempo apenas para absorver a energia do local, na tentativa de me alegrar um pouquinho que seja. Até que Cammie me cutuca.
Olhei-a com a minha maior cara de brava, os olhos semicerrados diziam "como você ousa quebrar a minha vibe" de uma forma engraçada e totalmente inútil já que a loira apenas rolou as orbes azuis e apontou com a cabeça para onde Any deveria estar sentada. Levantei o olhar aos poucos, senti quando a minha expressão de brava mudou para queixo caído, olhos arregalados e bochechas em tom carmim.
Ouvi sua risada no fundo da minha mente, quase inaudível no meio de tantos pensamentos e versões de mim gritando dentro na minha cabeça. Ouvi uma delas urrar o fato de eu estar delirando, "e se eu me beliscar isso para?". Segurei o gritinho quando torci a minha pele, entretanto ele continuava parado ali. O pedaço de maçã estendido para a minha direção e as sobrancelhas erguidas. Eu não estava delirando.
Estiquei o braço e peguei o que ele me oferecia, agradecendo baixinho. Camille me deu outro cutucão, daqueles que servem para te incentivar a fazer o que deveria ter feito há cinco minutos mas você tá parada, estática, ao menos o seu cabelo se mexe, totalmente sem reação. Limpei a garganta.
- Obrigada... hum? - Dei espaço, típico de filme Hollywoodiano que servem para que o outro diga o nome e os dois indivíduos possam ter uma conversa sem se chamar de "desconhecido" ou "garoto da mesa ao lado".
- Noah. Urrea. Noah Urrea - ele estendeu a mão, logo entrelacei com a minha e as balançamos.
- Lucie. Carpentier. Lucie Carpentier.
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Who Would Think of Our Love ~ Noah Urrea
FanfictionOnde Lucie, uma adolescente normal como qualquer outra de Los Angeles, começa a ter sonhos com um desconhecido, que, eventualmente, viria a ser seu par de física.