Nostalgia

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11 de julho de 2017

Não me lembro da última vez que senti calor. O inverno voltou pontualmente em julho, fiquei feliz pelo gato Mint ter voltado de seus passeios mais longos a tempo porque a cidade estava passando por dias realmente muito frios. A temperatura marcava 9° e eu não me lembro de já ter a visto tão baixa, é um deleite! Mas toda manhã é muito difícil sair da cama quente e fazer meu corpo enfrentar o ar gelado das seis. Subia o morro para ir à escola e sentia minhas bochechas e a ponta do meu nariz machucar com o vento gelado no meu rosto, mas eu amava. O frio me trazia conforto.

Posso me esconder nas roupas de inverno, nas botas, adiciona a rotina das bebidas quentes, tomo chá para dormir e café para despertar. Mas não consigo escrever fora de casa porque meus dedos congelaram quando tiro minhas mãos do esconderijo das mangas do moletom. Minha cabeça anda bagunçada demais para sair algo bom de qualquer forma. Vou tecendo linhas mais pelo convite do ambiente de fim de tarde, e o céu do inverno tão bonito, pela rotina de dias curtos, noites longas. Vejo a silhueta das casas no horizonte e vou contornando com os olhos, tipo de vista que melhora meu humor, me faz ter esperança de encontrar a próxima palavra para escrever e assim me fazer acreditar que estou aqui nos dias que não consigo ver meu reflexo no espelho.

Eu e o tempo continuamos a brigar, ele vai rápido demais. Tudo está indo e eu sou o fantasma que sobrevoa por todos os lados sem poder se fixar em algum lugar, atravesso paredes sem deixar rastros. Ando me perguntando que tipo de pessoa me tornei. Na maior parte do tempo fico tão cansada, apenas querendo aproveitar o frio para me encolher nas cobertas e lamentar a falta de ânimo, me tornei uma pessoa que deixa as coisas pra lá e que não se anima com nada? Tão estranho pensar que 2007 foi a 10 anos atrás, e que muitas coisas se tornaram nostalgia.

Me lembro da cabana de cobertas que eu fazia na sala de estar, que era para ser de visitas, mas era meu cantinho preferido de casa, porque era um cômodo espaçoso e iluminado, com duas grandes janelas e uma varanda. Eu virava os sofás e suspendia as cobertas e lençóis neles, enchia o chão com almofadas e travesseiros e ficava deitada, lendo ou brincando com as bonecas ou com os pobres gatinhos, que eu não deixava em paz. Me lembro também de só deitar e olhar para o telhado de cobertores de desenhos animados em cima de mim, no inverno era tão bom, no calor não aguentava ficar por muito tempo porque ficava muito quente.

Me senti mal e me perguntei se haveria problema se eu fizesse essa cabana agora. Acabei não fazendo, acho que estou velha demais para isso, virei nos lençóis e pensei como tudo estava virando nostalgia, as músicas estão ficando antigas e algumas até ultrapassadas, se é que isso é possível, e as fotos... é tanta diferença notável. Os garotos se espicharam e criaram barbas, rasparam o cabelo ou deixaram crescer, as meninas estão mais encorpadas e amadurecidas, com uma maldade no olhar. Estamos tão diferentes, será que passou mesmo tanto tempo?

Essas coisas se passaram na nossa frente, bem diante de nossos olhos, mas não há nada a se fazer. Não vou ter o ontem de volta, nem os 7 anos de volta junto com aquela cabana, e todos os sentimentos daquela pequena eu, pura, sem cicatriz alguma. Talvez por esse motivo eu não tenha me levantado e construído a barraca, não seria o mesmo, mas eu queria. Queria entrar lá e me acomodar em seu calor, olhar seu teto de cobertas, e ficar até as coisas fazerem sentido. Ficaria por lá para sempre. 

O céu não é azulOnde histórias criam vida. Descubra agora