Pink Floyd

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12 de outubro de 2018

Corto ruas conhecidas e desertas, é dia de semana, sexta feira de fluxos, mas é feriado de santos; algodão doce e pipoca para as crianças e fogos de artifício pálidos no céu de meio dia. Caminho por ruas que nunca vi, que por sua vez, nunca viram asfalto. Estradas de terra vermelha, ruas mineiras de pedra, sinos de igreja ecoando pelas montanhas. Nada parece incomodar ninguém naquele bairro que eu nem sei o nome, me perdi na primeira esquina logo depois do Santuário, e já andamos tanto.

O Pink Floyd é um campo de cogumelos ou apenas um lugar afastado, com muito mato, cupinzeiros e gado. Eu não tenho fôlego para subir a mil, mas Iago já está descalço e sem camisa, gritando e correndo pelo terreno, procurando cogumelos de estimação. Na minha direita vejo o mar de morros se estendendo por toda parte, florestas fechadas e uma caixa d'água abandonada, cercas de arame farpado e céu carregado. Na minha esquerda, Lafaiete se estende ao longe, amontoado de casinhas e asfalto. Apenas me estiquei no cobertor na grama e me intriguei com as brincadeiras bobas e preguiçosas, me contentando com tragos sutis de vinho.

Os olhos negros das vacas ao redor me intimidam, finjo indiferença e arranco a camisa para me deitar de bruços e deixar o vento secar o suor, parece que toda água do meu corpo evaporou na caminhada até aqui. Na hora do almoço comemos esfomeados, mas sem pressa, o vinho barato nos sustenta e nos hidrata, a leveza em meu corpo e o corar das minhas bochechas indicam que estou começando a ficar bêbada.

A tarde vai passando e logo está na hora de seguir a caminhada exaustiva para casa. Passando pelo Arcádia, vejo meu pai em seu traje de sempre: barba por fazer, camisa do Cruzeiro, queimado de sol e as linhas faciais mostrando a maldade do tempo. Usando o mesmo tom de voz de sempre, sustentando uma conversa sarcástica com carinho escondido. Ele também conhece o Pink Floyd e sabe o que fomos fazer lá, porque é o que ele costumava fazer também, mas não sustentamos nenhum teatro de paternidade, nos despedimos e eu continuei andando tentando não pensar a fundo sobre tudo isso.

No caminho brincamos com as teorias que explicariam nome; fomos de um show escondido da banda até uma aparição alienígena. Não gastei muito tempo tentando encontrar o significado, é mais um daqueles apelidos que surgiram por acaso e sobreviveram ao tempo porque se tornou lendário. Se tornou lendário pela repetição, pelas histórias narradas com muito êxtase, que juram que o lugar é mágico, cheio de energias místicas, histórias de caçadores de cogumelos e gente que gosta de fumar no mato.

O caminho para casa não pareceu tão longo, mas foi muito cansativo, mas valeu a pena conhecer esse lugar que todos comentam tanto, eu precisava conhecer assim como precisava conhecer a sementeira, lugares comuns para as pessoas a minha volta, mas que eu só conhecia pelo nome e pela história. Lugares de Lafaiete que eu queria ver antes de ir ver outros lugares.

Gostei dos imprevistos dos caminhos, e gostei do cansaço que senti ao chegar em casa, vendo as roupas e mochilas sujas, acho que as melhores paradas dessa cidade são suas trilhas afastadas. 

O céu não é azulOnde histórias criam vida. Descubra agora