No cair da noite

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Ergo meus olhos da tela do monitor para o relógio pela milésima vez, e não é à toa; meu tédio tem um motivo. Não apareceu um único cliente desde às 17h, e a gerente mantém o estabelecimento aberto mesmo assim.

Ela é parente da proprietária, amiga da minha mãe, e faz de tudo para bajulá-la, a senhora Tsunade. Eu gosto dela, gosto sim, mas me incomoda esse desejo constante de agradar, porque eu não consigo ser assim.

A lanchonete está à beira da estrada, perto do posto de gasolina. Falando assim, parece que estou em um lugar de quinta categoria, mas não é bem isso. Gosto de falar sobre as coisas como elas são, mas, sendo menos detalhista, o lugar é mais como um novo retrô—aconchegante e tranquilo, ideal para toda a família.

Trabalho aqui há pelo menos seis meses. Queria ocupar a mente de alguma maneira e fazer algo da vida depois de ter reprovado no vestibular. Pareceu uma ótima ideia, até para evitar as cobranças da sociedade por não fazer nada.

Pedi à senhora Tsunade para me arrumar algo, e agora tenho uma ocupação, embora seja tediosa. Ter sido reprovada não foi fácil nem para mim nem para minha mãe, que deseja muito que eu me torne médica. Não a culpo por isso. Suspiro e me levanto da cadeira atrás do balcão, desamarro o laço do meu avental de bolsos frontais e tiro o boné com o logo do local.

Minha vida está tão parada – sempre esteve, na verdade, mas parece que estagnou completamente nos últimos tempos. Enfim. Sou uma garota de 18 anos com poucas coisas interessantes para contar e sem namorados para colecionar. Às vezes comparo minha vida com a de outras meninas que conheço e a vida delas sempre parece mais emocionante que a minha, em tudo.

Suspiro e sigo para fora do estabelecimento. A última a sair é sempre a gerente, pois ela precisa fechar tudo corretamente e apagar as luzes, por sorte isso não é mais trabalho para mim. Agora que pego meu celular para ligar para o papai, vejo que a tardinha escureceu mais rápido que nos outros dias. Papai é um homem bastante ocupado, mas fez-me prometer que não voltaria para casa sozinha. A cidade está perigosa e ele é um protetor exagerado. O lado ruim de ser filha única...

Ele é o xerife da cidade há muitos anos e nem pensa em se aposentar. Depois que se separou da minha mãe, casou-se de novo, mas não teve outros filhos além de mim. Às vezes sinto falta de ter um irmão, mas Deus sabe o que faz, porque sou uma pessoa bem difícil. Ele não atende o telefone, cai direto na caixa de mensagens, e parece que está desligado; provavelmente ficou sem bateria. Enfio o aparelho no bolso da mochila e deixo os ombros caírem.

Penso em ligar para minha mãe, mas nem ela atenderia a essa hora. Como é dia de plantão no hospital, as coisas são uma verdadeira correria para ela. Minha mãe é uma enfermeira experiente e uma das mais vocacionadas para a profissão.

Esse lance de vocação é exatamente o que eu estou precisando.

Impulsiono meu corpo para frente e começo a andar rapidamente. A pista enevoada é de mão única e nenhum carro passa por ela nos primeiros 15 minutos, exceto por um que diminui a velocidade ao se aproximar e baixa o vidro, me deixando um pouco nervosa.

— Ino! — Falo sorridente, gritando aleluia internamente quando vejo os fios loiros dela balançando ao vento na janela. A temperatura caiu bastante, e realmente já estava começando a me arrepender de ter vindo a pé.

— Vem, entra, te dou uma carona. — Ela fala, e eu não preciso de mais nada. Assim que entro e coloco o cinto de segurança, aqueço as mãos uma na outra, sentindo o carro entrar em movimento. — Seu pai não veio te buscar hoje? — Pergunta, mirando seus olhos azuis em mim enquanto encosto a cabeça, a voz dela se mistura ao som do rádio tocando uma música que eu gosto muito da Grimes "Oblivion".

Night angels (Concluída)Onde histórias criam vida. Descubra agora