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Ela pressentia que algo não ia nada bem, um incômodo que fazia algum tempo.

Bem na ponta da projeção ela ficou em pé, com os braços abertos e depois os ergueu, como um mergulhador que se posiciona para o salto. Parecia concentrada. Respirou fundo sentindo a tensão percorrer a sua essência. Então desfez o movimento, se sentando e olhando para baixo, com a cauda enrolando em seu tórax e com a ponta pousando em seu ombro. A parte parecia ter consciência própria. Ela sorriu se sentido bem com o afago, mas o seu semblante se adensou ao se lembrar do compromisso.

"Melhor ir logo."

Pensou se teletransportando. Ela percebia que cada vez gastava menos energia nessa realização.

Novamente chegou ao local, mas dessa vez havia bem menos objetos no ambiente.

"O que estará acontecendo aqui?"

E, assim que parou próxima do balcão, pode ouvir vozes distantes, conversando como se trabalhassem em uma grande arrumação:

— É por causa do formato? — Perguntou um.

— Sim. E também pelo tipo de material.

— Será que vai caber tudo? — Perguntou um que estava em outra ponta.

— Nem sabemos como será ou quem é o enviado. — Respondeu um que empilhava.

— Vão arrumando. Vão organizando.

E, quem falava, se calou, percebendo que era aguardado. Rápido saiu de onde estava e se dirigiu para a entrada, encontrando a cliente.

— Olá. Ainda não tem interesse em se identificar? — Saetele sorriu, escorando o cotovelo e a lateral no balcão.

Ela nada falou sobre isso e foi direto ao ponto:

— Tem as minhas respostas?

— Algumas. — Ele a olhou novamente de cima abaixo e, de novidade dessa vez, apenas uma bolsa. — Vamos lá! Sobre armaduras: seria bom que obtivesse uma, afinal ela lhe serviria de proteção. Essa é a função delas.

— Mas não penso em combater. Nunca pensei. — Ela foi enfática.

— Ok. Pensei também na sua adaga. Ela não te acrescenta nada, independente de usá-la para combate ou não. — Ele puxou de cima, um rack que desceu até quase tocar o móvel, e estava cheio de adagas. — Tenho algumas aqui que são diferentes. Algumas acrescentam mais velocidade, outras mais sorte. Essa daqui, por exemplo, aumenta a sua vitalidade.

E colocou essa arma sobre o balcão, diante da agora pensativa criatura.

— Entendo mas, antes de qualquer acerto, e quanto a demais itens?

Saetele novamente a olhou satisfeito sentindo que a negociação avançava:

— Certo! Já pensa em um kit completo, não é? Isso é muito bom. Quanto a sua baixa energia, podemos tentar um acessório de fissão ou fusão.

— Fissão? Fusão? Há diferenças?

— Algumas. Residual, de perda, de suprimento e de dano.

— De dano? Infligido ou recebido? — Havia curiosidade e preocupação.

— Ambos. Porque, quando um átomo e partido, a liberação de energia e muito grande, trazendo efeitos também sobre quem faz uso do item. No caso da fusão a energia é muito alta, e com pouca liberação de outras partículas. Já no caso da fissão, a energia é melhor, mas resulta em partículas radioativas. Por isso eu te informei sobre a armadura.

— Presumo que qualquer item à base de fusão seja caríssimo.

— Um pouco. — Saetele não quis alardear a possível cliente. Realizaria o atendimento com o manual do bom vendedor debaixo do braço. — Mas não precisamos fazer cálculos agora.

Ela ponderou mais um pouco e, nesse momento, sua mão tamborilou sobre a bolsa.

— Não acho que consigamos resolver meu problema então, que tal atenuá-lo?

Saetele sorriu, satisfeito com a nova ideia.

— Concordo mas, antes me diga: o que há na bolsa?

Logo a pequena entidade a segurou pelo fundo e virou sobre o balcão, revelando as várias peças: anéis, brincos, pulseiras, cordões, piercings, gargantilhas, braçadeiras, além de uma capa.

— Caramba! Onde conseguiu tudo isso?

Quando iria responder, bem ao fundo, de frente para ela, uma luz alaranjada brilhou iluminando antigos pilares que vinham até próximo ao local de atendimento. Na sequência ouviu-se um rosnado que ribombou por todos os lados daquela construção. Saetele cessou o falar, sabendo o que viria. Aos poucos, cores foram surgindo daquele fundo, vindo em sua direção. Elas revelaram uma figura opulenta que parecia sair de uma espécie de camuflagem, como de um manto de invisibilidade.

— Senhor Brasholais. — E lhe fez reverência.

— Saetele... Como está o atendimento?

— Seguindo bem, senhor.

Com mais de sete metros de altura, trajando apenas calça e colete brancos, com um brinco de argola e uma larga pulseira, ele se abaixou para falar com ela:

— E você, arcanja, quem é?

A pergunta, revelando a sua hierarquia, a incomodou um pouco, mas ela respondeu:

— Gostaria de permanecer inominável.

— Como queira. Mas pode responder a pergunta de meu auxiliar?

— Posso.

Passando por trás de uma pilastra próxima, ele saiu do outro lado empurrando uma cadeira com rodinhas na base.

— Sente-se. Detalha-nos essa história.

BOIN - Amor das ProfundezasOnde histórias criam vida. Descubra agora