8 ♻ flowers ♻

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Não estava chuva, mas o tempo era triste. 

Dizem, alguns, que essa coisa de associar sentimentos e emoções a coisas inanimadas é coisa ridícula, mas como poderá ser quando existe um sentimento tão estrondoso e forte que pode ser associado a qualquer coisa? Triste tristeza...

Mas não é verdade? O tempo parece triste, estas roupas são tristes, a solidão é triste, é um sol triste, um caminho triste, uma paragem triste, uma música triste, um poema triste, olhos tristes e sorrisos? Tristes. 

O tempo era triste naquele dia porque era cinzento, e porquê que o cinzento não pode parecer triste? No céu haviam nuvens da mesma cor, carregadas de gotinhas prontas a cair a qualquer momento, mas não chovia ainda. 

''Eu disse que estava chuva... É melhor não irmos.'' 

Foi a primeira coisa que Jimin me disse quando me viu na porta do seu prédio, onde tínhamos marcado de nos encontrar às exatas onze horas daquela manhã de sábado, mas a única coisa que eu fiz foi puxar-lhe o capuz que o seu casaco tinha para cima dos seus cabelos e segurar-lhe a mão, puxando-o pela calçada. 

E quando percebeu que caminharíamos até ao lugar, ele disse: 

''Achei que agora que tivesse licença essas caminhadas acabariam.'' 

Ele parecia não gostar delas, mas era mentira e eu sabia. 

E quando paramos numa cafetaria a um quarteirão do cemitério, Jimin, do outro lado da mesa alta e sentado no banco almofadado disse-me:

''Porquê que estamos a adiar o inadiável?'' 

''Fico feliz que pense assim.'' Eu comentei então, a minha mão pousando em cima da sua, enquanto ele girava um canudo contra o copo de leite quente com chocolate. 

''Você me odeia?'' Então ele estreitou as sobrancelhas, e eu sacudi os ombros, brincalhão, e então Jimin suspirou, desapontado com aquilo e baixando o olhar para a bebida. 

''Nunca veio, pois não?'' Eu perguntei, cuidadoso, puxando a mão mais para mim. ''Nunca veio ver ela antes.'' 

Ele estava indignado, parecia, por eu fazer uma acusação daquelas, mas a resposta era tão óbvia que eu quase não precisei de perguntar. 

''Eu...'' Ele tentou então, recolhendo a mão para si, uma desculpa que usou para passar os dedos pelo nariz e desviar o olhar. ''Claro que já vim, eu te disse, é só que as flores-''

''Jimin.'' Eu interrompi e ele me olhou de uma vez, nervoso, a mão alcançando o botão na manga da camisa. no pulso. ''Você não gosta de flores.''

''Eu sei, mas ela gosta, ela gostava e eu-''

''Você quer colocar flores?'' 

''Não, eu-''

''Quer ou não?'' 

Eu sabia que interrompê-lo daquela forma o irritaria, mas também sabia que se o deixasse ali, tentando terminar frases, tentando acabar desculpas mal dadas, o resultado seria bem pior do que um Jimin irritado. 

Ele acenou, convencido de que fazer aquilo era o certo, como se fosse compensar, e ele sabia que não iria, mas também precisava de saber, e não sabia, que não havia nada para compensar. 

O tempo para mim era uma passada normal, mas Jimin fazia parecer que ele estava correndo, porque antes era como se adiássemos a chegada até ali, mas desde que deixáramos a cafetaria e fomos diretos até ali, Jimin começara a entender que era para valer, era para ser e como ele tinha dito: inadiável. 

''Escolha umas...'' Eu murmurei, logo na entrada do lugar, parando em frente da banquinha com inúmeras flores de inúmeras cores. 

''Eu... Eu não sei...'' Ele murmurou de volta, atrapalhado, tentando virar-se para mim, as mãos uma na outra, tentando entrar dentro das mangas da camisa. 

''Jimin, babe...'' Eu disse, engolindo em seco, sabendo que era difícil, segurando-lhe a lateral e esticando um braço do nosso lado, tocando as pétalas de uma das flores brancas ali. ''Estas são bonitas, não são?'' 

Mas ele negou e parecia apavorado, lágrimas surgindo no canto dos olhos, e o homem atrás das flores olhava-nos curioso, mas com pena quando Jimin se virou para mim e foi contra o meu peito, baixando a cabeça. 

''Não precisam de ser essas, ok?'' Eu disse rápido, abraçando os ombros dele, e ele acenou, a precisar de ar por se esconder tanto contra mim e por isso eu afastei-me, mas a mão trémula dele puxou-me mais uma vez. 

''Escolhe você.'' Ele mandou, a manga passando pelos olhos, limpando as lágrimas e abraçando a minha cintura. 

''Pode ser lilás?''  Eu quis certificar-me, trocando o branco neutro por algo muito menos caótico, e ele acenou com pressa, como se nem importasse, então eu olhei o vendedor e estiquei a minha mão, os cinco dedos em pé, indicando-lhe a quantidade em silêncio, pois sabia que ouvia a nossa conversa atento e não é como se o lugar fosse muito mexido. ''Está tudo bem...'' Eu assegurei, baixinho, segurando-lhe as bochechas com cuidado e carinho e ele acenou, fungando baixinho igualmente. 

Quando me afastei de Jimin para que pudesse pagar, foi quando pude perguntar ao vendedor se ele sabia como estava organizado o cemitério e rapidamente ele me soube dizer onde ir para encontrar a campa da avó de Jimin, o que era curioso mas eu não questionei. 

Parados em frente da campa, eu carregava nas mãos as cinco flores lilás e Jimin estava do meu lado, o olhar inquieto, a testar terreno, as mãos trémulas e o olhos, mais uma vez, aguados. 

E, infelizmente, era assim que tinha de ser, porque estava realmente na altura de parar de fingir que nada aconteceu, estava na altura de deixar todas as lágrimas saírem, estava na altura de ficar triste e tentar seguir em frente, não esquecer, só seguir em frente.

''Jimin...'' Eu chamei ao fim de um tempo, o olhar dele focado na pequena fotografia da avó ali embutida, o rosto jovem e sorridente, feliz, e foi então que eu segurei a mão de Jimin do meu lado, entrelaçando o meus dedos nos dele, porque eu podia, eu podia estar ali, podia fazer isso. ''Ela estaria muito orgulhosa de você por essa hora, já pensou?''

''O quê?'' Ele perguntou, desatento, sem desviar o olhar da fotografia. 

''Sua avó fez tanto por você, ela estaria orgulhosa de você agora, de você ter conseguido.''

''Conseguido o quê?'' Continuou a perguntar, inquieto, a sua mão na minha tremendo cada vez mais, as lágrimas descendo pela face e o pé começando a batucar no chão. 

''Seguir os seus sonhos.'' 

''Só segui um sonho e deu errado.'' 

''O quê?'' Eu murmurei, sem saber ou entender do que ele falava. ''Jimin, estou falando de dançar. Ela te ajudou e agora você conseguiu. É livre para dançar, não precisa mais se esconder.'' 

''Não.''

''Não o quê?'' 

''Não sou!'' Exclamou então, soltando a minha mão e caindo de repente, abaixado de cócoras em frente da campa, as palmas contra a testa e os cotovelos apoiados quase nos joelhos. ''Não fui... Não fui... Não fui capaz.'' 

Ele não fora e eu desejava poder ter sabido disso antes. 

Vol, tas. ]JIKOOK/KOOKMIN[Onde histórias criam vida. Descubra agora