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A voz do professor chateava-me. A sério, era irritante. Parecia que me furava o cérebro, provocando dores de cabeça horríveis. Matemática consegue mesmo ser uma seca, especialmente quando estamos a dar trigonometria.

- A vossa colega nunca mais chega e começo a perder a paciência. O delegado que vá à enfermaria ver como ela está, por favor. Se ela estiver a passear pelos corredores leva falta!

John, o delegado, levantou-se e saiu da sala, enquanto o professor continuava a dar as suas explicações chatas de matérias que já repetimos vezes sem conta. Aquele professor era assim: não saía da mesma matéria durante umas cinco aulas seguidas. Mas desenganem-se, ele não fazia exercícios. Apenas dizia a teoria toda e fazia com que a decorassemos, talvez porque achava que era assim que iríamos subir a média da turma para ficarmos num bom lugar, visto que éramos a pior turma da escola inteira, contando com todos os anos. E a escola não era pequena, por isso vejam o quão boa era a minha linda turma.

O professor continuava a explicar a matéria, super impaciente porque agora nem a rapariga, Karen, nem John voltavam. De repente, ouviu-se um barulho ensurdecedor quando o director da escola ligou os altifalantes da escola para falar para dentro de todo o recinto escolar.

- Alunos e professores, estamos com uma emergência. Por favor, não entrem em pânico. Atenção, isto não é um simulacro, está mesmo a acontecer um acidente. O pavilhão que contêm a enfermaria está de quarentena fechado e ninguém pode abandonar o recinto escolar. Repito, ninguém pode abandonar o recinto escolar!

Voltou a ser ouvido o barulho das interferências e a sala virou o caos total. O professor ficou branco como a cal e parecia que ia vomitar a qualquer momento, enquanto que os meus colegas entravam em paranóia e aos gritos. Pior que a escola estar em perigo e não ser um simulacro era não sabermos o que nos esperava lá fora.

Olhei em volta e vi a oportunidade de sair dali. Sempre fui uma rapariga certinha mas nunca fui de seguir as regras, algo contraditório não é? Aproveitei que toda a minha turma estava em pleno alvoroço e escapuli-me dali para fora. Percorri os corredores até chegar ao pavilhão da enfermaria. Percebi que não tinha sido a única a ter essa ideia, visto que já uma grande quantidade de alunos se tinha amontoado em frente das portas de vidro.

Estava a tentar pôr-me de bicos de pés para perceber o que se passava quando ouvi gritos e toda a gente se afastar com uma expressão de horror. Corriam para todos os lados, fazendo-me cair no chão quase sendo espezinhada por uma enorme quantidade de pés. Foi então que reparei nas portas de vidro. Escorria um líquido vermelho por elas. Sangue.

Olhei horrorizada para aquilo quando duas mãos se encostaram àqueles vidros, cheias de sangue. Por sorte os vidros eram daqueles duplos e foscos, que fazem com que seja difícil ver o que se passava lá dentro, pensava eu. Quando me consegui levantar ouvi uma espécie de murmúrio vinda de dentro do pavilhão. Espreitei e vi o terror à frente dos meus olhos, como se tivesse acabado de entrar num filme.

Karen encontrava-se encostada a uma parede, coberta de sangue. Ainda há pouco menos de meia hora tinha saído da sala de aula por estar com dores horríveis na barriga e sentir vontade de vomitar. Ficou com febre alta de um momento para o outro e, por isso, foi para a enfermaria. Agora, ali estava ela, com uma expressão completamente assustadora, a olhar para o nada. Quando os nossos olhares se fixaram um no outro, senti o meu sangue congelar-me nas veias. Os seus lábios curvaram-se num sorriso torto, assustador, e ela dirigiu-se para a porta como se estivesse a coxear, com a cabeça pendente para o lado esquerdo. Apenas recuei uns passos, sentia-me aterrorizada demais para sair dali. Só quando ouvi o som forte de algo a bater contra as portas e vi as suas mãos encostadas à porta outra vez percebi que tinha de fugir dali.

Comecei a correr com a maré de alunos que ainda se encontrava naquele corredor. Ao virarmos para outro, vi imensos alunos sentados no chão a gritar e chorar. Estava tudo um caos. Corri depressa para o meu professor de matemática.

- O que se passa afinal?

Ele não se encontrava em muito melhor estado que os outros alunos, parecendo que ia desabar a qualquer momento.

- Viu o que se passava lá dentro na enfermaria? Eu fui ver e, apesar de não saber o que raio se passa, não é nada bom. Não nos deixam sair da escola e os alunos estão a começar a chatear-se e a entrar em pânico. Já chamaram equipas especializadas em casos de gripes contagiosas e estranhas, e eles devem estar a caminho.

Um colega meu, que estava a nosso lado, olhou para o professor e para mim assustado.

- Se eles demorarem muito tempo nós vamos morrer aqui! Já viram o aspecto de quem está preso na enfermaria? O John parece que está possuído pelo desejo de morte e carne. Estão cobertos de sangue e a morderem-se uns aos outros. É horrível! - choramingou.

- Eu... Eu... Eu já volto, preciso de encontra o meu irmão.

- Acho que vi o teu irmão à tua procura no nosso pavilhão Zoey.

Assenti com a cabeça em sinal de agradecimento e voltei a correr o mais rápido que pude em direcção ao pavilhão onde tinha tido aulas.

- ASHTON!!!??? ONDE ESTÁS? - gritei em desespero.

Corri  o pavilhão todo e estava completamente vazio. Comecei a entrar em pânico. E se ele se tivesse sentido mal e tivesse ido parar à enfermaria? E se ele estivesse maluco como os outros que lá estão fechados?

Voltei assustada para o aglomerado de alunos, que se encontravam todos no pavilhão gimnodesportivo. Sentei-me no chão ao pé das minhas amigas, que tremia que nem varas verdes. Nisto ouço-o gritar.

- Z?! ONDE ESTÁS?

Levantei-me e olhei para as bancadas, onde o vi a percorrer o ginásio todo com os olhos à minha procura. Quando os seus encontraram os meus, esboçou um enorme sorriso de alívio e correu até mim. Abraçou-me com força, fazendo-me levantar os pés do chão.

- O que está a acontecer, mano? - choraminguei agarrada a ele. Ash era a única pessoa que eu permitia ver-me triste ou em mau estado.

- Não faço ideia, mas a partir de agora não sais de perto de mim. Seja o que for que isto é, vou proteger-te custe o que custar.

- Achas que são... zombies?

- Zombies? Eu ainda não os vi.

- Eu vi a Karen da minha turma... Ela estava cheia de sangue e com ar diabólico. Dizem até se estavam a morder uns aos outros! Isto é mau mano, muito mau.

Ashton olhou para mim com ar aterrorizado.

- Quando eu via The Walking Dead e dizia que gostaria que aquilo acontecesse, eu não estava a falar a sério! Agora que provavelmente está mesmo a acontecer, não sei de nada do que deva fazer.

- Isto não é uma série mano! Isto é a realidade! E nós precisamos de sair desta escola e é rápido! Não sei que vírus é este e como chegou a eles, mas que isto está mau, está.

- E se já estiver espalhado por aí Zo? E se for à escala Mundial?

Olhei para ele com os olhos arregalados. O que quer que isto fosse e com que dimensão fosse, eu só tinha a certeza de uma coisa. Não estava preparada para nada do que pudesse vir aí.

Long Way Home (parada)Onde histórias criam vida. Descubra agora