Maria de Lourdes
Era intervalo. Os alunos saíram feito loucos quando o sinal tocou. Parecia que tinham repulsa à sala de aula. Desciam correndo, se espremendo pelas escadas, numa competição ridícula para ver quem chegava primeiro ao pátio. O barulho dos pés batendo no chão lembrava o trote de quadrúpedes numa corrida. Alguns brincavam que era a manada particular da diretora do colégio.
Maria de Lourdes assistia aquela cena, todos os dias, sem nenhum interesse. Eram anos naquela escola e nada mudava. Nem tinha mais prazer em sair da sala de aula para ver as pessoas. Eram as mesmas. Por isso, sempre acaba ficando na sala, mexendo no celular ou lendo algum livro. Raras vezes, estudava física ou química, ou qualquer matéria que tivesse dificuldade. Aquele, porém, era um dia diferente. Ela queria ficar na sala por outro motivo, muito mais forte que falta de interesse nos colegas.
Lola passara a tarde do dia anterior toda pensando na mensagem que recebera de Felipe. Ficou sem saber o que responder. Ele avisava, completamente animado, que havia convencido, ou quase forçado, os pais a aceitarem o namoro falso dos dois. O que significava que eles dariam uma nova chance a ela.
Para ser sincera, Lola havia torcido para os pais de Felipe não quererem vê-la novamente nem pintada de ouro. Não apenas porque detestava a situação, mas também porque sentia que a mentira que contara sobre seu parentesco com os Monteiro iria trazer sérios problemas se aquela brincadeira continuasse.
Eles moravam em uma cidade pequena. Mais ou mais tarde alguém poderia comentar que Felipe namorava com uma parente dos Monteiro cuja existência era desconhecia e o estrago estaria feito. Fora o desejo ambicioso de Antônio, pai de Felipe, em fechar negócios com a rica família. Lola até poderia ajudar com isso, já que tinha uma boa relação com Luan, mas e aí? Antônio, com certeza absoluta, iria falar sobre a namoradinha de Felipe que era parente deles, para se gabar ou agradecer, e ela seria descoberta.
Fosse qual fosse a situação, Lola não conseguia ser otimista quanto ao desfecho daquela mentira. Continuava com aquela palhaçada apenas em consideração ao garoto. Não via a hora, portanto, de poder acabar com aquele relacionamento falso deles. Quanto mais tempo aquilo durasse, maiores as chances de alguém sair ferido ou machucado. E, por mais que acreditasse que com certeza ela ia acabar se dando mal, a pessoa que seria emocionalmente mais prejudicada seria Felipe, sem sombras de dúvidas. Ele era o elo fraco. O elo sentimental.
Era por causa dele que Lola tinha um motivo para ficar na sala aquele dia. Quanto mais pensava no tom animado da mensagem que ele havia lhe mandado, mais tinha certeza de que Felipe jamais poderia descobrir sobre seu envolvimento com Luan. Ela tinha que evitar a tragédia que aquele acontecimento traria, caso fosse tornado público.
Só não sabia como faria isso. Se ao menos ainda conversasse com Juno ou fosse egoísta o suficiente para ligar para Eric... Tudo seria mais fácil. Os dois, especialmente Eric, eram ótimos em conselhos. Mas ela havia se afastado Eric e não falava mais com Juno. Teria que descobrir sozinha como resolver aquilo.
Quando o sinal tocou, Lola continuou sentada. Fingiu que estava resolvendo exercícios de física, para não ter que falar com Felipe ou ouvir as perguntas de Juno sobre seu relacionamento com o garoto. Não queria ter mais estresse que o necessário naquele dia. Por isso, só levantou os olhos quando achou que todos já tivessem descido.
Ou quase todos.
Durante a aula de geografia, ela mandara um bilhete pedindo a Luan que permanecesse ali quando o intervalo chegasse. Tinham coisas a resolver.
— O que é tão importante assim que não pode esperar até a noite, meu sol e estrelas? — Perguntou Luan, quando se viu a sós com Lola.
O rapaz aproximou–se da colega de classe. A menina estava sentada na carteira, com o livro de física aberto. Ele afastou o material escolar e olhou para ela de maneira bem sugestiva, segurando o queixo de Lola.
Ela revirou os olhos e afastou a mão de Luan com um tapa.
— Isso é sério, Luan — disse.
— Eu não disse que não era — o menino respondeu, irritado. — Então, o que tá pegando, Lolita?
— Ninguém pode ficar sabendo sobre o que aconteceu ontem à noite.
Assim que Lola terminou de falar, Luan começou a rir. A garota cruzou os braços na frente do corpo e lançou ao amigo um olhar de raiva.
— Eu estou falando sério! — Ela quase gritou. — Se Felipe souber disso...
— Espera, espera, espera — Luan voltou a rir, com a mão aberta parada na frente do corpo. — Você está saindo com Felipe ou algo do tipo?
Ele estava pronto para tirar sarro da cara de Lola, quando ela abaixou o rosto. Não sabia se contava a verdade ou se mentia sobre o falso envolvimento dos dois. Preferiu evitar falar abertamente sobre o assunto.
— Sério? — Luan ironizou, depois começou a rir descontroladamente. — Não tinha mais ninguém disponível no mercado, Lolita? — Ele perguntou, quase sem ar de tanto rir. — Aquele cara, o tal de Eric, pelo que eu sei é caidinho por você, meu sol e estrelas.
— Ah, cala a boca! — Lola começou a bater em Luan.
— Tudo bem, tudo bem. — Luan levantou as mãos em sinal de rendição. — Eu prometo, pela minha honra, que seu namoradinho nunca vai saber de nada.
— Você não tem honra, Luan — Lola deu outro tapa no braço dele.
Luan voltou a rir e, aliviada, Lola o acompanhou. Falso ou não, aquele relacionamento era patético. Luan achava Felipe certinho demais para Lola, o que era verdade. Os dois não tinham nada a ver. Se o namoro fosse de verdade, ia ser a coisa mais estranha do século.
Eles continuaram rindo até que a porta da sala de aula abriu. Felipe entrou com tudo e apenas após alguns segundos viu Lola e Luan ali.
— Olá — ele disse, um pouco seco.
Maria de Lourdes se virou ao ouvir a voz de Felipe. Afastou-se imediatamente de Luan. Era como se Felipe pudesse descobrir o que os dois tiveram apenas por olhá-los. Ela se sentiu um pouco culpada, mesmo sem ter feito nada de errado.
— Tudo bem, não precisa fingir — ela falou para Felipe, com uma voz suave. — Eu já contei tudo pra Luan.
Felipe se espantou ao ouvir aquilo. Suas sobrancelhas arquearam e ele estacou, enquanto abria o zíper da mochila. Virou-se, muito lentamente, para a colega. Luan apenas tentava segurar a gargalhada e Lola olhava desafiadoramente para os dois rapazes.
— Sim — ela disse, sentindo a adrenalina percorrer seu corpo. — Eu contei pra Luan que estamos namorando. Não precisa mais fingir.
Luan franziu as sobrancelhas e as arqueou em seguida. Não podia acreditar no que ouvia. Felipe soltou o ar rapidamente, aliviado. Lola continuava com o mesmo olhar desafiador, desta vez dirigido apenas a Luan, que além de surpreso, estava confuso. Ele abriu a boca para pedir explicações assim que viu Felipe caminhar até Lola e lhe dar um beijo na bochecha. Luan sabia que Maria de Lourdes estava aprontando alguma e queria saber o que era.
A menina, por sua vez, segurava o coração na mão. Conhecia aquela cara de Luan, afinal mantinham uma relação quase similar à amizade. Se ele perguntasse qualquer coisa que fosse, tudo iria por água abaixo. Enquanto sentia Felipe lhe beijar o rosto, só conseguia cruzar os dedos e torcer para Luan não dizer nada que a comprometesse.
— Mas... — Luan começou a dizer e Lola fechou os olhos, esperando pelo pior.
Quando a porta da sala de aula se abriu, porém, revelou alguém que Lola nunca imaginou gostar tanto de ver. Lara — a menina que a odiava — acabara de subir e Luan fechou a boca. Por algum motivo desconhecido, ele sabia da rixa das duas e ficou quieto. O sinal tocou logo depois, obrigando todos eles a prestar atenção na aula. Mas Luan, ainda assim, lançava olhares curiosos para Lola. Era um aviso de que ele queria respostas.
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Ovelhas Negras
Teen FictionO garoto popular. A garota problema. O nerd. Três adolescentes com absolutamente nada em comum. Uma noite. Uma festa. Um problema. Foi o suficiente para unir os três. Juntos, eles percebem que tem mais em comum do que apenas famílias tradicionais e...