Fúria

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Não sei como descrever o que senti quando Heimdall revelou que Olivia estava em perigo. Só lembro de ter desfeito a ilusão que usei numa tentativa de camuflar meu interesse em saber como ela estava — me julguem, mas sempre uso a aparência de Thor para tentar enganar o sentinela —, e ordenei que ele abrisse a Bifröst imediatamente.

A expressão nem um pouco surpresa do guardião me fez ter certeza que Heimdall sabia o tempo todo que era eu ali, e não Thor.

Nem sei por que ainda tento ludibriá-lo a fim de não transparecer meu interesse por Olivia. A essa altura, cada mísera criatura dos Nove Reinos já deve saber que, contrariando minha própria natureza, me importo com ela mais do que deveria. Bem mais do que compreendo aliás.

Sendo assim, o cenário que encontro logo que piso no terraço do prédio midgardiano só aguça ainda mais a minha preocupação com ela. Mais do que isso, desperta a minha fúria.

Parasitas uniformizados por toda a parte, o emblema de um animal mitológico em seus trajes negros, armas que intimidariam qualquer mortal, mas não a mim, e um helicóptero a postos, cortando o ar noturno com suas hélices em constante e rápido movimento.

Logo entendo que a aeronave primitiva está aqui por um motivo: para levar Olivia sabe-se lá para que lugar, onde possivelmente irão machucá-la.

Quando finalmente a reconheço em meio à noite — sendo carregada contra a sua vontade por um midgardiano sem qualquer consideração à própria vida —, minha fúria se transforma em outra coisa: em um latente e irresistível instinto assassino. Em outras palavras, eu simplesmente preciso matar todos eles. E não hesitarei em fazê-lo.

Sem pestanejar, deixo o monstro sob minha pele emergir. E o Gigante de Gelo assume o controle do que acontece em seguida: uma verdadeira carnificina.

Não sei como isso foi possível, já que até hoje, meu lado jotun só veio à tona por causa da Caixa dos Invernos Antigos ou quando tive contato com outros de minha odiosa espécie. Mas algo está diferente esta noite. Outra coisa desencadeia o meu eu verdadeiro. E simplesmente permito que ele assuma o controle, sem me importar com explicações.

Poucos segundos depois, ainda resta um. O verme que teve a audácia de largar Olivia no chão quando viu o que eu havia feito aos seus companheiros. Possivelmente, prevendo que terá o mesmo destino que eles.

Neste momento, uma parte de mim só quer se concentrar em Olivia. Mas minha fúria assassina ansia por esganar o parasita, a criatura insignificante que teve a péssima ideia de importuná-la. E para azar dele, só consigo ouvir esta parte do meu ser.

Seguindo esse instinto, minhas mãos se fecham como garras no pescoço do mortal à medida que o ergo do chão. Concentro-me em fazer com ele o que já fiz aos outros. Deixo o gelo fluir e começo a congelar o infeliz. Lenta e dolorosamente, vendo-o resistir bravamente a qualquer demonstração de medo ou incômodo. Um pobre diabo orgulhoso, afinal.

Quando tudo caminha para o desfecho mortífero que me trará um pouco de alento, ouço o estrondo inconfundível de uma sequência de trovões bem em cima do terraço e clarões iluminam o lugar. Não demora muito para que um baque surdo estremeça o chão. E logo a voz igualmente trovejante de um inconveniente Thor ecoa atrás de mim:

— Loki, não! Pare!

Ignoro-o. Simplesmente. E me concentro ainda mais em terminar o que comecei. Falta tão pouco.

Para minha infelicidade, Thor resolve insistir. Sinto quando ele se aproxima, toca meu ombro — na verdade tenta me afastar do mortal com um gesto brusco — e argumenta:

— A S.H.I.E.L.D. precisa dele vivo!

Estreito o olhar na direção do midgardiano diante de mim, deixo o gelo se expandir mais em sua direção, fazendo uma fina camada se espalhar por seu corpo e se tornar mais espessa a cada instante. Comprometo sua respiração ao esganá-lo com mais afinco, e esclareço retoricamente:

Trapaças do CoraçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora