Acerto de contas

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Fazia tempo que a luz do lampião de Dipper tinha apagado. Era muito difícil distinguir alguma coisa naquele breu, mas, mesmo assim, ele encarava o quadro de navio pirata na parede do quarto e o brilho das estrelas que o vidro do lampião refletia. Virava de um lado para o outro, inquieto. Por algum motivo não estava conseguindo pegar no sono hoje. O que nem fazia sentido, pois tinha gastado muita energia durante o dia andando pra lá e pra cá, entregando folhetos e casualmente atacando um velho suspeito. Queria ser como Mabel, que simplesmente caía na cama e dormia. Naquele momento, ela já devia estar dormindo faz horas.

Mais um tempo se passou com Dipper de olhos fechados, tentando apagar a mente de qualquer pensamento. Quando estava quase conseguindo, acordou abruptamente ao se chocar contra a própria cama. Sentou-se e olhou de um lado para o outro, alarmado. Um porta-retrato que ficava no criado-mudo estava, agora, caído no chão. O cobertor de Mabel estava todo desarrumado sobre ela e os objetos em geral pareciam ter mudado de lugar.

Tudo isso era bizarro, mas estes pareciam os efeitos de algo que já tinha acontecido antes: Anomalias gravitacionais.

Dipper precisava certificar-se. Com muito cuidado, levantou o cobertor e desceu os pés ao chão. Depois de colocar suas pantufas, seguiu lentamente para a porta e abriu uma fresta para espiar o corredor.




"Vamos, máquina idiota, funcione!", Bill pensava enquanto ajustava a frequência do metavortex transuniversal, "Eu não roubei lixo tóxico nem viajei a crateras de naves extraterrestres pra isso!".

Ele testou a alavanca pela milésima vez, e um rastro de eletricidade percorreu a fiação até a estrutura de formato triangular. O portal falhou um pouco antes de se estabilizar, iluminando-se com uma forte luz azul-claro. Bill abriu um sorriso cedo demais. Seu corpo começou a ficar mais leve e a descolar do chão.

— Hã? Não, não, não, NÃO!

Anomalias gravitacionais eram tudo o que Bill não precisava no momento. Devia ter algum problema com o emissor de ondas antigravitacionais.

Desesperado, ele tentou agarrar a alavanca, mas já tinha sido levado para longe. Por sorte, o circuito deu algum problema e o portal desligou. O demônio e os objetos ao seu redor se estatelaram no chão com a volta da gravidade.

Bill teve vontade de dar um murro na sua invenção. Ao invés disso, saiu esbravejando pelo laboratório, frustrado. Suas pernas ainda doíam de tanto andar por aí espalhando folhetos para encontrar sua "família". Tudo inútil. Já fazia um tempo que Bill tinha aprendido que dor só era hilária quando estava no corpo dos outros. Agora só conseguia sentir raiva, muita raiva. A dor era uma pedra no sapato desgraçada que estava sempre lá, o impedindo de atingir todo o seu potencial, junto com aquele corpo maldito. Queria se jogar na parede, esmurrar-se, quebrar alguns ossos, mas não podia se dar a esse luxo. Ele tinha um objetivo maior a ser atingido. Um dia, prometeu, um dia ele ia fazer a família Pines pagar por tudo o que fizera com ele. Osso por osso.

Dentre todas as coisas das quais Bill sentia falta, seus poderes eram a maior delas. Claro que ele gostava de ter o poder de possuir os humanos ou transformá-los em tapetes em um piscar de olhos, mas ainda mais do que isso, ele sentia falta dos poderes mais simples como flutuar, aparecer e desaparecer quando quisesse e mudar de forma. Ele rosnou. Aquela forma humana era patética. Se pudessem vê-lo agora, os monstros de sua dimensão com certeza fariam piada até não poder mais. Onde já se viu, o ser mais poderoso do campo da mente estar preso em um corpo humano e dependendo de seus piores inimigos para se manter vivo?

Bill respirou fundo e recuperou a postura, esfregando os olhos com uma mão e tentando clarear a mente. Por algum motivo, andava extremamente irritado e não conseguia se concentrar. Ainda havia uma fiação inteira para verificar, tinha que ajustar os níveis de neônio e criptônio, regular o calibrador de partículas e as ondas antigravidade. Não tinha tempo a perder. Além disso, segundo suas contas, restavam cerca de cinco horas para o amanhecer e ele teria de abandonar tudo pela metade. Quanto mais demorasse, mais havia o perigo de alguém entrar no laboratório e descobrir sobre seus experimentos.

Ele é WillOnde histórias criam vida. Descubra agora