Capítulo 10

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Acordada por alguns ruídos irreconhecíveis, Ji-Yun abriu os olhos e viu um teto amarelado, de onde algumas lâmpadas pendiam apagadas, e por algum tempo pareceu não saber onde estava. Piscou repetidamente até recuperar o foco da visão, até que por fim reconheceu a loja de brinquedos e seu ambiente suave e tranquilizante. Permaneceu parada por alguns segundos, os braços dobrados por trás da cabeça como apoio, até que tornou a ouvir os mesmos sons que a despertaram de seu cochilo. Ainda imóvel, reconheceu tais sons como passos, depois como uma porta se abrindo, e foi só assim que levantou-se em um só impulso.

Ao olhar ao redor, percebeu que Tonya não se encontrava em parte alguma da loja. Tentou imaginar para onde poderia ter ido, mas foi apenas ao virar-se para o balcão que avistou um pequeno pedaço de papel largado sobre o tampo de madeira, no qual apenas o seu sobrenome estava escrito em letras grossas e borradas por uma forte tinta azul. Longe de entender o que acontecia, aproximou-se do balcão e apanhou o papel, percebendo então que era um breve bilhete. "Sinto muito, Kwon. Precisei ir embora sem você. Boa sorte", ela leu em voz alta, tornando-se repentinamente afogada pela decepção.

O bilhete foi amassado e logo depois atirado a um canto qualquer da loja, e com as duas mãos na cabeça, Ji-Yun aproximou-se da porta de vidro e observou a rua. Estava completamente tomada por espíritos de trevas, uma multidão disforme e que escurecia ainda mais o ambiente já sem luz daquele universo. Enquanto os observava, assim, Ji-Yun foi acometida por uma importante lembrança: tinha plena certeza de jamais ter informado seu sobrenome a Tonya, o que tornava impossível a veracidade daquele estranho bilhete. Seu raciocínio, entretanto, foi novamente quebrado por novos ruídos, desta vez muito próximos, vindos de algum lugar dos fundos da loja. Ela não estava só.

—Quem está aí? – disse, estendendo o braço para apanhar sua pistola, mas só assim percebendo que ela não se encontrava no coldre. – Mas que diabos! Tonya, é você? Que tipo de brincadeira é essa?

Mantendo alguns segundos de silêncio sepulcral, Ji-Yun avançou alguns passos para o meio da loja, já avistando uma porta que dava para o estoque, percebendo que era de lá que os ruídos se propagavam. Reunindo coragem, continuou caminhando pé ante pé até estar diante da porta, que era muito larga e pintada por um verde cor de bile. A mão direita, suando frio, foi movida até a maçaneta, mas sequer chegou a tocá-la. Um estrondo, como se a porta houvesse sido arrombada de dentro para fora, fez Ji-Yun cambalear para trás, e pela abertura que surgira diante dela, um vulto rápido e volumoso surgiu. Saltou sobre ela como um predador sobre a presa, derrubando-a no chão da loja sem qualquer chance de se defender.

Desorientada, olhou com mais atenção depois da queda, e com horror percebeu que não havia sido atacada por um espírito vagante, ou pelo monstro assassino que vira do lado de fora. Havia sido atingida por um ser humano. Era Serj, seu parceiro traidor, quem estava acima dela, prendendo seus braços contra o chão.

—Eu falei que não adiantaria fugir, Kwon! – ele gritou, descontrolado e feroz.

—Serj! – a moça exclamou ao enxergar o rosto dele, vermelho e também suado. – Saia de cima de mim, seu maldito!

—Sair de cima de você? Não, Kwon. Não! Dessa vez você não vai escapar de jeito nenhum!

Com a velocidade de um assassino profissional, Serj libertou um dos braços da agente e retirou sua faca da bainha na cintura; sem demonstrar qualquer piedade, assim, mergulhou a arma branca na direção de Ji-Yun, atingindo seu pescoço em um corte horizontal que abriu-lhe a garganta e fez espirrar sangue pelo chão.

—Eu te disse. Eu te disse!

Serj continuava a gritar com os nervos em fúria, as veias na testa vibrando e conferindo a ele uma aparência psicótica, quase animalesca. Ji-Yun, por sua vez, agonizava e cuspia bolos de sangue, tentanto respirar, mas ingerindo apenas o líquido quente que vazava de sua jugular. Enquanto morria, porém, escutava uma voz chamando seu nome à distância, mas sabia que não era Serj quem chamava. Era uma voz conhecida, mas que ela não conseguia identificar completamente. Seus sentidos logo foram se apagando, e quando um último jorro de sangue escapou do ferimento aberto, ela fechou os olhos lentamente, apenas para tornar a abri-los um segundo depois.

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