O fino bastão de incenso já queimava pela metade, liberando um fio de fumaça dançante que preenchia o ambiente com um aroma suave de sândalo. Era uma sala pequena, quadrada e mal iluminada, e por toda a extensão das paredes pendiam quadros posicionados aos pares, exibindo imagens incompreensíveis pintadas em tons desajeitados por um artista de uma feirinha qualquer. Havia uma única saída da sala: uma porta estreita, que abria para fora, protegida por uma cortina escandalosa feita de milhares de contas coloridas. Não existia qualquer janela ou abertura que possibilitasse a entrada ou saída de ar fresco naquele local, o que tornava a respiração apertada e impregnada pelo forte cheiro do incenso.
No centro da sala havia uma mesa redonda. Não havia nada sobre ela além de uma única vela branca e espessa, com uma pequenina chama acesa que bruxuleava levemente e em ritmo decorado. Duas pessoas estavam sentadas em frente a ela. De um lado, uma mulher bronzeada, pele jovem, cabelos cacheados e olhar incompreensível. Do outro, um homem em seus vinte e quatro anos, de cabelos curtos e lisos, vestindo um tipo estranho de paletó – roxo e abainhado por uma linha grossa e dourada – que parecia ter sido feito para alguém com duas vezes o seu tamanho.
O jovem estava de olhos fechados, mantendo as mãos juntas e imóveis sobre a pequena mesa. A mulher à sua frente apenas aguardava com ar ansioso, respeitando o absoluto silêncio, que ocasionalmente era quebrado por uma leve fungada de narinas fragilizadas pelo irritante aroma que impregnava o ambiente. Ela esfregava as duas mãos de unhas bem pintadas, e minuto após minuto acariciava os dois "J" que preenchiam seu pulso, lado a lado, em uma tatuagem de letras finas e de aparência clássica. Depois de mais alguns instantes de silêncio angustiante, o homem abriu os olhos – um azul e outro castanho – e fixou-os na mulher à sua frente.
—Ele já está aqui, Jane. Está de pé bem ao seu lado.
A mulher arregalou os olhos e espiou por cima dos ombros, exibindo uma expressão alegre e ao mesmo tempo incrédula. O homem ergueu a mão direita e apontou com o indicador para o ombro esquerdo de Jane.
—Está bem aí, com uma das mãos em seu ombro.
—Vo-você pode vê-lo? Po-poderia me descrever sua aparência?
Completamente habituado àquele tipo de questionamento, e para mostrar que não era apenas mais um dos enganadores que ganhavam a vida se aproveitando de falsas mensagens do além, o homem de paletó vinho novamente ergueu a mão direita e com ela cobriu o olho castanho, o que ficava também do lado direito de seu rosto. O olho azul, muito claro e vivo como o céu depois de uma tempestade, focou-se em um ponto específico da sala. Após piscar três ou quatro vezes, a pupila dilatou-se levemente e passou a receber a imagem de uma forma humana, antes gasosa e indefinida, mas que aos poucos parecia solidificar-se em forma tangível. Ao fim da transformação, na sala surgiu um homem alto, moreno e de aparência robusta. Os dois apenas encararam-se por instantes que pareceram durar uma eternidade.
—Ele tem um cavanhaque, pouco cabelo, e está usando um macacão de operário. Um macacão azul. Tem uma cicatriz bem grande em uma das bochechas também.
A mulher levou as duas mãos até a boca, e muito surpresa permitiu que uma lágrima escorresse em cada lado do rosto.
—Meu Deus, é mesmo ele, é mesmo o meu Juan. Eu posso... posso falar com ele?
—Ele está ouvindo sua voz. Pode falar.
Jane endireitou os cabelos volumosos e secou as maçãs do rosto com as palmas das mãos. Aprumou-se na cadeira, inalou o aroma do incenso, engoliu a seco e, após um breve ensaio mental, pôs-se a falar.
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EQUILIBRIUM
ParanormalAo cair em uma emboscada durante uma ação de flagrante contra um grupo de traficantes, a agente federal Ji-Yun Kwon é sugada por um fenômeno paranormal, uma espécie de falha entre mundos que a transporta para uma versão desbotada e distorcida da cid...