#02 - Um momento peculiar

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     - Se apresse, Joana - disse Sophie fazendo um gesto para eu andar mais rápido - hoje o dia será agitado!
      A acompanhei em seguida e entramos na carruagem parada em frente à casa. Elizabeth estava sentada com cara de poucos amigos. Nos cumprimentamos com um bom dia insosso e encarei a janela enquanto saíamos da propriedade. O vilarejo não era muito longe dalí, logo estacionamos em frente à loja de Madonna Giordana. Uma velha viúva italiana que havia casado com um inglês local, mas que desde que o marido falecera, não admitia que a chamássemos pelo sobrenome do mesmo. Ela sempre tinha os melhores vestidos e acessórios, criados à última moda de Milão, mesmo que a moda em Paris fosse a mais utilizada em Londres. Madonna Giordanna tinha requinte e estava sempre muito elegante e alegre, adorava Sophie e a tratava como se fosse sua filha mais nova. Era uma mulher muito bonita, com aparência jovial para a sua idade
      - Bon giorno! - disse, enquanto corria para nos receber. Eu não sabia se a sua hospitalidade se dava ao fato de gostar de Sophie ou ao fato de que minha família fazia parte de sua clientela mais ilustre.
      Sophie abriu um enorme sorriso e abraçou a amiga enquanto eu ficava parada à um canto, aguardando minha irmã providenciar suas fitas. Elizabeth mal descera da carruagem e logo se encontrara com suas amigas, Henrieta e Maria Thompson. Ambas me olharam de soslaio e arrebitaram seus narizes, enquanto eu fazia o mesmo e entraram juntas no local. Eu permaneci à porta, apenas dando uma espiadela na loja. Observei muitas garotas aparentemente ansiosas com o baile desta noite, provando sapatos e escolhendo lenços. As pessoas passavam por mim na calçada, mas mal pareciam me notar. Aquelas que se apercebiam de minha existência, reviravam os olhos e viravam os rostos, enquanto eu permanecia com a cabeça mais elevada possível, apreciando minha sensação de superioridade diante de todos ali.
      Então, tudo aconteceu tão rápido que eu nem percebi o que havia feito até notar que estava montada em um cavalo, correndo em direção ao bosque. Enquanto o cavalo corria, comecei a dar por mim sobre o que tinha acontecido. Uma jovem garota passou correndo e gritando, montada em um cavalo desgovernado que a levava para o bosque. Logo atrás, um rapaz em um outro cavalo, perseguia ambos, mas parecia um tanto desengonçado. Não pensei duas vezes, pois mesmo com aquele vestido, eu sabia que cavalgava bem o suficiente para alcançar a garota antes dele. Montei no primeiro cavalo que encontrei por perto, ignorando os gritos e palavrões de seu dono que estava logo ao lado do animal e rumei para o bosque. Não demorou muito para que eu ultrapassasse o rapaz e seguisse em direção aos gritos da garota, que parecia apavorada.   
     "Se ao menos eu tivesse Odin comigo", resmunguei em pensamento quando percebi que o cavalo se mostrava cansado daquela correria. Mas ele também não me decepcionou e se manteve forte no caminho, me possibilitando alcançar a jovem. Ela estava pálida de medo e seus olhos azuis refletiam o horror que estava sentindo. Estendi a mão esquerda para que ela segurasse e, assim que ela percebeu que eu estava ao seu lado, o cavalo que a conduzia reduziu o ritmo de sua correria, como se estivesse atordoado com aquela situação. Quando alcancei a sua mão, percebi que o rapaz emparelhara do outro lado e que ele, agilmente, conseguiu agarrar-se ao cavalo da jovem e saltar de seu próprio cavalo, sentando-se na sela atrás da garota. Feito isso, ele conseguiu frear o animal e a abraçou fortemente.
      Olhou para mim e percebi que havia gratidão em seus olhos. Eram olhos expressivos, por um instante não consegui me desviar deles, mas acabei por correr para contornar o bosque e retornar à loja de Madonna Giordana. Ao chegar no vilarejo, tudo estava tumultuado. O homem ainda berrava, afirmando que eu havia roubado o seu cavalo, Sophie, Elizabeth e Madonna Giordana estavam na calçada junto aos demais, pois todos haviam visto a garota que passara em um cavalo desgovernado. Parei o cavalo junto ao seu dono e apeei, entregando-lhe uma quantia em dinheiro para que perdoasse o roubo de seu animal. O homem me olhou com desdém, mas aceitou o dinheiro e imediatamente, parou de proferir palavras sujas contra mim.
     Sophie se mostrava perocupada com a situação, porém, ao erguer os olhos, observamos o rapaz e a jovem virem caminhando, acompanhados pelos dois cavalos adentrando o vilarejo. Ela estava, aparentemente bem, e ele segurava seu braço para ajudá-la a equilibrar o corpo. Uma expressão séria em seu rosto, como se estivesse seriamente preocupado com ela.
      -Você a salvou! - Sophie sussurrou em meu ouvido e abraçou meu corpo, me puxando mais para perto de si.
      -Vamos embora. - falei enquanto me virava para trás e entrava na carruagem.
      - Joana, ainda não consegui escolher as minhas fitas. - Sophie me seguiu. - Mas sei que você deve estar cansada, depois de toda esta correria. Vá para casa e a carruagem voltará para me buscar em seguida!
      Assenti sem dizer uma palavra. Sophie estava corada, seus cabelo castanho-claros cintilavam ao sol e seus cachos pendiam pelos lados do chapéu. Aparentemente, tinha ficado curiosa para saber quem era aquele casal tão estranho que havia chegado ao vilarejo. Minha irmã mais nova era a curiosidade em pessoa!

Tarde demaisOnde histórias criam vida. Descubra agora