19. LDN

224 8 1
                                    



BEBE

O maior período de tempo em que estive na Inglaterra foi durante os meses da minha reabilitação.

Depois de seis meses entre rodas de conversa com outros adolescentes usuários de drogas e finais de semana na casa de meus avós paternos: que constantemente me lançavam aqueles olhares de decepção (provavelmente pensando que a fascinação por entorpecentes deveria ser algo do nosso sangue, visto o modo como meu pai morreu); minha mãe se convenceu de que eu estava "bem" e me tirou daquele buraco no meio de Conway.

Disseram para ela que eu tenho "tendências suicidas".

A verdade é que eu não estava tentando me matar quando tomei aqueles soníferos, eu só tinha uma dor de cabeça horrível naquela noite. Repeti isso milhões de vezes, mas Nancy dizia que eu estava mentindo, então passei a me prender a história de que eu tinha mesmo um problema; e eu sabia que tinha, mas a ideia de que tudo era apenas uma dor de cabeça me parecia mais atraente.

A ideia de que era uma ligação de sangue também me parecia boa. Uma herança de meu pai, como se nós dois tivéssemos que ser dois fudidos na vida, unidos.

E não teria como estar na Inglaterra sem pensar nele. A casa dos meus avós era praticamente um santuário dedicado à sua memória, e vez ou outra meu avô até mesmo me chamava de "John", algo que eu relevava. Os dois odiavam a minha mãe. Trocavam uma ou duas palavras, mas era só ela sair de cena que eles sentiam-se livres para falar o que quisesse, como se ela tivesse alguma culpa pela morte de seu filho.

Nancy já não falava nada sobre aquele dia, muito menos tio Rob e Jimmy, já que os dois estavam com ele quando tudo aconteceu. O olhar deles só de falar sobre isso... Tem uma coisa que praticamente ninguém vai te dizer antes de você se drogar pela primeira vez: a destruição que isso vai fazer em todos os que você ama. Por isso entendi minha mãe quando ela quis se mudar com John e Peter para a Inglaterra, ela queria tirá-lo de toda a destruição deixada por meu pai. Não diria que foi meu irmão que me incentivou a ficar mais longe das drogas, mas foi uma grande parte.

Caminhei pelas ruas da cidade por horas, tentando me reacostumar com o sotaque marcante, os caras de cabelo castanho que poderiam partir seu coração, as garotas com os mais diversos tipos de casacos, o trânsito frenético...

Andei até parar no Queen's Head, um pub que ficava na King's Cross, que aliás tinha sido o fatídico bar em que encontrei Alex Turner numa noite qualquer de sexta-feira. Ainda era do jeito que eu lembrava: as inúmeras garrafas de cerveja enfileiradas nas prateleiras, Niel Young tocando no fundo, um pequeno palco perto do fim do salão...

Aquilo era nostálgico demais pra mim.

Me sento em um dos bancos do bar, apoiando os braços no balcão. Com o barulho, um cara aparentemente da minha idade, usando camisa de flanela e cachos escuros se vira em minha direção. Pensei que fosse perguntar o que eu queria, mas ele divagou com um dedo no ar como se estivesse se lembrando de algo.

- Você é Bebe Bonham! - diz ele, sorrindo, aquele sorriso típico dos ingleses corteses.

Sorrio de lado, balançando a cabeça em afirmativo.

- É, é você. Costumava vir todas as sextas-feiras com aquele cara, o... - diz ele, parecendo tentar se lembrar de mais alguma coisa - Alex Turner!

ALMOST FAMOUS  // jake kiszkaOnde histórias criam vida. Descubra agora