Capítulo 11

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Os dias foram passando e logo surgiu uma espécie de rotina nem um pouco comum. No começo Daph apenas me enchia de doces que a tia armazenava na cozinha enquanto ela escutava cada detalhe sórdido da minha vida e logo eu escutei da dela.

Era uma vida tão mais incrível que a minha, com herdeiros de cortes, príncipes de reinos distantes e ainda, ela tinha tido apenas uma queda por um illyriano, havia algo de hipnotizante neles, ela falou. Eu contei sobre minhas quedas por ídolos coreanos, por personagens fictícios e minha total paixonite platônica pelo amigo de infância, ela riu de algumas situações constrangedoras pelas que passei e ela me contou da vez em que derrubou o vinho de um rei distante bem em cima dele depois de correr do filho do dito cujo que tinha tentado roubar um beijo dela, eu falei que era bem mais interessante que chegar atrasada na aula errada ou cair na frente de uma escola inteira por ter tropeçado nos próprios pés.

Quando já sabíamos tudo uma sobre a outra começamos a nos juntar a Rayvis na biblioteca e depois eu os observava nos treinos e logo fui convidada a aprender também, dois anos imitando coreografias de kpop tinham me rendido um pouco de músculos e apesar do sedentarismo recente, ainda fui capaz de acompanhar o ritmo, apesar de não aprender com a mesma fluidez, eram muitos movimentos e demandava um reflexo que nunca tive. Por isso tinha largado os esportes mais... agressivos, muitos hematomas depois era melhor parar antes de uma fratura.

Cassian era o professor, em alguns dias, Az observava mais silenciosamente enquanto os dois lutavam. Os corrigia e depois me dava uma atenção especial, acho que ele mais ensinava para saber o quanto eu sabia, depois de uma semana ele já tinha se tornado um professor e não um avaliador. A forma como ele ensinava era mais simples e fácil de entender que a de Cassian, apesar de não acompanhar em nada, já com o cara dos sifoes vermelhos eu não entendia o que ele falava, mas imitava os movimentos e dava tudo certo.

Na terceira semana eles já me colocaram para lutar contra meus colegas, Daph era uma professora ao mesmo tempo que uma oponente, eu ainda estava me acostumando com o corpo, ao mesmo tempo que era eu, parecia ser emprestado, como se estivesse aprendendo a usar um novo console de jogo. Ocorreram vezes de tropeçar nos pés, ou bater em mim mesma. Alguns dias eu acordava e olhava no espelho, estranhava até mesmo o rosto, mesmo que essencialmente permanecesse o mesmo. Rayvis não tinha nenhum controle, ele sempre acabava acima de mim, sobre mim e uma vez do meu lado, quando agarrei a camisa dele e o trouxe pro chão comigo. Ele não ficou muito feliz nesse dia.

Em duas semanas o herdeiro da Corte já havia me aceitado melhor e apesar de não ter uma maldição que o forçara a me aturar, uma Daphmis e uma Feyre o tinham controlado bem até que ele mesmo começou a me tratar pelo nome. Não tinha como me esquecer de quando ele passou a me dar dicas nos movimentos, depois ele ria das minhas piadas sem graça e finalmente, naquela manhã ele tinha estendido a mão para me ajudar a levantar pela primeira vez.

No jantar eu não conseguia deixar de encarar ele, mesmo que aquela sopa mágica estivesse deliciosa, e devo destacar que meu ódio por sopas não era pequeno, a noção de como ele tinha passado, aos poucos, a me tratar bem tinha caído em um baque.

- Vai ficar olhando por quanto tempo?

Daph olhou para ele curioso e antes que ela soubesse que ele estava falando comigo foquei na sopa.
Quando todos tínhamos terminado e antes de nos retirarmos Daph chamou atenção.

- Não vão pros quartos agora.

- Por que?

Perguntei e ela abriu um sorriso.

- Vamos observar as estrelas.

Rayvis bufou.

- Não fazemos isso desde que eramos crianças.

- Exato, já faz muito tempo.

- Não. Já somos grandes para isso.

Eles começaram a discutir. Já tinha me acostumado com aquelas pequenas discussões, eles debatam sobre quase tudo, não sabia se era por terem tempo demais para viver, mas sempre gastavam inúmeros minutos naquilo.

- Eu vou com você.

Interrompi para tentar acabar com aquilo logo. Daph ficou radiante, Rayvis virou as costas e começou a andar na direção do corredor.

- Onde pensa que vai?

Ela colocou as mãos nos quadris e correspondeu por cima do ombro.

- Dormir.

- Você vem também.

- Quem vai ser o grão senhor aqui mesmo?

Ela foi até ele e o segurou pela camisa o arrastando ainda de costas.

- Exato. Você ainda não é nada.

Ele tentou se livrar dela mas não conseguiu e eu só pude rir enquanto os seguia até o terraço, lá não estaria apenas nós três, como eu tinha esperado, mas quase todos da Corte estavam em algum canto, banco ou sentados sobre um tapete recentemente colocado com muitas almofadas à disposição, eles sorriram ao ver Daphmis arrastar Rayvis até o único tapete livre e o jogar nas almofadas.

- Só garanta que ele esteja inteiro nos próximos séculos, Daph.

Feyre advertiu com um sorriso na boca.

- Pode deixar, tia!

Daph indicou o tapete e me sentei, logo caí nos travesseiros depois de ter sido derrubada por minha amiga. A maciez amorteceu a queda e me juntei a ela em uma gargalhada até perceber que tinha caído em cima do braço de Rayvis, ele me fuzilou e cortei o riso para me ajeitar depressa. Assim que deitei direito e olhei para os céus me senti dentro de uma constelação, os pontos brilhantes eram numerosos, as constelações totalmente novas e as cores... aquelas estrelas brilhavam com mais cores além de branco, azul e vermelho. Eram lindas. Suspirei diante delas. Logo eu ergui minha mão para tentar encontrar alguma linha familiar, mas não tinha como.

- O que está fazendo?

Olhei para Rayvis, ele estava bem do meu lado e nossos ombros quase se tocavam, o olhar dele era hipnotizante, a cor, um feitiço.

- Tentando encontrar constelações.

Quem sabe não achava a galhada do cervo do Norte e então uma grande teoria se concretizaria.

- Acha que vai encontrar uma de seu mundo?

- Talvez...

Nossas respirações se mesclavam formando apenas uma nuvem. Daph se aproximou mais de mim.

- Está frio, talvez devêssemos ter ido dormir mesmo.

Rayvis se apoiou sobre um braço para olhar Daph do meu lado.

- Você literalmente me arrastou até aqui, agora ature.

- É algum evento especial?

Perguntei tentando evitar outra discussão e realmente tirando uma dúvida.

- Ver o sol nascer ou coisa do tipo?

- Na verdade nem tanto. Essa é apenas uma noite qualquer em que começamos a ver as estrelas em cada ano.

Imaginei Feyre e Rhysand fazendo aquilo todos os anos por séculos ao ponto de se tornar uma tradição entre todos eles.

- Isso é muito bonito da parte de vocês.

Meu comentário foi baixo e não tive resposta nenhuma. As horas foram se passando, alguns se retiraram, outros, como Mor acabaram dormindo ali mesmo, Az a cobriu antes de sair, tentei não ceder ao sono, mas não tinha como me mover com Daph dormindo sobre minha barriga e acabei entrando na terra encantada dos sonhos bizarros.

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