Capítulo 18

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   Voamos para o sul, fazendo um caminho bem sinuoso e com muitos desvios para ter certeza que meu pai não me seguiria. Levamos pelo menos duas semanas, tomando cuidado e voando só a noite, para evitar que algum navio nos avistasse. Não era comum ter dragões por essa região, então eu precisava ao máximo ter cautela.

Chegada a madrugada, deixei Ashen em uma ilha pequena e deserta, seguindo com Jasper. Ela ainda não era capaz de me levar em suas costas devido ao seu tamanho, mas me suportava. Suas garras prendiam meus ombros e minhas pernas, era quase como se eu mesma tivesse asas.

Com cuidado ela se aproximou do porto e me soltou, eu rapidamente me escondi em alguns lotes espalhados pelo cais e esperei que a cidade ganhasse vida perto do amanhecer. O vai e vem de marinheiros e pescadores logo criou a oportunidade que eu precisava. O porto de Belfim, a grande cidade do sul, parecia cinco, seis vezes maior que os de Darath juntos.

Todos os dezoito atracadouros possuíam vários navios sendo descarregados por escravos, caracterizados por suas roupas brancas, ou claras. Marinheiros retornavam aos seus afazeres, visivelmente embriagados ainda da noite de festas que se submeteram assim que desceram em terra, o que lhes rendia a carranca e gritos de seus capitães, alguns ainda os atiravam a água para que despertassem.

O som só neste pequeno pedaço que havia percorrido, era o suficiente para que eu pensasse sair de lá surda, a profusão de línguas chegava a me deixar tonta, mesmo ainda estando a beira mar, mal sentia o seu cheiro ou ouvia o barulho das ondas.

Fui jogada para fora do caminho por um brutamontes, ele estava sem camisa, sua barriga daria inveja a qualquer mulher grávida, a pele morena escurecida ainda mais pelo sol, a cabeça com uma penugem que não deveria se chamar de cabelo, e sua boca com apenas alguns dentes, escuros e precariamente suportados pela carne da gengiva.

Me mantive no chão, me arrastando para mais longe. A pouca luminosidade da manhã me ajudava a esconder o rosto, coberto pelo capuz e mascara, minhas roupas grossas escondiam minha silhueta feminina, provavelmente me salvando no meio daqueles selvagens, assim como Draetia em minha cintura.

Atrás do homem, um comboio seguia para um dos últimos navios ancorados naquele cais. O maior de todos, com três mastros de velas gigantes azuis e vermelhas. Escravos cansados e oprimidos pelos chicotes, traziam grandes canhões de bronze, assim como a carga para dispará-los.

Saí rapidamente de lá, ficar perto desses homens uma hora ou outra poderia significar confusão. Todas as ruas que davam no porto eram apenas compostas de depósitos, entremeados por prostíbulos e bares baratos, repletos mesmo a essa hora da manhã. As ruas de paralelepípedos de pedras mal alinhados fediam a fezes e urina, sempre com algum homem jogado desacordado pelos cantos, ou pior. Os becos escuros pareciam jamais ver as luzes do céu, e eu evitava saber o que mais se escondia naquelas sombras além de ratos.

Caminhei até chegar a um novo distrito, os depósitos davam lugar a prédios de três andares onde a população morava, as ruas, embora ainda malcheirosas, se enchiam de pessoas comuns. Muitas crianças corriam de um lado a outro, mulheres com suas cestas repletas de suas compras, homens com vestimentas um pouco mais cuidadas que outros se embrenhavam pela multidão, evitando serem tocados pelos escravos que carregavam fardos gigantes acima de suas cabeças.

Aquele era apenas um mercado menor de Belfim, mas o que me intrigava era a quantidade de pessoas que conseguiam se espremer por entre as ruelas formadas pelas barracas, que ofereciam os produtos mais frescos saídos do porto. Talvez por esse motivo, aquele lugar se enchia tanto. Segurei firme Draetia e a bolsa que carregava, entrando no meio da azáfama.

A variedade de coisas me deixava encantada, frutas de um tipo que jamais vi antes, espinhentas mas cuja polpa exalava um cheiro doce, que atraía grandes enxames de abelhas e moscas para as barracas. Tecidos leves e esvoaçantes, de cores difíceis de se produzir com os corantes disponíveis em Darath. Uma das várias barracas de peixes possuía um espécime que nunca tinha visto antes, seu comprimento era grande, possuía a testa protuberante e as cores que variava de um dourado e azul.

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