Capítulo 27

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  Passei a mão pelo rosto pra tentar me desfazer do cansaço que sentia. Viver uma vida dupla não era fácil, principalmente quando muitas outras vidas dependiam de você. Já era uma terceira noite em que eu precisava me manter acordado, coordenando minha rede de informações. Além disso me preocupava com Reina e suas visões, ver como ela foi ao chão hoje pela manhã me deixou com coração apertado. Artorius havia sido bem claro para que não contasse nada, eu precisava me segurar muito por isso, mas se a garota precisasse saber...Art que me perdoasse.

Novamente passei a mão pela nuca, massageando para aliviar um pouco. Precisei sair do caminho para a passagem de vários escravos carregando os suprimentos para o Dama da Noite. Dois dias atrás fui avisado que Faya havia retornado, esse agora era um local que deveria evitar a todo custo. Desviei para a outra calçada, pronto para virar a esquina, quando alguém me puxou pelo braço. Era Hasim, ele estava bem vestido, como um pequeno senhor. Sorri ao vê-lo, mas seu rosto estava angustiado. Olhei ao nosso redor.

– Onde está a Reina?

Hasim não pareceu ter entendido. Não me importei, em vez disso o segurei pelos ombros, repetindo a pergunta. O garoto apontou para o Dama da Noite. Meu corpo gelou. Disparei para dentro do salão, esbarrando em um dos serventes. O dono não estava em lugar algum, e eu não via Reina entre os clientes. Me virei para a entrada do bordel, estava prestes a passar quando ela saiu. A segurei pelo braço antes que percebesse e a puxei. Não tive tempo de ficar aliviado ao sentir os olhos de Faya sobre mim. Aquela cobra estava sorrindo, mesmo sendo algo que qualquer um julgaria doce, para mim, um demônio seria mais agradável. Reina me olhava, eu senti que apertava seu braço, afrouxei um pouco sem soltá-la.

– Que casal mais lindo.

Reina começou a falar algo, mas eu a puxei para fora do estabelecimento, mesmo sobre seus protestos. Hasim nos seguia, eu continuei andando por várias ruas, cada vez mais baixo no círculo. Numa ruela escondida, onde eu sabia que não seriamos ouvidos, a coloquei contra a parede, segurando firme seu queixo, mantendo seus olhos em mim.

– O que foi fazer lá? – Eu sussurrei.

– Fui entregar um recado.

Segurei firme a mão que ela tentava se desfazer da minha.

– Tem ideia do perigo que correu?

– Nean... O que está acontecendo? Me solta!

Art não me perdoaria se eu contasse agora. Eu olhava nos olhos de Reina, havia um círculo verde que se misturava ao castanho de seus olhos, a prova de que era a filha do meu mestre. Senti algo em meu rosto. Ela me tocava.

– Porque está agindo assim?

"Que merda!"

Eu estava dividido. Um eu mais selvagem dizia para que esquecesse de tudo, e aproveitasse o momento. Outro me dizia que deveria me afastar, antes que não houvesse mais volta. Eu estava tão perto, bastava tocar aqueles lábios. Reina era muito jovem, sua beleza ainda aumentaria com o passar dos anos. Decidi ouvir minha razão e me afastei virando de costas.

– Você tem ideia de onde estava?

– Está me escondendo algo...

Sua voz era firme porém fraca. Me virei. Precisava arrumar uma desculpa convincente, ou Reina jamais esqueceria isso.

– Você tem ideia do que seu pai faria comigo se soubesse que deixei você entrar em um prostíbulo?

– Nean!

– Ashen, conte a ele que fui eu que a tirei de lá, não quero enfrentar a ira do velho dragão. – Adicionei com uma risada.

Reina me olhava nervosa, por poucos segundos sacudiu a cabeça, Ashen deveria falar com ela no momento. Melhor assim. Precisava pensar sobre o que falar.

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