Q U A T R O

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                   Analiso o espelho e a visão é satisfatória para alguém que está a ponto de quebrar emocional e fisicamente. Colocar roupas sem as duas pernas é um desafio imensamente difícil, mesmo assim consegui me sair bem. A saia e o suéter confortável me fazem sentir bem, diferente de como eu estava com aquele vestido desgraçado. Meus cabelos estão desgrenhados como sempre e consigo ver a real Alicia em meu reflexo, e não aquele projeto cosmopolita de mulher chique de saltos.

Manco devagar em direção a sala e vejo Alex me observar de maneira estranha, como se não me reconhecesse. Pigarreio, fazendo-o piscar rapidamente.

— Vamos logo, está tarde. — digo tentando calçar a sapatilha, mas meu pé está inchado demais para caber.

— Eu vou te levar até o carro. — ele diz naturalmente.

O ignoro por opção e abro a porta apenas com um pé calçado, com alguns pulos eu saio do apartamento, trancando a porta logo após Alex sair.

A chave gira e a guardo dentro da minha bolsa, a sapatilha sobressalente pende em minha mão.

— Vamos. — Alex se aproxima de mim e sua mão segura minha perna.

— Que porra você pensa que está fazendo? — esbravejo.

— Você é boca suja assim sempre? — sua voz é tensa.

— Só com gente estúpida. — cuspo.

Ele se mantém em silêncio e coloca a outra mão nas minhas costas.

— Você não vai me levar no seu colo. — digo afastando suas mãos de mim.

— Como pretende chegar até o elevador, Sherlock? — seu semblante nervoso me irrita.

— Pode me dar apenas o braço, sua mula falante. — devolvo.

Ele segura minha cintura e me apoio em seu corpo, com dificuldade ele me leva até o elevador e descemos silenciosos até a garagem, que se abre revelando seu carro estacionado na frente da saída.

Esse carro pagaria cada dívida que meu pai me deixou.

— Vamos, estacionei perto para não forçar mais ainda. — ele me auxilia a chegar perto da porta e a abre para mim, me ajudando a me sentar.

— Obrigada. — murmuro.

— Olha, ela sabe agradecer. — ele me encara.

— Não abuse. — rebato e fecho a porta.

Vejo-o tentar esconder o sorriso pela minha resposta, mas consigo enxergar um curvar de lábios tímido. Ele endireita a coluna e contorna o carro com a atitude usual no andar. Reparo no interior luxuoso do carro, que cheira a baunilha. Não há sinal de sujeira em lugar algum, e por pura satisfação, esfrego a sapatilha no tapete imaculado. A porta do carro se abre e Alex se senta no confortável banco de couro. Ele bate a porta aperta o botão de ignição.

— Sem chaves? — ergo a sobrancelha.

— Nem tirei, estava impaciente e subi logo. — o motor ronca barulhento pela garagem subterrânea.

— Deixou as chaves no carro destravado? Você tem merda na cabeça? — ralho.

— Tenho dinheiro na carteira. — ele me olha de relance antes de arrancar com o carro.

Eu definitivamente odeio pessoas ricas.

***

O Harthmony Hospital é um dos melhores centros médicos da cidade de Portland, sendo também o mais caro. A estrutura branca abarrotada de janelas iluminadas é uma das peças imponentes e aclamadas do sistema de saúde dessas bandas, o que me traz um sentimento incômodo de não estar no lugar certo. Carros luxuosos param em frente as portas e funcionários estão de prontidão com cadeiras de rodas ou até mesmo macas paradas para emergência.

O Conto de Alicia (Repostagem Revisada)Onde histórias criam vida. Descubra agora