✩ Three ✩

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“ This night is sparkling, don't you let it go ”

— Taylor Swift: Enchanted ♡

Emma

Cheguei em casa depois de acompanhar Ceci até a dela. Assim que eu entrei, dei de cara com meu padrasto no sofá assistindo TV, Hannah dormindo ao seu lado. Cada vez que eu o via, tinha vontade de chorar e gritar, mas era sempre a mesma coisa: eu congelava, a garganta tão seca que não conseguia pronunciar um " a " por vários segundos. Meu sangue pareceu parar de circular no instante em que ele notou minha presença. 
— Por que chegou tão tarde? — sua voz era tão fria que me fez tremer. Respirei fundo, tentando me acalmar. 
— Eu estava com uma amiga. — minha voz saiu quase inaudível.
— Que amiga?
— Uma garota nova. Ceci.
— Conhece as regras da casa. Sair da escola direto pra casa e nada de trazer ninguém pra cá. Agora vá para o seu quarto. — ordenou, autoritário. Caminhei lentamente pelas escadas, querendo chorar até não sobrar lágrima alguma.

Me tranquei no quarto, como todos os dias. As vozes na minha cabeça gritavam tão alto que não conseguia sequer ouvir meus pensamentos, minha boca pedindo socorro em silêncio. E de repente nada, a não ser um vazio muito grande. Eu e meu padrasto não nos dávamos bem, por mais que no início eu gostasse dele. Eu só sentia medo. Por mim, por Hannah e pela minha mãe. Ele bebia demais, algum dia podia se descontrolar e... não gostava de pensar. Me deitei na cama e senti meu celular vibrar dentro do bolso. Era uma mensagem de Ceci. Foi tão inevitável sorrir quanto respirar. Além da mensagem, tinha uma foto minha sorrindo. 
@americanqueen: fala sério, olha esse sorriso! 
@swiftiebilier: você tá dizendo isso porque ainda não viu o seu! Aliás, eu não lembro dessa foto. 
@americanqueen: é porque eu tirei de você distraída. Minha nossa, tão espontaneamente linda. 
@swiftiebilier: para de me deixar sem graça! Enfim, ficou tudo bem depois que eu saí?
@americanqueen: claro. O que você tá fazendo de bom?
@swiftiebilier: pensando se você toparia ver um filme comigo, e você? 
@americanqueen: pensando em como é possível recusar. Você já tem alguma idéia do que vamos ver?
@swiftiebilier: já sim! Você já assistiu como eu era antes de você?
@americanqueen: já, não gostei tanto. 
@swiftiebilier: se quiser continuar sendo minha amiga, sugiro que esteja brincando. 
@americanqueen: não tô mesmo, esse filme não é lá essas coisas como todo mundo diz. 
@swiftiebilier: vou te dar block pelo péssimo gosto! O que te fez pensar assim de uma obra de arte?
@americanqueen: ah, sei lá. Sugiro que você escolha outro filme se não quiser que eu durma. 
@swiftiebilier: que absurdo, tô decepcionada! Que outros filmes você gosta?
@americanqueen: titanic, um amor para recordar…
@swiftiebilier: o primeiro superestimado e o segundo absolutamente tudo pra mim. 
@americanqueen: vou te dar block pelo péssimo gosto! Quem não gosta de Titanic?
@swiftiebilier: eu! Fala sério, vamos ver um amor para recordar então?
@americanqueen: vamos, é meu filme de romance favorito, qual o seu? 
@swiftiebilier: como eu era antes de você é um deles, mas eu tenho vários.
@americanqueen: agora tá explicado porque você ficou tão decepcionada comigo. 

Ficamos conversando por mensagem até que ela perguntou se podia me ligar e eu disse que sim. Esperei sua ligação com o coração batendo forte e uma ansiedade correndo pelas minhas veias. Seu contato apareceu na tela me fazendo sorrir. Meia noite e a foto do seu perfil me deixou tão boba...
— Hey, tá com sono? — perguntei. 
— Não. — respondeu. — E você?
— Também não. Quando tiver me fala, tá? A gente tá conversando há horas e você já deve estar enjoando de mim. — soltei uma risada baixa. 
— Impossível, adoro ouvir sua voz. É tão doce.
— A sua é ainda melhor. A propósito, você bem que poderia cantar pra mim, não acha? Nunca te ouvi cantar.
— Humm. Agora?
— Claro. Ou você tá ocupada?
— Não, tô só falando com uma neném muito linda, um certo anjinho precioso, conhece?
— Sério? Conte-me mais sobre essa pessoa. — ela deu risada no final da frase e eu fiquei sem fôlego.
— Ela é loira, linda, tem um sorriso perfeito e o melhor de tudo: é minha amiga, consegue acreditar na sorte que eu tenho?
— Sou eu quem deveria dizer isso, sabia? Conheço uma garota incrível demais que sempre me atura quando eu mais preciso. Agora me fala, você é assumida para sua família?
— Não, mas tô de boa com isso. 
— Entendo. Como você lidou com tudo no início? 
— Não foi tão difícil, às vezes fico pensando no quanto demorei pra perceber. Meu medo sempre foi e sempre vai ser das pessoas que não tem nada a ver com a minha vida, mas que se acham no direito de me julgar por quem eu amo. 
— Uau, sinto muito por isso. Não consigo imaginar como deve ser viver com esse medo. 
— Espero que você nunca saiba, é tão injusto, sabe? Há tantas pessoas por aí fazendo maldade, mas somos apedrejados apenas por amar alguém do mesmo sexo? Por mais difícil que seja, nunca vou desistir de quem eu sou por conta do ódio alheio. Que isso sirva de motivação para me manter mais forte. 
— Muito lindo ouvir isso e eu também espero que você se mantenha mais forte. 
— As pessoas jogam pedras em coisas que brilham, já dizia a Taylor Swift. 
— E ela está certa. Quem tanto sabe sobre você?
— Apenas você e a Isis, as únicas pessoas em quem eu posso confiar. 
— Fico feliz que confie em mim, significa muito saber disso. — imaginei seu sorriso e acabei sorrindo também. — E você já teve quantas namoradas? Desculpa fazer tanta pergunta. 
— Sem problemas, pode perguntar o que quiser. E respondendo sua pergunta, apenas uma. 
— O que aconteceu?
— Ela terminou comigo depois de dois meses de namoro com o argumento de " nada dura para sempre ", incluindo namoro de ensino médio. 
— Ela devia estar louca, né? Bom, quem perdeu foi ela. 
— Ah, ela já estava me deixando escapar por conta própria antes disso.
— Você voltaria pra ela?
— De jeito algum, não sou esse tipo de pessoa. Aquela foi uma fase boa da minha vida, que teve o fim que devia ter, para que eu pudesse ter uma melhor. Fez sentido pra você?
— Claro, eu entendi muito bem e gostei. Me conta mais sobre você, tem alguma coisa que eu ainda não saiba?
— Minhas cores favoritas são vermelho e azul, sou swiftie desde os 13, amo ler…
— Então você gosta de ler? Hum, que interessante. Você tem cara de quem gosta mesmo. — ela riu. 
— Ah, eu amo ler. Tipo minha válvula de escape da crueldade do mundo real, sabe? Sinto que eu poderia ler o tempo inteiro. É como viajar sem de fato sair do lugar e eu posso dizer que já vivi várias e diferentes vidas no processo de leitura. Se parece um pouco com a atuação, já que você interpreta várias personagens, ou seja, vive inúmeras vidas por tempo indeterminado. 
— Uau, deu para perceber que sua paixão pelos livros é enorme mesmo. E eu adorei aquilo sobre a atuação, você parece entender do assunto. 
— Um pouquinho — sorri. — porque eu pretendo ser atriz um dia. 
— Que incrível! Essa profissão combina tanto com você. 
— Ah, é? E por que? 
— Porque você é espontânea, autêntica…
— E você adora me deixar sem graça, né?
— Talvez um pouquinho. — ela riu. — Obrigada. 
— Pelo que?
— Por esse seu jeitinho de ser. Tenho muita sorte por ter te conhecido.
— Ah para, eu que o diga. Você é tão incrível e nem sabe o quanto. Aliás, eu preciso te dar um apelido. 
— Hum, eu vou ter esse privilégio? 
— É para poucos — falei. — e o seu vai ser único. 
— Já tô curiosa para saber qual é. 
— Em breve. Ceci, se eu te disser uma coisa, você promete não ficar chateada comigo?
— Prometo. É melhor você falar logo. 
— É só… Não deixa ele gritar com você, okay? Desculpa estar sendo intrometida, mas eu me preocupo tanto com você, entende? Sei que é normal brigar, mas eu tenho medo de que esses gritos se transformem em…
— Você pode ficar tranquila — ela me interrompeu. — isso não vai acontecer. Ele nunca me machucaria propositalmente. 
— É o que eu também espero. Qualquer coisa, saiba que pode contar comigo pra tudo, entendeu? Absolutamente tudo, estarei aqui pra você. 
— Obrigada, isso significa tanto pra mim. — escutei ela chorar e com a voz preocupada, perguntei:
— O que aconteceu para você estar chorando? Foi alguma coisa que eu disse?
— Exatamente, você se preocupa de um jeito tão lindo, sabia? E é tão cuidadosa comigo. Isso é raro e eu tô um pouquinho sensível, só isso. 
— Eu queria estar aí para te dar um abraço, mas vou lembrar disso quando a gente for se ver amanhã na escola e te dar um bem apertado, okay?
— Promete? 
— Prometo. Talvez isso seja um pouco óbvio, mas não posso deixar de perguntar: imagino que você seja hetero, certo? — minutos de silêncio. — Ei, tá aí?
— Tô sim, desculpa. Sua pergunta me deixou pensativa. Não sei como responder...
— Como assim? — questionei. — Parece tão simples.
— Não é tão simples. Só porque eu namoro um cara, não quer dizer que eu seja hetero. Até mesmo porque nunca beijei uma garota, então por enquanto só vou te dizer isso: ainda vou descobrir.
— Uau! Amei sua resposta. Outra pessoa teria dito algo como " eu prefiro homens, entende? ". — ela riu. Percebi que sua risada tinha se tornado meu som favorito.
— Você falando assim tá parecendo a Isis sabia? 
— É, um pouquinho. Agora me fala, tá tudo bem entre vocês mesmo? — ouvi ela suspirar baixinho.
— Sim, estamos. Um pouco afastados mas bem. O que você tá fazendo além de conversar comigo?
— Olhando pela janela e você?
— Na porta da sua casa. — e ela ri.
— Como assim? — perguntei, sentindo meu coração acelerar. 
— Não tava conseguindo dormir, então tô sentada bem aqui, na frente da porta. E eu não aguentei esperar pelo abraço até amanhã, sou ansiosa. 
— Nossa, eu… — não sabia o que dizer, aquilo havia me surpreendido. — Tá um frio danado aí fora. Vou abrir pra você. — desci as escadas silenciosamente já que todos estavam dormindo. Abri a porta devagar com cuidado e a deixei entrar.
— Não precisava fazer isso. — ela sussurrou, meu coração disparando ao vê-la bem na minha frente.
— Você ia congelar se eu não fizesse, vamos pro meu quarto em silêncio okay?
— Okay. — ela sorriu e eu perdi o fôlego novamente. Quantas vezes isso vai acontecer? Chegamos no meu quarto e assim que eu tranquei a porta, ela me olhou como quem diz " por que? ".
— Se souberem que você tá aqui, meu enterro vai ser amanhã. — falei, brincando. 
— Então, acho melhor eu ir embora. Não posso perder você. — falou baixinho e sorriu. Ignorando as borboletas em meu estômago, olhei para a janela.
— Começou a chover. — eu disse, olhando diretamente em seus olhos. Eu poderia me perder naquela imensidão esverdeada.
— Acho que eu vou ter que ficar então.
— Ótimo. — um sorriso insistiu em curvar meus lábios.
— Você ainda não cantou pra mim. — ela disse olhando pra mim. Céus, isso é demais.
— São quase duas da manhã, que música você quer que eu cante? — perguntei, ansiosa. Minhas mãos tremiam e suavam. 
— Qualquer uma.
— Certo. — ela se sentou na minha cama e eu numa cadeira próxima a ela. Seus olhos denunciavam o quanto ela estava ansiosa. Inúmeras músicas vieram à minha cabeça, uma em especial que se encaixava perfeitamente com o que eu estava sentindo. 

Lá estava eu novamente esta noite
Forçando o riso, fingindo sorrisos
Mesmo lugar, velho, cansado e solitário
Paredes de insinceridade
Olhares perdidos e vazio
Sumiram quando eu vi o seu rosto
Seus olhos me encararam com atenção e meu coração queria saltar do peito. 
Tudo que eu posso dizer é que foi encantador te conhecer

Seus olhos sussurraram: Já nos conhecemos?
Do outro lado da sala sua silhueta
Começa a fazer sentido pra mim
A conversa brincalhona começa
Contra todas as suas observações rápidas
Como passar bilhetinhos
E foi encantador conhecê-lo
Tudo que posso dizer é que eu estava encantada em conhecê-lo

Esta noite está vibrante, não deixe-a fugir
Estou maravilhada, corando todo o caminho até em casa
Vou passar a eternidade me perguntando se você sabia
Que eu estava encantada em conhecê-lo

A pergunta persistente me manteve acordada
2 da manhã, quem você ama?
Pergunto-me até que eu esteja bem acordada
Agora estou para lá e para cá
Querendo você à minha porta
Eu abriria e você diria
Ei, fiquei encantado em conhecê-la
Tudo o que sei é que eu estava encantada em conhecê-lo

Esta noite está vibrante, não deixe-a fugir
Estou maravilhada, corando todo o caminho até em casa
Vou passar a eternidade me perguntando se você sabia

Esta noite está perfeita, não deixe-a fugir
Estou maravilhada, dançando sozinha
Vou passar a eternidade me perguntando se você sabia
Que eu estava encantada em conhecê-lo

Esta sou eu rezando para que
Essa seja a primeira página
Não onde a história termina
Meus pensamentos vão ecoar o seu nome
Até eu te ver de novo
Estas são as palavras que segurei
Ao ir embora cedo demais
Eu estava encantada em conhecê-lo
Por favor, não se apaixone por outra pessoa
Por favor, não tenha ninguém esperando por você
Por favor, não se apaixone por outra pessoa
Por favor, não tenha ninguém esperando por você

Quando eu terminei de cantar, ela veio me abraçar. Não sei bem quanto tempo durou: segundos, horas, minutos… Não queria soltá-la. Seus braços me envolveram de um jeito que ficou impossível não querer morar ali. 
— Sua voz é tão incrível… Tô sem palavras. Eu amei, obrigada. — fiquei em silêncio apenas ouvindo. Sua cabeça pousou em meu ombro e tive a impressão de que ela não iria me soltar tão cedo. Talvez eu quisesse que ela não me soltasse tão cedo. Era um daqueles momentos em que a eternidade cabia em minutos e que eu iria guardar pra sempre no meu coração. Quando nos soltamos e nossos olhares se encontraram, seus lábios estavam muito próximos do meu. Tão próximos que eu conseguia ouvi-la respirar perfeitamente. Não sei quem deixou escapar um suspiro. Ar puro. Corações batendo fortemente. Arrepios por todo o corpo. Suspiros... Amor? Tinha alguma coisa me atraindo até ela, me empurrando para mais perto. Um fio invisível, mas resistente. Uma espécie de magnetismo tão poderoso quanto um trovão.
— Parou de chover. — ela observou, olhando para a janela e depois para mim.
— Sim, parou. — falei, notando que os pingos fortes que caíam minutos atrás tinham realmente parado.
— Melhor eu ir. — Ceci se levantou. 
— Talvez. — eu queria olhar em seus olhos e contar os segredos que meu coração estava guardando a sete chaves. Mas eu temia que ela corresse assustada se eu fizesse isso. Eu iria acabar afogada em minha própria intensidade. 
— Você quer que eu vá? — perguntou, hesitante, quase como se temesse a resposta. 
— Não. — respondi imediatamente. — Não quero que você vá. — ela sorriu. 
— Eu não quero ir. — sussurrou.
— Então não vá. — havia uma certa urgência em minha voz que até me surpreendeu. 
— Eu… posso ficar? — mais uma vez hesitante.
— Você deve ficar. — fale, obedecendo meu coração. 

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