Capítulo 9 - Aniversário

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Tive uma noite quase tranquila. Sonhei que Michel aparecia com sua moto na vinícola. Ele me puxava, eu pedia socorro e Luigi aparecia. Eles lutavam e Michel perdia. Então montava sua moto e ia embora ameaçando se vingar. De repente ouvíamos Giovana gritar e toda a plantação estava em chamas. Mas logo os trabalhadores se reuniam para apagar as chamas. Nonna surgia com um exército de plantas e animais que traziam água do lago, enquanto pássaros voavam através das nuvens, fazendo uma forte chuva cair e extinguindo o fogo. Luigi, então, me pegava em seus braços e me dava um beijo apaixonado. Acordei brevemente, mas logo voltei a dormir. Não sonhei mais aquela noite.

No dia seguinte era meu aniversário, mas ali ninguém sabia disso e eu não quis falar. Certamente receberia diversas mensagens no celular quando meus familiares e amigos acordassem. Quando levantei, Mamma Giovana já estava com a mesa do café da manhã quase toda pronta. O cheiro de café e pão estava delicioso. Ofereci ajuda, mas ela sorriu e disse para me acomodar em uma cadeira e começar a comer, já estava quase tudo pronto. Aparentemente todos já estavam de pé. Luigi e Helena estavam com as crianças nos jardins, Nonna estava tirando o pão do forno – eles realmente faziam tudo ali – e Papà Pietro já estava colhendo os legumes e verduras que seriam usados no almoço. Fui até a entrada segurando uma xícara de café quentinho e vi Helena e Luigi jogando bola com as crianças ao longe. Fiquei pensando que aquele era o tipo de vida que eu adoraria levar. Morar em um lugar como aquele, plantar, colher, produzir, ter animais, flores, frutas, lagos. Ali não tinha poluição, não se ouvia barulho de trânsito, eu ainda não tinha visto sequer a televisão da sala ligada. Parecia que eu estava no paraíso. Minha vida de advogada parecia tão distante que já não parecia minha. Será que ainda me sentiria assim quando retornasse?

Giovana veio até onde eu estava e chamou os filhos e os netos para comer. Sentamos todos e comemos. O pão estava quente e macio, extremamente saboroso. O leite era produzido na fazenda do tio, então vinha fresco para a casa dos Dormaccio. Helena disse que partiria após o café, pois a viagem de carro era longa até Florença e as crianças já haviam perdido dois dias de aula. As crianças protestaram, claro, afinal, quem gostaria de ir embora do paraíso? Mas Helena não amoleceu.

- Irmão, quais são seus planos para hoje? Precisa levar Lidia para ver as plantações.

- Já tenho tudo planejado. Vai ser surpresa. Mas acho que ela vai gostar.

- Tem alguma coisa para não gostar aqui? – Comentei.

- Depende de como você gosta de viver. Aqui é maravilhoso, mas é pacato demais. Às vezes sinto falta de um pouco de agitação.

- Irmã, você é louca. Aqui tem bastante agitação. Você lembra quando um dos bois do tio veio parar aqui e foi uma correria para pegá-lo e levá-lo de volta? Não dê atenção para ela, Lidia. Temos muita emoção aqui.

Eu ri. Parecia bem emocionante mesmo. Fiquei pensando se eu já tinha visto algum boi de perto. Não tinha. Terminamos de comer, Helena e as crianças se despediram e foram embora. Luigi olhou para mim e disse:

- Coloque seu biquíni, uma roupa confortável, calce tênis e me encontre na varanda de trás.

Entrei correndo, troquei de roupa e logo o encontrei no lugar marcado.

- Muito bem, vamos caminhar.

Ele segurou minha mão e fomos andando em direção às plantações de uva. Era um bocado distante, no caminho vi árvores de diversos tipos de fruta, laranja, limão, abacate, ameixa, cereja, vi arbustos de morangos, vi abacaxis. Ele apontou onde ficava a horta de onde colhiam os alimentos da casa, parecia bem maior do que quando vi da porta de casa. Andamos por uns quinze minutos ou mais. Finalmente chegamos às uvas. A vinícola era imensa! O pessoal já estava trabalhando há bastante tempo, ao que parecia. Ele me mostrou uvas verdes, roxas, vermelhas, pretas. Explicou que cada uma produzia um tipo de vinho e precisava de um cuidado diferente, por isso precisavam ser cultivadas separadamente. Tirou algumas para eu provar, eram doces e suculentas. Parte da colheita eles vendiam para mercados locais, parte era doada e a maior parte dava origem ao vinho dos deuses que eu havia provado na noite anterior. Ele me mostrou como deveria colher o cacho e pediu que eu colhesse alguns. Foi bastante divertido, na verdade. Ele me apresentou alguns dos funcionários e me levou até o galpão deles. O galpão era bem grande e dividido em setores, com locais para guardar as roupas e equipamentos de trabalho, cozinha, banheiros, quarto de descanso, onde estavam instaladas as redes de descanso, havia um sofá, uma TV e uma mesa. Num quarto a parte vi duas moças sentadas amamentando. Ele me explicou que há algum tempo algumas funcionárias pediram para levar os filhos, pois não tinham com quem deixar as crianças e elas não podiam ficar sem trabalhar mais tempo, especialmente após o fim do período de licença maternidade. Ele conversou com seus pais, que concordaram e conseguiram um berço grande, um cercadinho e os funcionários se revezavam para vigiar os bebês. Quando dava a hora, as mães iam amamentá-los. Luigi disse que não era o ideal, mas que foi o que conseguiram fazer. Para mim, parecia incrível. Sentei-me com elas e Luigi traduziu o que diziam.

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